quarta-feira, 30 de setembro de 2015

CLIMATE CHANGE AND PHYSICAL DISTURBANCE CAUSE SIMILAR COMMUNITY SHIFTS IN BIOLOGICAL SOIL CRUSTS

Climate change

ON REGREENING AND DEGRADATION IN SAHELIAN WATERSHEDS

Watersheds

OPINION : THE TIME HAS COME FOR OFFSHORE WIND POWER IN THE UNITED STATES

Wind power

A FOGO

Aquelas marcas não mais seriam olvidadas,referências de um trajeto que tantas vezes se fizera de forma lúdica. E era a vala que sangrava a lezíria,e era a casa da guarda, onde estavam assinalados níveis de cheias,e era o mar de vinhas,para onde quer que a vista se estendesse,e era o túnel de ramalhudas amoreiras,e eram os resguardos na ponte,abrigos em caso de intempestiva passagem de toiros,e era o mítico Tejo,e era a fonte de salobra água,que não se enjeitava,e era o carreiro,talvez do tempo dos mouros,que circundava o morro. Foram marcas como que gravadas a fogo.

CADEIA DE VIDA

É um encanto aquela nascente,sempre a jorrar,dia e noite,noite e dia. Brota a água com ímpeto,como que falando,dizendo que está ali,para lavar,e durar. Está lá num alto,mas ali à volta,há altos mais altos.
Sai a água de uma fresta de rocha dura. Fará isso,não desde o princípio do mundo,que o mundo deu muitas voltas,mas desde há muito,muito tempo. Fazendo-lhe sombra,erguem-se,pujantes,
meia dúzia de palmeiras muito juntas,ali postas para grandes ócios,que aquele canto é quase paradisíaco. Muita história este canto terá para contar.
Dantes,aproveitando aquele manancial,criou-se por ali muita hortaliça,depois veio o abandono. Mas não há mal que sempre dure,e hoje,lá encanta um ou outro que a visita,ainda que veja aquele caudal enfiar-se pelas funduras,talvez a alimentar outras nascentes. Será ela o elo de uma cadeia,de uma cadeia de vida.

UMA GRANDE DESCOBERTA

Ele estava muito satisfeito,tão satisfeito,que ali à roda diziam que nunca o tinham visto assim. O caso não era,de facto,para menos. Eles é que não sabiam do que se tratava,pois tinha-se fechado em copas. Os outros que se admirassem,ou julgassem o que entendessem. Isso pouco lhe importava.Afinal,do que é que se tratava? É que,certa noite,uma noite muito escura, ele tinha feito uma grande descoberta,pelo menos assim pensava que tivesse sido. Que era uma descoberta e que era grande. Podia estar enganado,mas isso já não era com ele.E um dia,depois ,também,de muito pensar,decidiu revelá-la a um que ia ali a passar,porque com os amigos não valia a pena. Lá vens tu com mais uma das tuas. E fariam chacota.Durante muito tempo ele pensara que alguns não se lhe chegavam por julgarem que ele se considerava superior. E isso não toleravam,não suportavam,alás,com toda a razão. Ele que ficasse por lá a curtir a sua superioridade.Mas naquela noite,uma noite muito escura,a deusa da inspiração fizera-lhe uma visita. Tinha de ser,porque sozinho não chegava lá. Sem essa essencial ajuda,continuaria no saber antigo.E qual fora essa grande descoberta? Que eles não se lhe chegavam,simplesmente,por se acharem muito superiores,não dando confiança a qualquer um.

ADEUS, ATÉ MAIS VER

A camioneta estava parada e dois homens encarregavam-se de a carregar com folhas de palmeiras,empilhadas no passeio. Um deles,aí de uns ciquenta anos,encorpado,de muito boas cores,parecia ser ali o chefe.
Pode-se fazer uma pergunta? Venha ela,mas sem que tal fosse ouvido. Qual é o destino dessas folhas? Iam levá-las para um local,onde seriam cortadas em pedacinhos,para entrar lá no fabrico de composto.
O senhor não é de cá,pois não,quis saber o da pergunta? Não,vim de longe,e concretizou. A coisa parecia ter ficado por ali,depois do da pergunta lhe ter tocado familiarmente no forte ombro,assim como a dar-lhe coragem,mas não.
Ia o da pergunta lá no seu caminho,ao longo do passeio,quando sente a camioneta afrouxar,e lá de dentro sair um adeus,até mais ver.

TUDO EM MOEDAS

Eram três mulheres,com cara de serem da mesma família. Uma,cega,
muito cega,aí de uns cinquenta anos,vestida de escuro pesado,baixa,para o
encorpado,desenvolta,outra,de aparência mais nova,mas não muito,toda louçã,
de amarelo vivo,baixa também,roliça,a terceira,uma jovem ainda,alta,atlética,
voz forte,de amarelo mais vivo. A cega trazia a caixinha do seu muito peregrinar.
Tinham vindo à farmácia aviar uma receita. Eram alguns remédios,que a cega padecia de vários males,como se ficou a saber. Quem pagou foi a moça,tudo em
moedas.

terça-feira, 29 de setembro de 2015

PRAÇA DE D.PEDRO IV - LISBOA

Praça de D.Pedro IV

PRAÇA MARQUÊS DE POMBAL - LISBOA

Praça Marquês de Pombal

PASSAVA POR LÁ

Fora por aquela estação que ele ali chegara,lá para o cabo do mundo,muito longe dos seus. Atraía-o aquela estação. Era por ela que um dia,muito lá para diante,havia de regressar. E assim,volta não volta,sempre que podia,passava por lá.
E punha-se perto das plataformas,a olhar para aquelas estradas de ferro,para aquele emaranhado de linhas,a ver os comboios que chegavam,os comboios que partiam,as pessoas que embarcavam. E via-se numa delas,das que partiam. E chegava a invejar os que partiam. Queria ser um deles,mas não podia ser ainda,tinha de ter paciência. A culpa era dele. Do que se havia de ter lembrado? Ter posto pernas ao caminho,lá para o cabo do mundo.
Nos intervalos,na falta de comboios,a chegarem ou abalarem,percorria a grande estação,entrava aqui ,entrava ali,sentava-se,a ver,a ler os anúncios,as reduções das tarifas,nos fins de semana,que fora deles,eram um bocado puxadas. Os velhos,assim,já se atreviam a ir dar umas passeatas. Ele não se atrevia,pois tinha mais que fazer. Já perdia muito tempo naquelas visitas,que nada adiantavam. Passeava,assim, em sonhos,sempre era viajar.

A AMEAÇA

Tantos e tantas que o velho médico vira nascer ali por aquelas redondezas. Todos ali o conheciam e respeitavam. E era-lhe consolador sabê-lo,o que, a cada passo,sucedia.
Naquela altura,já estava a descansar,pois os muitos anos assim o exigiram. Enviuvara e os filhos estavam lá para longe. Um casal tomava conta dele e da casa,que era um casarão. Quando entravam de férias,instalava-se numa pensão,onde o tratavam como se fosse da família.
Era uma pensão por onde passava gente dos mais diversos cantos. E isso entretinha-o,pois sempre havia alguém disposto a conversar. De resto,tinha muita coisa para contar e sabia fazê-lo. As pernas já lhe pregavam partidas,mas a cabeça não.
Um neto andava desgostando-o muito,o que o levava,por vezes,a desabafar. Vejam lá do que ele se havia de lembrar. Eu tenho tentado demovê-lo,mas é teimoso. Mas eu deserdo-o,era a ameaça que o moço também ouvia sempre que o ia visitar.

UN SONHO

Pode dizer-se que não estavam nada bem um para o outro. Mas, naquele tempo,uma desgraça comum visitara-os. É que tinham sido privados,muito proximamente,de alguns dos seus teres,pelo mesmo inimigo. Fora isso suficiente para os irmanar.
E,assim,volta não volta,lá se reuniam para carpir e congeminar. O inimigo não podia levar a melhor. E foi o que sucedeu,como se antevia logo de início,pois,para mal dele,não tinha pernas para ir longe.
Os teres não demoraram muito a regressar a quem de direito. Tudo,afinal,não passara de um sonho,para ambas as partes,inimigos e amigos.
Desaparecera,assim,a causa que produzira aquele insólito par,pois os ombros deixaram de servir para neles lágrimas derramar. Depois,a distância que sempre os separara,sobretudo, em termos de pessoa,impôs-se,e não mais foram vistos juntos.
Um,lá seguiu a sua vida,como nada tivesse acontecido,o outro,apsar da recuperação dos bens,não mais foi o mesmo,de tempos áureos. Parecia que uma peste o tomara,de que havia de fugir.

EMBOSCADAS

Coitado dele,que mal se tinha nas trôpegas pernas,que o muito alcool não deixava. Mas estava determinado. Queria visitar a catedral.
Venha daí que eu vou também. A vereda era estreita e um bocado acidentada,serpenteando por arvoredo denso. O rio também corria ali perto,e o céu borrifava.
Podia ter sido outro o encontro,mas calhou ser aquele. Talvez o dia tivesse afastado visitantes,
que o tempo não estava para se pôr a cabeça de fora,mesmo para os da casa. Estava antes para emboscadas,que a bruma mais facilitava.

RESTOS DE ENERGIA

Uma,desceu a meia dúzia de degraus apoiada numa bengala, e em duas pernas e mais dois braços emprestados. Outra,subiu os mesmos degraus com a ajuda de uma canadiana e uns restos de energia. Dois observaram como se nada daquilo lhes dissesse respeito.

segunda-feira, 28 de setembro de 2015

RAÇA AROUQUESA - PORTUGAL

Raça Arouquesa

RIA DE AVEIRO - PORTUGAL

Ria de Aveiro

NÃO HAVIA ENGANO

As rosas vermelhsas estavam cansadas,queriam ir dormir. Aquele canto,que fora um encanto,já não era o mesmo de há uns tempos atrás. Mas havia ainda muito Maio pela frente,havia ainda muita promessa a cumprir-se.
E assim,logo ali ao lado,já se tinha desdobrado uma vasta,uma densa mancha,de tonalidade amarela,de um amarelo torrado. Quase se tinha ganho com a troca. Quase. Porque não há quem suplante aquelas rosas vermelhas.
A compor o quadro,viera,também,não muito longe,outra ajuda. As flores aí eram róseas. Mas a ajuda não se ficou por aqui. Uma tira larga de malmequeres brancos quis dar a sua contribuição. E lá mais para diante,os jacarandás já se estavam a preparar para entrar em cena.
Estava-se em Maio,não havia engano.

UM OUTRO ALEIXO

Onde já lá iam os noventa,assim o revelou. Parco de carnes,o velhote ouvia mal. Regressava ao Barreiro,de onde tinha vindo,manhã muito cedo. Não se entendia lá muito bem com os transportes,mas havia sempre alguém que o ajudava.
O ouvido estava fraco,mas a memória não se comparava,pedia meças. E para o mostrar,desfiou ali,de uma assentada, mais de uma dúzia de quadras,inteiramente da sua lavra. Um outro Aleixo. Para também se ouvir,acabou por ter casa cheia.
Vestido de negro,incluindo o chapéu,todo ele era vida. Os olhinhos faiscavam,na sua carita chupada. Tê-los-ia dito,aquela torrente de versos,muitas vezes,não importa. Este seu jeito vinha de muito longe,de quando ele era moço. Contava ainda fazer muitos mais,que motes não haviam de faltar e o engenho também não.
Passem por cá muito bem,que eu tenho de ir apanhar o barco. Fizera este caminho poucas vezes,mas agora já não tinha dúvida. Adeus. E lá foi,direito que nem um fuso,quase sem rugas na carita escanhoada a preceito,para vir à capital.

O HOMEM DAS CASTANHAS

O Homem das castanhas. Alto,forte,bonacheirão,de grande cabeça,de olhos congestionados. As castanhas eram assadas em fornos de padaria. Estavam sempre quentinhas,que ele tinha artes. Envolvia-as com sacas de linhagem e folhas de papel de jornal.
Circulava com a cesta suspensa dos seus largos ombros. Os miúdos gostavam dele e ainda mais das castanhas. Para os cativar,que a concorrência era grande,não só da sua mercadoria,mas de várias outras,como tremoços,pevides,alfarrobas,ou reconhecido pela preferência, dava sempre mais uma. Deixava saudades.

O ACELERADOR

Ele já ouvira falar de Torrão,a terra de Bernardim Ribeiro,o autor de Menina e Moça. Por dever de ofício,passara a cruzá-la com frequência. Não seria isto suficiente para,mais tarde,não se esquecer dela. Pois nunca mais a esqueceria.
Aconteceu que,nessa altura,os anos que já lá vão,ter aparecido por ali uma espécie de José do Telhado. De vez em quando,lá fazia uma das suas. O local preferido era uma garganta,a seguir a uma curva,na estrada para Ferreira do Alentejo.
Assim,sempre que por lá tinha de passar,pois não havia alternativa de jeito, quem pagava era o acelerador. Tudo isto junto,sobretudo,a garganta,a lembrar os desfiladeiros de alguns filmes e o que lá ocorria,ficou impresso,parecia que para sempre.

ACABAR COM OS SONHOS

Os lugares eram escassos e os concorrentes abundavam. Tal triste realidade desencorajava alguns necessitados. Para quê,de facto,esforçarem-se, se apenas podiam contar consigo? E relaxavam.
Era o que outros queriam. Mais oportunidades teriam. E assim,não se cansavam de repetir que não valia a pena lutar. Olhassem bem para eles. Depois de tantos anos à espera,não tinham passado do lugar de entrada. Era,com efeito,para desanimar.
Mas logo na primeira aberta, lá avançavam eles. Parecia terem-se desinteressado,mas era só para despistar. Na sombra,iam-se preparando,na esperança de que outros seguissem os seus avisos,desleixando-se.
Nada de mostrar o céu muito azul. O fundamental era quebrar os ânimos,acabar com os sonhos,proclamar que o mundo estava perdido. Quanto pior,melhor,era o seu lema.

domingo, 27 de setembro de 2015

TÚMULO DE VASCO DA GAMA - MOSTEIRO DOS JERÓNIMOS

Vasco da Gama

TEMPLO DE DIANA - ÉVORA

Templo de Diana

BARCOS RABELOS - RIO DOURO

Barcos rabelos

INCHAR,INCHAR

Como elas tinham crescido. Bastara uma tarde,uma noite,uma manhã. Quase tinham duplicado. Mas onde quereriam elas chegar,era caso para perguntar,que nunca se dera com uma coisa assim? O coração alargara-se,alargara-se tanto,que parecia ir rebentar.
Tratava-se de folhas da base,mais propriamente,dos rebentos das raízes,das folhas de baixo,de um verde muito fresco,quase translúcido. As de cima,as lá do alto,estariam quase na mesma,quer dizer,com a sua forma de coração,um coração,nem grande,nem pequeno,um coração normal,talvez um pouco mais outoniço,que o tempo não perdoa.
Que quereriam aquelas novas folhas,acabadas de chegar,com aquele inchar,inchar,quase a estoirar? Quem quereriam elas imitar,que ideias teriam elas,que ideias?

TERMO DA FESTA

Dava gosto olhar para aquelas copas em Maio,e mesmo em Junho. Eram copas densas,
encorpadas,sem uma aberta,por pequenina que fosse,como uma barreira que ali se tivesse formado.
Depois,o verde das folhas já não era aquele verde da arrancada,um verde aguado,da renovação,
era um verde adulto,em pleno viço. E também não era aquele verde que viria depois,já em Julho,um verde carregado,um verde outoniço,um verde de começar a despedir-se,a anunciar o termo da festa de mais um ano.

CHEIO DE SORTE

Parecia que aqueles domínios eram do moço. E assim,logo que ficava livre,cumpridas algumas formalidades,lá ia ele,feito capataz,revistar todos os cantos. Era isso um claro sinal da estreiteza do seu viver,de horizontes acanhados. Diante daquela largueza,daquela riqueza,quase se julgava seu dono,ou fazendo parte da sociedade que a explorava. Não havia buraco,pode dizer-se,que ele não esquadrinhasse meticulosamente. Mas, sem dúvida,era a horta,aquela grande e verdadeira horta,que mais o prendia,talvez por haver nela com que confecionar muitas refeições. Conhecia de cor todos os seus componentes,as noras,os tanques,as caleiras,os talhões,as árvores. Após um reconhecimento,como que a ver se estava tudo no seu sítio,escolhia uma sombra para uma observação envolvente,de senhorio total. Preferia um dos extremos,onde famílias de melros se recolhiam. Julgava-se no paraíso. Por tudo isso,e ainda mais uns acrescentos,que não se podiam deitar fora,ficava consolado por uns tempos. Sabia,de antemão,que ao fim deles era lhe permitido repetir a dose. Sempre era uma compensação de vulto,coisa que muitos não teriam. Era,afinal,um moço cheio de sorte.

COMER E CHORAR POR MAIS

O que por ali havia ,de confortar os olhos e a alma. Parque frondoso,recantos misteriosos,a portentosa catedral,igrejas várias,ruas de remota traça,largos,onde, à noite,o silêncio falava.
Pois nada disto o atraíra. Não fora para isto que ele pusera as já cansadas pernas ao caminho. Seria muito melhor ter ficado lá em casa,a ver televisão,sobretudo,os jogos de futebol,e,claro,as telenovelas dos seus encantos. Queria ele lá saber de coisas que não entravam nas conversas com os amigos? E,além disso,coisas velhas,a cheirar a mofo.E apontava. Não vê ali aquele tapete de musgo?
O que o movera,o que o fazia andar alvoroçado,logo que chegara,quase não sabendo para onde se voltar,fora, simplesmente,a comidinha. Por uma questão de delicadeza tinha-se de o ouvir. Não calcula,aquilo é de comer e de chorar por mais. O que eu tenho perdido. Em cada refeição,uma surpresa. Depois,ele tinha feito uma prévia investigação,visto ser muito exigente. Não abancava em qualquer mesa.
E ssim permaneceu,nunca se deixando levar por algumas lembranças. Os outros que se divertissem lá à sua maneira. Ele tinha a dele,o que muito o alegrava.

A VASSOURA

Coitadas daquelas oliveiras. Metiam dó,de tristes que ficavam. Parecia vê-las chorar,que aquilo não era fruto a cair,mas lágrimas que elas soltavam.
E desfaziam-se elas,teimosamente,em tanta promessa. Mas uma doença maldita não as largava. Ainda esperaram que lhes acudissem,mas muito se enganaram. Para ali têm estado,pois,
entregues à sua sorte,anos e anos.
E o resultado de tanta comida e de tanta bebida,que o chão é úbere e a água abunda,é sempre o mesmo. Depois,os odores à sua volta,na fase terminal,são de fugir. Nem os pássaros,nem as formigas se atrevem a andar por ali. Uma desolação.
De vez em quando,vem a vassoura e é o lixo o destino de toda aquela azáfama,que aquelas flores e aqueles frutos representam muito trabalho,que não se viu,mas que foi feito,disso não se pode duvidar.
Razão forte têm aquelas oliveiras,portanto,para chorar. Mereciam melhor sorte,elas que são o símbolo de coisa muito séria.

sábado, 26 de setembro de 2015

SERRA DO BUSSACO - PORTUGAL

Serra do Bussaco

PALÁCIO DE MONSERRATE - SINTRA

Palácio de Monserrate

ATREVIMENTOS

Era um atrevimento,ele sabia,mas não se conteve.Atrás dele,em bicha,estava uma senhora ajoujada com dois sacos quase a romperem-se. Mas faltavam ainda coisas. Ao lado,perfilavam-se latas de comida para gatos. Pôs algumas no saco que lhe pareceu ainda aguentar mais um peso.
A senhora trata bem dos seus gatinhos. Mais vale alimentar os pobres animaizinhos do que muita gente que anda para aí. E olhou-o de cima a baixo,em jeito de o meter na companhia de tal gente.
Deu-lhe,ao atrevido, para continuar. Olhe que não será bem assim. Essa gente de que fala são pessoas, e se algumas não parecem,a culpa não será toda delas. Entretanto,estava chegando a sua vez. Como não tinha pressa e em tentativa de quebrar o azedume da senhora,convidou-a passar à frente,invocando a carga que levava.
Aceitou,um tanto contrafeita. Por duas vezes,deu mostras de querer voltar ao seu lugar,talvez por não estar disposta a alterar o conceito que tinha de tanta gente,onde,certamente,o incluiria.
Noutra ocasião, o atrevimento estava bem fundamentado. Olhe que não pode deixar aí o carrinho. Tocara,ao de leve,no tecido que lhe revestia o braço. O que ele foi fazer. Neste braço,só o meu marido é que toca,mais ninguém. Isto,para meio mundo ouvir. Peço muitas desculpas,mas o carrinho não é para ficar aí. Ficou e continuou a mimoseá-lo com aquela tirada,até desaparecer ao longe.

JORNAS

As vinhas estendiam-se a perder de vista,um mar,e o tempo da colheita aproximava-se. Ia haver muito trabalho para homens e mulheres,que bem precisados estariam de ganhar uns patacos. Era a sua grande esperança. Em muitos lares,não entrara dinheiro que se visse à largos e sofridos meses.
Naquele ano,tinham acordado não aceitar as jornas que vinham sendo anunciadas. Por aqueles valores recusariam. Os patrões que se arranjassem. Alguns cederam,os de menores áreas. Mas os outros teimaram. Nem mais um tostão. Não faltaria gente que se sujeitasse ao que fora fixado. E assim acoteceu. De uma região já habituada a emprestar os seus braços,vieram ranchos de ainda mais precisados.
Os ânimos dos homens lá da terra exaltaram-se. Aquilo não podia continuar. Qualquer dia teriam de deixar também as suas casas,como esses lá de cima. E um deles perdeu a cabeça. Venho pedir trabalho. Já estou servido. Pouco mais disse naquela ocasião. Uma arma branca,bem afiada,enterrou-se-lhe no pescoço. Foi por um triz e foi a desgraça do treloucado.

MUITO JEITO

Olhe,se você conseguir,não digo anular a pena,mas reduzir o castigo,pode contar comigo enquanto eu andar cá no negócio. O castigo dependia do grau da maroteira,que nova análise podia mitigar. Estaria dependente da argumentação da defesa. O castigo foi reduzido,mas aquilo era serviço para um estômago forte,o que não era o caso,pelo que a coisa ficou por ali,com muita pena,que sempre rendia uns cobres que faziam muito jeito.

PACIÊNCIA

Vivia ele a pensar no fim do mês,esperando ansiosamente que ele chegasse. Os tempos mais vividos eram os últimos dias,muito em especial a véspera,que até lhe dava um certo gozo. Depois,vinha depressa a realidade. Ainda há pouco contava as notas e já quase nenhuma lhe restava. Uma parte para isto,outra para aquilo, e acabava por chegar sempre à mesma conclusão,que era a de estar ganhando pouco.
Se ele tivesse feito certas economias,talvez a angústia fosse menor,mas o diabo da sociedade de consumo em que ele estava metido até ao pescoço,e mesmo mais acima,não lhe deixava apreciável margem de manobra. As tentações eram múltiplas,estimuladas pela artimanha das prestações,até nas viagens ao estrangeiro,pois podia-se ir por esse vasto mundo quando lhe apetecesse,pagando,aos poucochinhos,durante um ano ou mais,tempo de muitas aflições,mas largamente compensadas pela satisfação que colhia sempre que narrava os pormenores das passeatas aos amigos,mas,sobretudo,aos "inimigos".

As viagens tinham,também,uma certa semelhança com a espera da próxima mesada. O melhor estava na sua preparação. Era a leitura da prosa de encantar lá dos folhetos,era a beleza inexcedível das imagens,era o passeio estimulante pelos mapas. Depois,depois,não fora bem assim que tinha imaginado,pois as visitas terminavam quando mal tinham começado,a comida deixara muito a desejar,alguns dos companheiros não tinham ponta por onde se lhes pegasse,enfim,uma seca,uma coisa para esquecer,tomara que aquilo acabasse,e depressa. Mas no ano seguinte,lá voltava a repetir,senão o que é que haviam de dizer lá no emprego,e não só? Tinha de ser,uma fatalidade.
O que lhe valia eram os subsídeos de férias e de fim do ano. Esperava por eles tal,ou mais,como nos finais dos meses. Passava também uns bons bocados quando da aproximação da taluda, mas era sempre sol de pouca dura,pois bem depressa levavam sumiço,uma desgraça. Não havia volta a dar-lhe. Paciência,era o que ele tinha de arranjar. Era a vida,que a uns corria às mil maravilhas,pelo menos era o que parecia,a outros era o que se via. Paciência.

UM BOM PEDÚNCULO

A pujança daquele tufo de folhas muito largas e de pedúnculos a condizer,mesmo ali à beira de água. A vida que elas levavam. Mas tudo tem um fim. E o fim chegou quando se lembraram de lhes arranjar um vizinho muito incerto,um repuxo disposto a fazer das suas.
Tinha este vizinho um aliado de peso e que era a brisa,também muito incerta. Talvez fossem da mesma familia,quem sabe. O certo é que as folhas passaram a ter uma vida muito agitada.
E era o que estava sucedendo naquela manhã,por via de uma brisa menos amena e vária. A folha mais castigada não se fartava de carpir. E com razão. O que valia era o pedúnculo,que aguentava,ainda que pouco firme. Bem se fartava a pobre folha de se lastimar. As outras ouviam-na,mas nada podiam fazer. Ela que tivesse paciência,que fora o que as animara quando lhes calhara a vez.
É assim,a vida,destas e doutras folhas,e não só,um só muito composto. Paciência é que é preciso,que outro remédio não há,porque de agitações não se podem as folhas livrar,e não só,um só muito composto. É assim a vida. E quem puder aranjar um bom pedúnculo, melhor resistirá,como acontecia com aquelas folhas. Só um vendaval as quebraria.

sexta-feira, 25 de setembro de 2015

GLOBAL WEATHER HAZARDS SUMMARY SEPTEMBER 4-10,2015

Global weather hazards

EXTREME WEATHER,MADE BY US ?

Climate change

A SUA MUITA FÉ

O marido fora condenado,por falta tida como muito grave, e ali terminara a sua carreira. Mas ela nunca se conformou. Havia de remover céu e terra para o reabilitar.
Durante largos anos,aquela alma não desarmou. Da terra pouco tinha a esperar,mas do céu,não. De lá viria a reparação,era a sua muita fé. Foi lá pelas alturas,pois, que ela mais tentou,sem um desfalecimento.
Sucedeu até um fenómeno digno de registo. O seu homem,que pouco ou nada ligara a essas coisas da religião,quase a igualou na esperança de uma outra vida,onde se faria a justiça devida. Passou a ter pela companheira uma espécie de adoração. Quando ela desfiava a sua ladainha,todo ele ficava suspenso,olhando-a.
Se ela assim não tivesse procedido,o mais certo seria o marido ter sossobrado. A pouco e pouco foi recobrando forças para regressar à luta. Não foi tarefa fácil,pois havia a tal mancha. Mas lá conseguiu dar a volta,que ela terá ajudado,na terra,e,sobretudo,no céu.

MAIS A FRIO

Vem daí comigo.Não posso continuar mais aqui,nesta espelunca. E tu devias fazer o mesmo. Largamos o nosso dinheirinho, que não é nada pouco,e é sempre a mesma comida no prato. É um roubo.
Tenho aqui uma série de moradas,nalguma hei-de encontrar o que me convém. Bateu ali,bateu acolá,mas em vão. Nenhuma porta lhe agradou. Depois,mais a frio,reconsiderou. Tinha de ter paciência.
De facto,onde é que ele iria arranjar um poiso como aquele? Além de fazerem vista grossa,quando ele entrava, acompanhado, para o quarto,onde é que ele iria encontrar uma gerente como aquela,que tinha com ele intimidades como se fosse da família?

MOÇO DE FRETES

Tudo nele é enorme,a cabeça,o tronco,a barriga. A passada é lenta,pausada,sem pressas. Tem residência,há anos,em prédio abandonado,com dois fogos na sua história. É moço de fretes de dono de barriga também saliente,estando,assim,
bem um para o outro.
O patrão tem negócio de bilhas de gás, e tem carrinha para as trazer e levar. Ao lado do patrão a conduzir,o moço de fretes parece mesmo o quem manda,de tão imponente que ele vai. Nunca sonhara o moço de fretes ser assim transportado,
ele que dorme lá na companhia de ratos,baratas e outros que tais.

A MUITO DESPROPÓSITO

Vejam lá o que há tempos testemunhei,dissera o senhor Joaquim. Estava eu à espera de que uma porta se abrisse. Não era essa uma porta qualquer,não senhor,eram uma porta de variados desempenhos, muitos deles de alta qualidade.
Pois qual não foi o meu espanto quando dou com a estrela daquela tarde,uma estrela,por sinal,de muito brilho,a querer saber onde é que iria atuar. Então, ninguém da casa daquela porta estava ali para receber tal astro? Apenas a menina da recepção,que não sabia como se proteger de tanta luminosidade,a dar as suas tímidas indicações?
Alguém que estivera ouvindo isto,não resistira. Sim,conhecia muito bem essa casa,não só por dentro como por fora. Ainda há dias lá brilhara.
Não vinha isto nada a propósito,mas sim a muito despropósito,pois nenhum instrumento ele tocava. Mas não podia perder aquela rica ocasião para aparecer no palco,bem à frente,para que todos o pudessem ver e admirar. Não teria o dia ganho se tivesse enjeitado aquela oportunidade,de,mais uma vez,se mostrar. Era assim,e não havia nada a fazer.

PERDA DE TEMPO

Ali estavam aquelas quatro almas contemplando o mar. Dum lado e doutro,estendiam-se longas tiras de areia apinhadas de gente. Viam-na de longe. De mais perto,seria uma tentação,porventura um pecado. No cimo daquelas rochas,onde se sentavam,sentiam-se protegidos.
Muito pouco os unia,talvez só a solidão disso se encarregasse. Não chegara ainda a hora de procurarem companheira,era o mais certo,mas já se estaria fazendo tarde. Coisas que acontecem,vá-se lá saber porquê.
Como quer que seja,pode dizer-se que não era um conjunto para durar. Um ligeiro aquecimento chegaria para o desfazer,quanto mais um de muitas calorias. E foi o que sucedeu,quando a tal hora soou.
Não mais foram vistos naquelas contemplações serôdias. Notava-se logo,mesmo à vista desarmada,que aquilo não tinha jeito. Era uma perda de tempo e uma ofensa à paisagem. Constou até que o mar estivera para intervir,expulsando-os dali.

quinta-feira, 24 de setembro de 2015

NOVEL COMPETITORS SHAPE SPECIES' RESPONSES TO CLIMATE CHANGE

Climate change

CARBON : RESOLVE AMBIGUITIES IN CHINA'S EMISSIONS

Carbon

CLIMATE POLICY : DEMOCRACY IS NOT AN INCONVENIENCE

Climate policy

UN APPROVES GLOBAL TO-DO LIST FOR NEXT 15 YEARS

Poverty

ECOLOGICAL IMPACT OF CROPS DROPS

Crops

IN THE NAME OF BEAUTY

Beauty

INTEIRA

Era uma frágil vara que fora lançada a um rio,muito perto da nascente. E lá viera ela por ali abaixo,encalhando ali,libertando-se além. Parecia,às vezes,ficar retida de vez,mas assim não calhou,vá-se lá saber porquê. Certo é que a pobre vara acabou por chegar à foz,sumindo-se no mar. Andou nisso uma vida. No final,não era,via-se bem,a mesma vara lá do começo da arriscada aventura. Estava cheia de marcas,das pancadas que levara. Mas entrara inteira no mar

CANTOS DA CASA

Afinal,o ouro negro,de ouro,só tem o nome. É que se pode derramar, incontidamente, no mar,talvez por conhecer bem os cantos da casa,pois foi do mar que ele veio. Quando tal acontece,parece isso castigo,por se ter ido acordar quem estava dormindo um descansado sono de milhões de anos.

IRREQUIETO

Os seus olhos visavam muito lá por cima,parecendo não dar conta do que à sua volta se passava. Mas dava,só que não queria que se soubesse. Tratava-se de um ardil,de uma manha,para apanhar alguns desprevenidos.
Anos tinham corrido,não muitos,mas para ele uma eternidade,e a sua figura quase se não vira,e a sua voz quase se não escutara. Pois não tardaria que tal radicalmente se alterasse,para bem da humanidade.
Para começar,inscrevera-se. E quando alguém como ele fazia este muito sério gesto,não era para ver a caravana passar. Era,antes,para se pôr bem à frente dela. Seria o que ele estava arquitetando?
O que havia a fazer era esperar e ver o que dali iria sair. E seria rápido. Porque ele,quando tomava uma decisão,era para logo agir,sem perda de um segundo sequer. Hesitações,é para os fracos,os timoratos,e com esses não se importa a história,onde ele queria,merecia,estar na linha da frente.
Que ele era superior,não restava qualquer dúvida,pois já o tinha mostrado em vários palcos. Mas havia indicações de que era,também,muito irrequieto. E assim,podia acontecer surpresa.

ÀS MOSCAS

Fazia um calor dos diabos,daquele de "está d'escachar". Apetecia,àquela hora da manhã já alta,estar recolhido numa sombra amiga. Era o que acontecia com um grupinho que cabeceava debaixo de uma frondosa árvore.Esperavam,certamente,que os não viessem incomodar com inquirições esquisitas. Pois andavam em maré de azar.
Um forasteiro queria saber,com falinhas mansas,onde ficava o museu. Ele havia cada um. O museu. Ainda se fosse a taberna de fulano ou a venda de sicrano,vá que não vá,mas o museu era mesmo de pessoa muito estranha,talvez de estrangeiro.
E o homem insistia,não largando as tais falinhas. O Manel era capaz de saber. Sim,isso ficava lá para baixo,ao fundo. Estaria aberto?,a pensar que iria bater com o nariz na porta,depois de ter descido uma respeitavel ladeira. Isso é que era saber demais.
O homem agradeceu,pedindo desculpa pelo incómodo,e já que tinha chegado até ali,aventurou-se. Estava aberto,mas a porta iria encerrar,sem apelo. Era absolutamente necessário irem descansar,depois de toda uma manhã às moscas.

MAIS UM MILHÃO

Um simples,a quem tinham dado uma varinha mágica, para dar conta da miséria onde quer que a encontrasse,livra-se dela,ao ver que todos queriam sempre mais um milhão.

quarta-feira, 23 de setembro de 2015

THREAT OF PLASTIC POLLUTION TO SEABIRDS IS GLOBAL,PERVASIVE,AND INCREASING

Plastic pollution

SILENT SPRING IN THE OCEAN

Silent Spring,

INNER WORKINGS : PAVING WITH PLANTS

Green roads

DEZ FARIAM MELHOR

Era caso para o homem andar angustiado. É que o material com que trabalhava não se podia reduzir a números. Aquilo era mesmo como o cada cavadela sua minhoca,todas diferentes no tamanho,na forma,na cor.
Pois não era de desanimar ,entre outros factos,o saber-se que decorrido o tempo necessário para se apurarem conclusões que servissem de guia,logo apareciam novas variedades,que,como o nome sugere,apresentavam novas caraterísticas,novos comportamentos?
E quando pensava em muitos que poderiam beneficiar com as últimas aquisições,para quem certos conceitos eram coisas de outro mundo? Não mais se esquecera de que,em certa ocasião,ficara muito admirado ao verificar o desconhecimento das medidas de área do sistema decimal. Como poderia haver entendimento?
Depois,o senso de alguns que os levava a perigosos exageros. Tinham-lhe dito que devia aplicar apenas cinco. Parecia-lhe pouco. Se cinco faziam bem,dez,certamente,fariam melhor. E vá de pôr dez,com o risco de intoxicar o sistema num ou noutro troço,ou em todo ele. Havia quem exultasse com tais exageros,pois só viam o dia de hoje.
E o fraco valor de certas obras julgadas de grande interesse ,quando se tinham ignorado factores essenciais?

COM MUITA HONRA

Tinha lá andado,sim senhor,e com muita honra,fiquem sabendo. E se for preciso voltar lá,é só dizer,que eu largarei tudo o que estiver a fazer,com grande alívio.
O seu caminhar era lento,pausado,ausente,calado. Não era ele que ali ia,seria,talvez,um outro,em que,um dia,já há muito tempo,se transformara. Parava nas esquinas,e ali ficava,olhando em volta. Não comunicava. Só uma vez,muito nervoso,desabafara. Se acaso lá voltasse,tornava a fazer o mesmo,com muita honra.

NADA MAL

Não desistiam,apsar de não serem capazes de levar a sua avante. E não o faziam pela razão simples,talvez única,de ser aquele o seu nada mau modo de vida,pelos proventos que lhes traziam. Depois,aonde é que iriam arranjar um melhor,um que tanto lhes enchesse as medidas,um que lhes desse tantas alegrias?
De resto,iam lutando por uma boa causa,e que era a de melhorar a vida de muitos,que nunca a tinham visto sorrir. Mas eles sabiam muito bem que muito pouco ou nada conseguiriam. Era como estarem a investir contra moinhos de vento. Ficavam apenas os gestos,nada mais.
Mas sempre iam alimentando os sonhos de muitos,o que,vistas bem as coisas,era ação de grande mérito. Enfim,ficava muita gente mais ou menos esperançada,enquanto eles lá se iam governando nada mal.

UM BAILADO

Eram muitas as formiguinhas, em nervoso movimento,parecendo perturbadas. Mas por que haviam elas de fazer pela vida naquele empedrado,mesmo ali à vista de uma estrada de contínuo fluxo,dela apenas separada por estreita tira relvada? Isso seria lá com elas. O facto,é que lá andavam para a esquerda,para a direita,para a frente,para trás,para cima,para baixo,sem pararem. Lembrava aquilo um bailado. Mas que agilidade a delas. Separavam as pedrinhas uns estreitos canais. Mas à sua escala,seriam,antes, ravinas profundas e largas. Pois venciam-nas com muitas pernas às costas. Com gente,seriam braços e pernas partidas, certamente. Depois,dava ideia de que se arrependiam continuamente,voltando para onde tinham partido ainda há instantes,transpondo os mesmos desfiladeiros com igual ligeireza. Um prodígio,não havia dúvida. Estariam tontas? Tanto esforço,ou não,sabe-se lá,para nada,pelo menos assim parecia. Para recomeçarem tudo de novo.

CORREDOR VERDE

Pela maneira como entrara,cheio de importância e de pressa,parecia ele também mandar ali. Na mão direita,levava uma pasta,que devia estar a abarrotar com documentos dos seus negócios. Os olhares que alguns lhe deitavam eram de grande respeito e admiração. Como é que ele se sujeitara a uma coisa daquelas,andar ali,como um qualquer?
Mal o viu,um segurança abeirou-se dele,solícito,talvez sinal de que fosse ele patrão,pelo menos,em parte. Não mais o largou. A segurança que ficasse para depois,que outro valor mais alto se levantara. Pegou em dois cestos e neles foram caindo coisas,sobretudo garrafas de vinho,de marca,certamente. O homem,pobre dele,iria derreado,a um peso daqueles,mas triunfante e agradecido também,pela confiança não enjeitada.
Foi capaz de não se ter submetido a uma bicha,face á urgência transparecida. Terá usado,talvez,um corredor verde,quem sabe?

terça-feira, 22 de setembro de 2015

PORTINHO DA ARRÁBIDA - PORTUGAL

Portinho da Arrábida

PAINEL DE AZULEJOS - IGREJA DE SÃO VICENTE DE FORA,LISBOA

Fábulas de La Fontaine

PROTESTOS E CRÍTICAS

Eram aqueles uns tempos de muito atraso. Não havia telemóveis. Assim,o moço,logo que pôde,apressou-se a enviar um telegrama à família.

Estava-se a um domingo e a estação de correios mais próxima era lá para o cabo do mundo. Havia de lá chegar. No caminho,ainda não tinha dado meia dúzia de passos,deu de caras com uma grande manisfestação de reformados. Protestavam contra a carestia. A mesada era curta.A polícia acompanhava. Um pouco mais adiante,outros protestos,também com polícia à vista. Agora,tratava-se de uma guerra,que estava a alongar-se demasiado,ou nunca devia ter começado. Mas esta gente muito protestava.
O tempo estava frio e chuvoso,pelo que o melhor era recolher à casa onde fora destinado. A temperatura,lá dentro,era quase de verão. Ali,sim,estava-se muito bem. O senhor,um espanhol,que estava de serviço era muito conversador e crítico. Veja lá que esta gente só quer é descansar. É a interrupção da manhã,para o café,e a da tarde,para o chá. Assim,como é que eles querem entregar as encomendas a horas? Desta maneira,não vão lá. Mais ou menos um mês depois,alguém llhe disse que leva tempo,mas é bom.

IR DESCANSAR

Era aquela uma terra de ninguém,uma espécie de baldio,quer dizer,qualquer um podia lá entrar,colher dela o que entendesse,não exagerando,claro,mas não demorar-se. Tratava-se de um costume muito antigo,sempre respeitado.
Aconteceu,um dia,vir instalar-se nela alguém que não estava para esses ajustes. Achava que aquela terra era mais dele,pelo que podia por lá permanecer. Os outros,só a correr. Mas isto de a correr já eles todos sabiam e faziam,escusava de o estar a lembrar. Quanto o ser mais dele,queriam ouvir as razões.
Ele deu-as,pensando ter convencimento geral. Quase acertou. É que um não esteve para as aceitar e passou também a frequentá-la mais vezes.
Era para ter havido guerra. Não houve,porque,de maneira inesperada,o opositor,já um tanto velho,decidiu ir descansar.

SÍMBOLO DE RESISTÊNCIA

Era um apaixonado pela botânica. Não admirava,pois,o seu grande interesse pela Gingko Biloba,sobre a qual dissertou. Um símbolo de resistência. E o que contou parecia ser uma prova disso.
Dera em tempos uma folha a um neto para o seu herbário. Pois a folha,ao contrário,de outras,nunca secou.

ISSO ERA DANTES

Hoje é dia de ele ir visitar o pai. A criança andaria pelos dois anos e a mãe não teria mais de vinte. Talvez nem isso. A notícia foi dada em voz alta,descontraída,podendo tê-la ouvido meio mundo. Seria essa a intenção? Mas o tom do anúncio trazia poucas dúvidas. Parecia aquilo não lhe dar tristeza. Tristezas? Isso já se não usa,isso era dantes.
Já casara,já tivera um filho,por sinal, um lindo menino,lourinho e de olhos muito azuis,aliás,como a mãe,e estaria pronta para uma nova fase do seu percurso,que ainda mal começara. Os velhos continuariam a ver nela a sua linda menina e estariam dispostos a ampará-la até Deus os levar. Tinha ela,de facto,uma poderosa retaguarda.
Não tardará,pois,que ela se lance,de novo,à estrada. Tem todos os requisitos para receber muitos prémios.O começo da prova para isso,efetivamente,aponta.

INIMIGOS

Por ali havia javalis para dar e vender.Mas não eram só eles. Podia dizer-se que havia para todos os gostos. De uns,os javalis nada temeriam,mas com outros tinham de estar sempre com os olhos bem abertos, muito em particular no caso dos crocodilos.
Havia também o homem e havia o fogo. Dois grandes inimigos seus. Não se sabia era qual deles seria o maior. E,certa dia,surgiu uma contribuição.
Era à tardinha,altura em que os homens regressavam dos seus trabalhos,mas também para um fogo se lembrar de por ali aparecer. E o que é que,a dado momento,alguns homens viram? Aí uma meia dúzia de javalis,muito aflitos,a fugirem do fogo.
Pois estes javalis,quando deram com aqueles homens,sem hesitações,fizeram meia volta e
atiraram-se ao fogo. Preferiram imolar-se nas chamas,do que ficar sujeitos às balas dos homens,que,naquele caso,não existiam.
É arriscado fazer generalizações,mas quanto àquela meia dúzia de javalis,parece ter sido feita prova de que o seu maior inimigo era o homem.

segunda-feira, 21 de setembro de 2015

SERRA PENEDA-GERÊS - PORTUGAL

Serra Peneda-Gerês

PRAIA DA ROCHA,ALGARVE - PORTUGAL

Praia da Rocha

SERRA DE SINTRA - PORTUGAL

Serra de Sintra

MUITO AMIGOS

Então,não tens medo de andar por aqui sozinho mais as tuas ovelhas? Olha que em tempos andaram lobos por estes sítios. Eu sei isso muito bem,que os meus pais,de vez em quando,falam nisso,mas agora já não há. Posso andar por aqui descansado.
Mas se um dia derem,outra vez,em aparecerem,tenho quem me defenda. É esse cão que aí está. Ele não ia deixar que os lobos me fizessem mal. Somos muito amigos.

A SUA MÃO

Naquela manhã, o Armando não pudera vir trabalhar. Coubera pela segunda vez ao trepeiro. Desta vez,o local a examinar ficava próximo da sua casa. Quando se passou por ela,pediu para ir chamar a mulher. É que tinha feito questão em apresentá-la. Ela veio,um tanto envergonhada. Não se contou o tempo,mas o aperto de mão,muito badalado,demorou o tempo que ela entendeu gastar naquele gesto. Foi ela que recolheu a sua mão.

EXAGEROS

Por vezes acontece pagar o justo pelo pecador. Vem isto a propósito do que sucedeu certa vez. Pareceu,nessa ocasião,ter chegado a hora de pôr um ponto final em injustiças clamorosas,que já vinham, por assim dizer, lá do fundo dos séculos. Era a hora da "vingança",doesse a quem doesse. É que não havia tempo para apurar culpas ou inocências. Tinham sido muitos os anos de sujeição,não havia tempo a perder com dúvidas. Iria tudo a eito,sem detenças,não fosse,
rapidamente,voltar tudo ao que tinha sido antes,ou pior ainda. Teriam feito,ao menos,o gosto ao dedo.
E assim, lá tiveram de ir,mulher,marido,dois filhos quase de colo,todos como que de baraço ao peito,submeterem-se ao vexame de um julgamento,do qual se sabia,de antemão,a sentença. Os "injustiçados" riam,gozavam,certíssimos de que tinha chegado a sua hora.
Coitados deles,muito tinham passado,efetivamente,eles e os que lhes tinham antecedido,desde,
pode dizer-se,o princípio dos princípios. Chegara a sua vez,de virem cá para cima,olhar,com desprezo,e sabe-se lá mais o quê,para aqueles que os tinham desprezado,e sabe-se lá o quê. Só que, naquele concreto caso,tinham errado o alvo,só que,com as pressas,tinham metido todos os"inimigos" no mesmo saco.
Por tudo isso,por toda essa injustiça imensa,foram perdoados os "algozes" de ocasião. Verdadeiramente,não eram eles os culpados,coitados deles. Tinham sido levados àquele exagero clamoroso,porque tinham sido clamorosos os exageros que tinham suportado,eles,e todos aqueles,multidões incontáveis,na verdade,que eles ali representavam

PORTA NA CARA

O que o senhor estivera ali a contar lembrava um dizer antigo. Vá lá a gente ser bom. Passara-se aquilo há muitos anos. Não se tratava,porém, de novidade.
Pois é como vos digo. Aqueles são mesmo tempos para esquecer. Ganhava uma miséria e tinha de sustentar mulher e filhos. Mas mesmo assim,ainda tive de partilhar,uma vez, com o patrão. Não acreditam? Pois é a pura verdade. Foi assim como uma espécie de redução de salário. Ele dera-me emprego e não tive cara de lhe dizer não. Onde come um,comem dois.
Mais tarde,as coisas alteraram-se e muito. Correram muito bem para o patrão,mas a mim,
infelizmente,deram para o torto. E assim,não vendo outra saida, bati-lhe à porta,para uma ajuda.
Os amigos são para as ocasiões,não é? Pois levei com a porta na cara.
Esquecera-se da compreensão que eu em tempos tivera,num seu aperto. Eu não fui cobrar,longe de mim,mas estava mesmo necessitado,e à minha volta não via mais ninguém a quem pudesse
recorrer. Não resta dúvida,de que não se portou bem.

MESMO ASSIM

Aquela grande quinta,em plena urbe,que ele via lá do seu quarto, de um lar para idosos,desafiava-o. Vivia agora ali,acompanhando a mulher,a precisar de cuidados médicos,pois,coitada dela,já não dizia coisa com coisa. Era a velhice,que a uns chega mais cedo. Ele,graças a Deus,apsar dos seus oitenta e dois anos,ainda estava rijo.
Havia de lá ir um dia. E calhara naquela tarde soalheira. Lembrava-lhe aquela quinta os seus começos. Abalara de lá,da sua aldeia,um moço ainda. Mas era a vida. Tivera de se fazer a ela,que lá na terra aquilo pouco dava.
Quase quarenta anos a percorrer essa Europa,como condutor de longo curso. O que ele vira,por onde andara. Podia dizer que fora a quase todos os cantos. Aquilo é que eram terras. Mas nunca se esquecera dos tais começos. Tinham-se-lhe entranhado,lá bem no fundo.
E ali se encontrava ele agora,coscuvilhando a grande quinta,que ele via lá do seu quarto. Lá estava a vinha,lá estavam os pomares,lá estava a terra de semeadura. Aqui devia estar trigo,que a terra parece estar a pedi-lo. Tem boa cor.
Bem,já matei as saudades. Tenho de me ir chegando,que a patroa está para lá sozinha. Ela,coitada,a bem dizer,já me não conhece. Mas faz-me ela companhia a mim,mesmo assim.

domingo, 20 de setembro de 2015

TAGUS RIVER - SANTARÉM,PORTUGAL

View from Portas do Sol belvedere

NO TEJO - JOÃO VAZ

João Vaz

ANTERO TARQUÍNIO DE QUENTAL - PORTUGUESE POET

Antero de Quental

MANOEL DE OLIVEIRA - PORTUGUESE DIRECTOR

Manoel de Oliveira

MODELOS

Pois claro que ocorreram exageros,mas de nenhum modo originais. É que no passado,em todas épocas,afinal,exageros, maiores,ou menores, tinham sido o pão nosso de cada dia,uma maneira de dizer,nada mais.
Pois claro que os ganhos de muitos,por tempos infindos,tinham andado bastante cá por baixo,quando sobravam casos de desmesuradas colheitas,conseguidas algumas sabe lá Deus como.
Era de esperar que ambições,ressentimentos,ali bem à vista ou encapotados,abundassem. Tinham brotado,não na véspera,mas vinham lá do fundo das eras,talvez de muito próximo da hora zero.
Fora,assim,como que uma revolta de escravos. Saídos de uma clara míngua,que parecia eternizar-se,apressaram-se,chegada a hora,a seguir os modelos que eles conheciam. Se,acaso,tivessem sido outros,muito provavelmente,outros comportamentos teriam exibido.

ALVOS

Fora poupado no ventre da mãe,mas logo o que se seguiu,sem uma única exceção,não esteve para isso. Teria,naquela altura,quando muito ,quinze anos,passados,inteirinhos,entre barracas,o seu mundo. Com pais de vida incerta,crecera aos baldões da sorte.
Veio a guerra e ele viu-se na resistência,porventura,sem saber como. Deram-lhe uma arma e indicaram-lhe os alvos. Tantas vezes acertou,que teve direito a louvor e medalha. Mataria por prazer,talvez descarregando nos outros o que lhe ia na alma. Infância agreste,ausência de carinhos. Em vez disto,maus tratos,por tudo e por nada.
Veio a paz e veio a vida que ele conhecia muito bem. Esqueceram-se dele,mas ele não se esqueceu do seu apurado jeito. Alvos não faltavam. Eram todos os outros,os inimigos,sem distinção. Ainda fez o gosto ao dedo. Mas, desta vez,o prémio foi bem diferente.

CONCORRÊNCIA

O patrão dera-lhe uma ordem,não por escrito,mas verbal. Nesta vasta área,que o senhor administra, em meu nome,não quero ver um posto de vendas de bebidas alcoolólicas,nem fábrica,nem fabriqueta para as produzir.
Pode o patrão ficar descansado que a sua ordem será cumprida. E se alguém se atrever a afrontá-la,quero que saiba que o castigo será severo. O patrão,que já considerava muito este seu admnistrador,com maior consideração por ele ficou.
Certo dia,o admnistrador recebe denúncia de prevaricação. Num local muito escondido,tinham instalado uma destilaria,que laborava de dia e de noite. Demorou uns segundos a preparar-se para a ação. Não foi apenas um,pois teve de se vestir e calçar devidamente. Parecia que tinha à sua espera uma guerra. As botas,via-se bem,eram blindadas.
Quando lá chegou,depois de ter suado um bom bocado,que a fabriqueta ficava para lá de montes e vales,entrou logo a matar. Por sorte,não estava lá gente,apenas as estruturas. O homem parecia ter o diabo no corpo. Deixou tudo em cacos. O líquido precioso empapou o lugar.
Uma batalha destas merecia condecoração,que não lhe foi negada. Mas não a teve muito tempo. É que se descobriu que o maroto tinha,ele mesmo,porta aberta,muito bem disfarçada. Está-se bem a ver o que lhe aconteceu. Nem mais um minuto,para aprender.
Afinal,toda aquela fúria destruidora estava bem explicada. Concorrência,nunca.

sábado, 19 de setembro de 2015

PRAIA DE BANHOS,PÓVOA DO VARZIM - MARQUES DE OLIVEIRA

Marques de Oliveira

A VOLTA DO MERCADO - SILVA PORTO .

Silva Porto

AI,CREDO ! - JOSÉ MALHOA

José Malhoa

TRANCA

Aquele serviço novo,de calcorriar montes e vales,não começara nada mal. Não lhe coubera um quarto de primeira,lá na pensão,mas sempre era melhor do que uma barraca. Janela não havia,mas tinha porta,a que faltava a chave. Em sua substituição,servia uma cadeira de tranca.

ASSIM NÃO DAVA

Não parecia,mas, por junto, estivera em França quase vinte anos. Regressara quando já não tinha mais meias onde guardar as notas que conseguira poupar,sabe-se lá,que ele não disse,à custa de que sacrifícios. Com elas,fez uma casita,muito melhor do que aquela que tinha deixado lá na terra de onde abalara,comprara uns pedaços de chão,que jurara serem,um dia,seus,e mais um carro,para não ter de andar a pé,que já ia ficando um bocado cansadote.
Tinha,também,à sua espera,ou ele à espera dela, uma reforma pelo tempo que lá passara. Estava com receio das burocracias,mas tudo se havia de resolver,que ele era muito paciente,pois andara numa boa escola.
Para se ir entretendo,além do emprego que arranjara,que não era grande coisa,cultivava lá os pedacitos,sobretudo aos fins de semana,mas estava a ver que o melhor era fazer só o vinhito lá de meia dúzia de cepas,pois os intermediários queriam levar tudo,e assim não dava. O que lhe valia era a mulher,que não o acompanhara lá na França,que o ajudava muito,pelo que lhe estava muito agradecido,como ela sabia.

O TARECO

É só sair à rua,para,estando para isso,arranjar logo para uma história. Era um senhor,um cavalheiro,já com uma bonita idade,acompanhado de uma senhora,com modos de ser a sua esposa. Uma outra senhora,de carro,acabara de ter um proceder,não importa qual,de que ele não gostara.
Pois o senhor,o cavalheiro,além de comentar eu logo vi,é uma mulher ao volante,lança da sua boca um caudal de escolhidas palavras,de primeira apanha,do melhor. Quer dizer,seriam essas palavras as que ele usaria,certamente,lá em casa,pelo que a esposa e o tareco já não estranhariam.

PASSAGEM DE ANO

Sente-se aqui. Noventa e um anos. Boa memória. O pai morrera muito cedo. De cinco irmãos,era ele o mais velho. E assim,com apenas treze anos,tivera de se desembaraçar,aliviando a carga da mãe.
Tem dois filhos,mas esses têm lá a sua vida,que bem lhes chega. Vive sòzinho,pois a mulher está internada,com ruim doença. Vê mal,pelo que a televisão pouca companhia lhe faz. Entretem-se a reordar e a tomar conta dele. A filha vem visitá-lo na passagem do ano.

O CÚMPLICE

Era barbeiro de profissão,mas,naquela altura, andava ali a marcar passo . Tivera de ser.Morava perto. Já casado,pedia dispensa nos fins de semana. Ia,de bicicleta, ver a mulher e ganhar uns preciosos patacos,recorrendo à sua arte. Baixote,humilde,era gozado por alguns colegas,sobretudo,por uns espertinhos da cidade,muito sabidos.
Num dia da semana,havia uma aula de educação moral e cívica. E era aí que ele tinha o seu dia de vingança,pois arranjara um amigo no instrutor. As aulas terminavam com um interrogatório,para ajuizar do aproveitamento da cada um. E está-se mesmo a ver o que é que acontecia. Aos espertalhões,aos abusadores, eram postas as questões mais complicadas. Eles,que se davam ares de grandes senhores,entupiam de todo. Ficavam envergonhados,comportando-se como meninos apanhados em falta. O barbeiro respondia sem hesitações,beneficiando da generosidade do cúmplice.

sexta-feira, 18 de setembro de 2015

KING COAL AND THE QUEEN OF SUBSIDIES

King coal

REFORM FOREST FIRE MANAGEMENT

Forest fire

WILDFIRES BURN SCIENCE CAPACITY

Wildfires

COMO NOVOS

Era a primeira vez que vinha ali? Ele riu-se,de gosto. Não senhor. Já lhes perdera o conto,tantas tinham sido. Vinha ele mais a patroa,pois as águas dali faziam muito bem aos dois. Iam de lá como novos. Estava à espera da mulher e era aquele banco o poiso costumado. Ali se ia entretendo,enquanto ela andava por lá nos tratamentos. Era coisa demorada. Acabara de ouvir as notícias pelo transistor que trazia sempre consigo. Era o seu fiel companheiro. Às vezes,não lhe apetecia,pois aquilo,a bem dizer,era quase sempre a mesma coisa. Do que gostava mais era das músicas,não de todas,claro,mas havia muito por onde escolher. Quando não lhe estava a agradar,mudava de posto. Entretanto,ia passando gente. Alguns saudaram-no respeitosamente. Seria pessoa de muita consideração.Tinha lá na terra um negociozito,que lhes dava para virem até ali. Era um negociozito de copos do bom vinho lá da região,que se dava muito mal com águas,ao contrário deles,que iam dali como novos.

UMA DESCULPA

Viera pôr o lixo no contentor,ali perto da sua porta. Era o que fazia todas as noites. Mas naquela,aconteceu o inesperado. Ao levantar a tampa,desequilibrou-se,e caiu,ficando imobilizado entre o caixote e o passeio.
Foi assim que um vizinho o veio encontrar. De princípio,àquela luz frouxa,não quis acreditar,mas atentando melhor foram-se-lhe as dúvidas. Mas é o senhor José. Vou já levantá-lo. É o levantas. Embora para o magrote,aquele corpo sem forças pesava como se de chumbo fosse. Teve de ir pedir ajuda.
O senhor José estava muito envergonhado e abatido. Não era,de facto,para menos. Vejam lá a que cheguei,quase também feito lixo. Não queria contar à mulher o que lhe sucedera,para não lhe dar mais ralações. Vou inventar uma desculpa para a demora. Peço-lhes que façam também o mesmo. É como se nada tivesse acontecido.
Servira-lhe isto de emenda. Dali em diante,deixaria de cumprir o que vinha indicado lá no contentor. De dia,passa mais gente,e assim,se vier a repetir-se o que hoje me aconteceu,não ficarei tanto tempo no chão. Para o que uma pessoa estava guardada.

LIXO

Talvez estivesse de férias,talvez lhe tivesse apetecido faltar ao trabalho,que o tempo estava para isso,talvez vivesse já dos rendimentos,enfim,um sem número de suposições.
O certo é que ele gastara naquele vasto jardim duas boas meias horas,parando ali,parando acolá. Não ia só. Acompanhava-o a mulher,por sinal,muito bem paramentada,em flagrante contraste com o seu boné de pala e o mais a condizer. Traziam, também ,um rebento,ainda de mama,no seu carrinho.
E a dada altura,surpresa aconteceu. Umas calças,daquelas de ganga,jaziam abandonadas e desordenadas num banco. Alguém as tinha deixado ali,não por esquecimento,mas por as ter enjeitado,que elas davam mostras de já terem cumprido a sua obrigação. Pois ele viu-as,e sem uma hesitação,pegou nelas para as examinar,muito em especial os bolsos. Lá concluiu que dali não levava nada,e,sem cerimónias,lançou-as ao chão,que aquilo não passava de lixo.
Ainda se pensou que era para se sentarem,que elas ocupavam grande parte do banco. Mas não. Lá continuou no seu giro,acompanhado da mulher,muito bem paramentada,como para uma festa,e do filhito,muito bem acondicionado no seu carrinho.

quinta-feira, 17 de setembro de 2015

NASA'S FRONT PORCH VIEW OF RISING SEAS

Rising seas

CLIMATE SCEPTICS USE STRONG WORDS

Climate

DE SENTINELA

O alojamento não tinha direito a roupa lavada. Cada um que se arranjasse. Lavandarias,de facto,não faltavam,com baterias de máquinas. Havendo dinheiro,ou não se estando para fazer economias,por se ser sovina ou por outro motivo qualquer,todos respeitáveis,era só procurar uma na esquina mais próxima.
É claro que tinha de se fazer tudo por si,pois não havia alternativa. Quando muito,uma indicação ou outra, para começar,vá que não vá,mas sem abusar. De resto,as instruções estavam ali bem à vista. Mas não era chegar ali e ser logo atendido,pois tinha de se ir para a bicha.
Chegada a vez,era só meter a moeda e carregar nos botões. E ali se ficava de sentinela,comodamente sentado numa cadeirinha,lendo o jornal ou fazendo outra coisa qualquer,como observar.
Acabada a fase da lavagem,seguia-se a de secagem,se ainda se estivesse para gastar mais uma moedinha,que a vida,para alguns,não era um mar de rosas. Aqui havia também uma espera,pois,no geral,só havia um secador. Nem sempre saía a roupa como se queria,vá-se lá saber porquê. Para completar,havia o quarto e a noite,ou o dia seguinte. Os que trabalhavam em laboratório ,e eram muito poupados,faziam o acabamento,ou mesmo a secagem completa,em estufas,aproveitando o fim de semana.

MISÉRIA

Um homem novo,mas de cabelo já grisalho,talvez das muitas ralações,levantara a tampa de um contentor de lixo e estivera uns tempos a pesquisá-lo,a inventariá-lo. Acabara por se decidir por dois sacos,que abriu,a confirmar o valor do achado. Valia a pena levar.
A testemunha involuntária dessa triste cena encontrava-se também ocupado com outro depósito,a caixa do correio,por detrás da porta de vidro da sua morada. Terminadas as pesquisas,os seus olhares cruzaram-se. E o que um viu foi ainda mais triste. A tristeza e a vergonha que se soltaram lá daqueles olhos,do homem novo, de cabelo grisalho. Parecia ter praticado uma feia acção.
Aquele homem estava a precisar de ajuda urgente. Mas que ajuda lhe poderia dar? Uma esmola? Uma pobre mezinha,que apenas ligeiramente o aliviaria. Ficaria,até,mais magoado. A vergonha que os seus olhos espelhavam era bem sinal de que estava consciente da sua situação triste,o que muito lhe havia de doer. Não teria gostado de ter sido visto naquela procura.
Seria melhor deixá-lo ir,desejando que,um dia,um dia próximo,desse com a cura,definitiva, da sua miséria.

NÃO A MERECIAM

Moravam no mesmo prédio há um ror de anos. Escusado será dizer que estavam velhos os dois,muito próximo da despedida. Fase propícia,pois,para deitar contas à vida,fazer um balanço dela,reparar alguns danos.
Aconteceu naquela vez,como já teria acontecido mais vezes,cruzarem-se no patamar. Estava uma manhã de sol,cheia de promessas e de convites. Era uma boa altura,assim,para acertos. Mas ainda não chegara a hora.
Nem uma saudação,nem um simples olhar. Passaram de lado,cada um roçando o mais possível a parede,não fosse haver contágio. Num deles,ou nos dois,haveria maleita grave. Era imperioso,assim,tomar todas as cautelas.
Alguém,muito perto,julga ter assistido a um esquisito fenómeno,que explicaria tão invulgar procedimento. Uma densa bruma,de todo inesperada em manhã tão soalheira,invadira o palco. Seria imprudente descer meia dúzia de degraus sem um apoio capaz. Assim o entenderam os dois,guiando-se pelos únicos de que dispunham. O odor do inimigo deve também ter colaborado.
E daquela vez,como de outras mais,se desperdiçou a mão amiga de uma manhã plena de sol. É caso para proclamar,alto e bom som,que a não mereciam.

AMPLO VALE

Não mais se pudera esquecer ele do rio Longa,ainda que se tivesse tratado apenas de uma convivência de escassos meses,mas que pareciam ter sido uma vida inteira,pela novidade,pela variedade,pela intensidade do viver. Tinha-se-lhe,de algum modo,entranhado.
Bebera da sua água,embora flitrada,lavara-se com ela,atravessara-o,duas,quatro vezes,a bem dizer,diariamente,de jangada,com demoras,caminhara ao longo das suas margens,por motivo de trabalho,ou por avaria do jipe,vira-o,lá do alto,serpenteando,mansamente,por amplo vale,deleitara-se com o frenesim de muitas bocas de peixe que nele moravam,na disputa de alguma coisa de comer,e com o voo picado de algum pelicano na procura de sustento,admirara a galeria de esguias palmeiras e de tufos de bananeiras que o alegravam,descera-o,uma vez,quase até à foz,vendo desfilar lagoas por ele deixadas,restos de inundação recente,lagoas atapetadas de nenúfares,assustara-se com o indesejável encontro com uma giboia,que ia lá à sua vida,quase noite,abandonando o fresquinho da sua casa de beira-rio.
Podia lá tê-lo esquecido. Fora conhecimento para sempre. Mas não só ele,mas também o Nhia,que o engrossava.

quarta-feira, 16 de setembro de 2015

LOW CLOUDS SUPPRESS ARCTIC AIR FORMATION AND AMPLIFY HIGH-LATITUDE CONTINENTAL WINTER WARMING

Winter warming

SUBSTANTIAL INCREASE IN CONCURRENT DROUGHTS AND HEATWAVES IN THE UNITED STATES

Droughts and heatwaves

UM GRANDE PRAZER

Passara-se aquela porta de vila que tinha muito para contar e fora um inesperado mergulho no passado. O ar solene,o desenho dos armários,o balcão alto,quem se encontrava por detrás dele,de bata muito azul,brilhante.
Era um senhor aí de uns cinquenta anos,um tanto para o baixo,de cabelo grisalho,de cara pálida,gorduchinha,de sobrancelhas bastas,de modos cerimoniosos,solícito,do estilo de que o cliente tem sempre razão.
Em que podia ser ele útil? Arranjava-se já. Ficasse descansado,que ia sair dali como novo,tal como tivesse vindo diretamente da fábrica. Era um instante.
Foi só instalar o óculo próprio da ação a operar ,mexer aqui e ali,e pronto,já estava. Teria ali relógio para uma vida,para sempre. Então,quanto é? Não era nada. Tinha sido um grande prazer.

DESABAFOS INCONTIDOS

Coitado do velhote. Mal se punha de pé,e muito mal via. Pois apsar de tanto contratempo,ali estava ele,muito colado à máquina com dinheiro,em tentativas infrutíferas. Trazia companhia,uma familiar,mas não confiaria nela,não confiaria em ninguém.
Coitada da senhora. Muito incomodada,fazia os seus desabafos incontidos. Ele não quer ajuda,ele não quer ajuda. Ora a minha vida. E o velhote não largava a caixa,muito sobre ela,como a escondê-la,mas ela não se comovia. Talvez zangada com tanta insistência,acabou por engulir a caderneta. Lá tiveram que ir por socorros. Coitado do velhote,coitada da senhora.

DUQUESA

Então,minha senhora,que me diz a isto? Olhe,não sei bem o que lhe diga. Mas,agora,estou eu a pensar,sempre lhe vou dizer alguma coisa. Eu sou muito republicana,sempre o fui,que foi assim que o meu paizinho,que já lá está,me ensinou,mas não me importava nada de ser condessa,pelo menos,por uns tempos. Mas olhe que ser duquesa era melhor. Ah era?,então está bem,seja duquesa. Mas olhe que eu continuava a ser muito republicana,que foi assim,como já disse,que o meu paizinho me ensinou.

VER AS MONTRAS

Olá,mestre barbeiro,que belo carro o senhor arranjou,já não era sem tempo,os meus parabéns pelo bom gosto. Mas eu não tenho carro,nunca tive. Olhe,desculpe,foi engano,mas quem ia ao volante era mesmo a sua cara,ia jurar.
Não sou de luxos. Para quê carro?,só dão despesas,e a vida não está para isso. Para viajar,tenho as pernas,que ainda estão boas, e os transportes,que é o que não falta par aí. Para ir lá à terrinha,tenho o comboio,que me leva quase lá.
A terrinha,a sua santa terrinha,donde abalara era ele ainda moço. Ia lá todos os anos,pelas vindimas,ver se ainda lá estavam uns pedacitos que fora comprando a pouco e pouco,e que trazia de renda,pois não tinham ainda faltado quem as quisesse arrendar.
Do país,conhecia as ruas lá do bairro onde acabara por se instalar com a sua barbearia já lá iam uns bons anos,ruas que ele percorria aos fins de semana,a ver as montras. Depois,para se entreter,à noite,tinha lá a televisão,que chegava muito bem,além de jornais,claro,sobretudo,desportivos,para ter conversa lá com os fregueses

SANTA TERRINHA

Coitado dele,nunca se tinha esquecido da sua antiga profissão,a de barbeiro,talvez nos intervalos lá da labuta nas pequenas courelas,que só lhe dariam para metade do que precisava. E abalara,um dia,e tivera sorte,trepando na escala.
Pois ali estava ele,talvez,até,quantas vezes,como lá na santa terrinha,que aquilo era tudo gente quase da mesma família,onde não havia lugar para cerimónias,ao ar livre, mostrando que não se tinha esquecido da sua arte.
E fê-lo descontraidamente,como se não fosse ele já o responsável de uma grande porção de coisas,como se não mandasse. Talvez nem tivesse pensado nisso,que ele guardava ainda uns restos do jeito humilde de quando da partida para a grande aventura.

terça-feira, 15 de setembro de 2015

BARCO DESAPARECIDO - JOSÉ JÚLIO DE SOUSA PINTO

Sousa Pinto

CONCERTO DE AMADORES - COLUMBANO BORDALO PINHEIRO

Columbano

ÉGUAS DE MANADA - DORDIO GOMES

Dordio Gomes

CHUVA

Chuva caía que Deus a mandava,depois de já ter mandado muita. E ele abrigara-se,e bendizia essa água que tinha caído e estava caindo. Não era de uma terra onde a chuva rareasse,antes pelo contrário,mas,mesmo assim,exultava com ela. A chuva nunca era demais.

ELE ERA ASSIM

À vista de um pobrezinho,como que se lhe sangrava o coração. A vontade dele era ajudá-lo a valer,mas eram tantos. Quando falava com alguém de menor estatura,encolhia-se,de modo a ficarem os dois à mesma altura,pois não suportava o olhar de cima. Sempre que encontrava um conhecido,dava-lhe os parabéns pelo seu bom aspeto,ainda que ele estivesse com ar de ir desta para melhor. No contacto com gente de menos instrução,usava uma linguagem simples,de modo a descontraí-los. No caso de se tratar de sumidades,era como se o não fossem,embora isso,visivelmente,os desagradasse.Comprazia-se com as capacidades,morassem onde morassem,pois era delas que se poderia ter um melhor futuro para todos. Entristecia-se muito com a mentira,a hipocrisia,a arrogância,ficando com muita pena dos seus autores. Magoava-o as injustiças,
as prepotências,os alheamentos,as vinganças,os seguidismos,as violências,os fundamentalismos.
Ele era assim,não havia nada a fazer para o modificar. De resto,era assim que ele se sentia bem,ainda que dele se rissem.

PENAR SEM TERMO

Era para ter pena dele,mesmo muita pena. Sempre cabisbaixo,meditabundo,de passos arrastados,como que vergado,esmagado,ao peso de toneladas não se sabia de quê.
Apetecia abordá-lo para o aliviar. Desabafe lá homem,diga lá o que o faz andar assim,nesse penar sem termo?
Dinheiro,constava não lhe escassear. Telha,muita exibia,em cantos vários. Jornais,estava a par das últimas. Telenovelas,não falhava uma. Família,tinha-a bem arrimada. Saúde,não lhe devia faltar,que aquilo era um andar sem destino,hoje aqui,amanhã além.
Que mal seria,pois, o dele? Seriam saudades de um tempo de que gostava tanto e que tardava em regressar?

UM MONÓLOGO

Ele há cada um. Que cena aquela,nem de encomenda. Não interessa referir o palco em que ela teve lugar,o que interessa é dar conta da inexcedível atuação do artista que mais deu nas vistas,ou melhor,nos ouvidos.

Não passou aquilo,em boa verdade,de um monólogo,que os outros estavam só ali para entreter. A voz dele era vigorosa,penetrante,pelo que nem uma simples vírgula se perdeu.

Por onde ele andara. Fora num cruzeiro,mas não um qualquer. Comida da melhor,variadas diversões,piscinas,e mais,muito mais. Estivera em Pisa,em Nápoles,em Pompeia,... O Vezúvio,oh, o Vezúvio. A Catedral,o Batistério,as Ruínas...

Fora uma pena ter sido tudo a correr. Para outra vez,não será assim,que ele gostava de se demorar. Aqui,só quinze minutos. Ali,só vinte. Uma pena. Mas valera o dinheiro,oh,se valera.

Toda a plateia estava deliciada com a narração,a ponto de alguns estarem dispostos a agradecer aquela viagem,sem ter gasto um tostão. Mas não houve tempo para agradecimentos,já não se sabe bem porquê. Ficaria para outra ocasião.

E essa chegara,no dia seguinte,ainda as recordações estavam frescas,para um dos espetadores. Ele ia mesmo ali,e era só dizer que tinha lá estado a ouvi-lo e que lhe agradecia o ele ter descrito tão permonerizadamente a viagem. Até lhe parecera que fora lá também no cruzeiro.

Pois não gostou e fez uma cara muito feia. Para outra vez,vou falar mais baixo,e desandou.

ERA DE MAIS

Pobre professora. O que ela tinha de fazer. Tinha de ir levar o filho à creche,tinha de ir abrir a porta da escola,tinha de aturar os alunos,uns três ou quatro,tinha de aturar uma valente constipação que não havia meio de a largar.
Pobre professora que nunca chegava a horas por via do impossível trânsito. Pobre professora que tinha de acudir aos exigentes alunos,que tinham também lá as suas vidas exigentes. Pobre professora que mais parecia um farrapo molhado.
Foi aquilo demais para um dos alunos. A pena que ele tinha da professora,a pena que ele tinha dos colegas,todos lá com as suas vidas encalacradas,sem lhes poder valer. Era demais. Que a professora curasse depressa a constipação teimosa e que os alunos encontrassem soluções para as suas vidas.

segunda-feira, 14 de setembro de 2015

A CLOSE SHAVE - JOSÉ MALHOA

José Malhoa

CAMÕES E AS NINFAS - COLUMBANO BORDALO PINHEIRO

Columbano

COISA ESSENCIAL

Aquela esplêndida varanda,debruçada,há muitos séculos,sobre não menos esplêndido vale,cortado,mansamente,por celebrado rio de plácidas águas,fora impedida,sabe-se lá por quanto tempo,de exercer a sua admirável função.
Uma ordem assim o determinara. Parecia uma ordem de quem dali não era,de quem não considerava aquela vista como coisa essencial,para assim se privar dela um momento sequer,quanto mais uma eternidade ,que seria o tempo necessário para pôr tudo aquilo que se estava vendo,novamente,no seu devido lugar.
Nem ao menos uma vereda,por mais apertada que fosse,para,de uma fugida,que a bicha seria de dar muitas voltas ao quarteirão,dar uma simples espreitadela,que mesmo assim,valeria ouro. Aquela ordem,não podia restar dúvida,tinha cara de ser ordem de quem por ali não andara desde menino,que se alimentara dela,que não podia viver sem ela. Tapar um panorama daqueles não lembraria ao diabo.

UMA AUTÊNTICA FORTUNA

Encontrara-o por acaso e não estava à espera de qualquer lembrança. Lá na terra,quando o visitava,ele nunca se esquecia de lhe dar umas moeditas,que,juntas a outras,davam-lhe para uma época inteira. Também não se alargava muito,um pirolito,umas pevides,uns tremoços,um cinemazito,coisas assim.
Mas naquele dia,não. Naquele dia, foi um mãos-largas,uma autêntica fortuna,nem queria acreditar. A sua cara,quase sempre para o grave,como que resplandecia de contentamento. O que lhe teria acontecido? Não se soube naquela altura,mas não se perdeu pela demora.
Era perdido pela lotaria,pelo que os cauteleiros não lhe largavam a porta. E um dia,certamente, o da fortuna,saiu-lhe a sorte grande.Ia sendo a desgraça dele. Convencera-se,talvez,de que a sorte o tinha escolhido,pelo que não se cansava de a procurar. Comprava bilhetes inteiros,às dúzias.
E sucedeu o que é costumeiro em casos destes. Não me hás-de fugir. Saís-te-me uma vez ao caminho,mas não será a última,eu te garanto. Escapava-se-lhe como por encanto,trocando-lhe as voltas,mas ele não desistia.
Um rio de dinheiro. Acabou por pedi-lo emprestado a altos juros,hipotecando. Fez isso uma e mais vezes. Se não tivesse parado,ficaria sem nada. O que lhe valeu foi ter começado com muito,com larga margem,pois,para desbaratar.

UM RESPEITÁVEL BANDO DE GALINHAS

Logo o jipe havia de aparecer,quando elas se estavam a sentir tão bem ali naquela clareira. Era um respeitável bando de galinhas,barrando o caminho.
Viram o jipe chegar,viram-no aproximar-se e nada de se moverem. O jipe avançava lentamente,à espera de elas se decidirem,acabando por tocar nalgumas.
Só nessa altura é que reagiram. Levantaram-se,sem pressas,e como o jipe insistia,lá iniciaram o voo,mas tão lentamente,tão sem vontade,tão pesadamente,que quase se lhes tocava.
Finalmente,lá guinaram para a mata,que no outro lado estava o rio,que não seria das suas simpatias.

UMA RATOEIRA

Era de noite,uma noite em que tinham ido à caça. Talvez ali,naquela baixa,junto ao rio,a caça surgisse. E lá entraram eles nela,na baixa. Afinal,tinham ido ao engano,pois caça não apareceu. E quiseram sair da baixa.
Era o saías. Por onde quer que tentassem,apenas água,e da funda,lhes aparecia. Uma ratoeira,não havia dúvida,um castigo para quem se preparava para fazer "maldades". Foi preciso parar,sair,e,a pé,procurar a vereda por onde tinham entrado.
Coitados deles,ali expostos,à voracidade de multidões de mosquitos,estimulados por quatro focos de luz. Foi uma noite difícil de esquecer,que as marcas deixadas por demoradas aspirações quase tinham sido feitas para ficar.

FIGURAS TUTELARES

O rio Longa vê-se bem,mas o rio Nhia mal se vê. Foi por aqui,nas vizinhanças do encontro dos dois rios,que,há uns bons anos,se andou a fugir de pacaças. Crocodilos e gibóias também por lá faziam a sua vida,mas não se dignaram aparecer.
Muito buraco se fez por ali,a bisbilhotar a terra,e muitos saquinhos dela se encheram, para a analisar. Porque,antes,houvera inundação séria,áreas ensopadas não faltavam,o que obrigou ao uso de trado para ver de que natureza a terra era. Uma lástima aquelas mãos.
Dessa passagem,ficou a recordação das águas esverdeadas dos dois rios,onde se espelhavam palmeiras e bananeiras,ficou a lembrança dos crepúsculos fugidios,de tons violáceos,ficou o respeito pelos embondeiros,essas figuras tutelares.

http://www.fallingrain.com/world/AO/19/Fazenda_Longa.html

domingo, 13 de setembro de 2015

THE CORRESPONDENCE OF FRADIQUE MENDES - EÇA DE QUEIRÓS

Eça de Queirós

O LANTERNEIRO - ANTÓNIO RAMALHO,PORTUGUESE PAINTER

António Ramalho

MAIS UNS PATACOS

Eu bem sei o que ele quer . Vai ver,vai sondar,e se aquilo lhe convier manda recado a dizer que arrangem outro. Mas comigo não brinca. Pois não o deixo ir. Era o que faltava. Quem manda aqui sou eu. Dá-se-lhe um emprego,que podia ser para um mais necessitado,e,depois,é isto. Pelo menos,foi o que constou.
Recebeu uma informação favorável do diretor da casa onde ele trabalhava,depois outra e ainda mais outra,e as três foram rejeitadas. Já era teima,de ambos os lados. Uma quarta não o apanhou,pois tinha ido dar uma volta. E o seu substituto disse logo que sim. Que mal causava ao serviço o rapaz estar três meses ausente,ainda com a vantagem de não lhe pagarem,pois ia com licença sem vencimento?
Quando veio lá da volta e soube do que se tinha passado,foi um nunca mais acabar de ameaças. E o pobre do moço,lá longe,recebe,muito perto do regresso,uma carta. Olha que ele está decidido a deixar-te na rua. Se apareceres cá,um só dia que seja,depois da licença expirar,encontras a porta fechada. E ele teve de pôr pernas ao caminho,ainda febril,por infeção de um espinho mau,pois ninguém gosta de ficar na rua.
O pobre do moço,afinal,tinha ido apenas ganhar mais uns patacos,mas ele de patacos não queria saber.

PRESA POR CORDÉIS

Por aquele processo é que ele nunca tinha circulado. Lembrava a expressão muitas vezes ouvida,a de ir presa por cordéis. É que naquele dia o carro conseguira vencer centenas de quilómetros com uma peça fundamental assim mantida lá no seu lugar. Aquilo era de se ter tirado patente de tal invento e de custear a deslocação do génio a um salão de novidades. Mas não calhou,que as atividades não consentiam tréguas. Mais uma vez,porém,ficara bem provado que a necessidade a muito obriga e que é ela uma das mães do engenho.

Rematou este caso uma série de outros dignos de registo. Tudo,afinal,para evitar andar a pé,que é muito cansativo. Não tiveram conta as ocasiões em que o jipe se vira em situações aflitivas. Saiu delas pelas mais diversas vias,pois na sucessão delas alguma havia de resultar. Quando se não via gente por perto,ou animais,como muares ou bois,ou melhor ainda,um trator,as mãos tinham de sair dos bolsos e pegarem da enxada e do canivete,para cavarem e cortarem ramos ,de modo a dar às rodas apoios mais firmes.

Também,por vezes,o depósito ficava sem uma gota,lá onde bomba só muito longe. Mas não faltaram almas caridosas que se condoeram. E,em certa ocasião,houve mesmo que recorrer a uma modalidade nunca imaginada. Uma vala larga barrava o caminho. Mas ali à volta abundava capim alto. Foi só ceifá-lo e empilhá-lo. Quase um milagre,o jipe a caminhar sobre as águas. A água ressumava e o jipe balouçava,tal como barquinho em mar revolto.

ERA O TALHÃO

Era uma maneirinha courela,de chão de areia pliocénica,a cavaleiro da lezíria.Havia por lá de tudo. Havia uvas,figos,pêssegos,melões ,marmelos,melancias. Mas o que registado mais ficou foram folhas de figueira,pelo seu branco latex. Ia-se para lá de carroça. Era o talhão

NADA DE JEITO

Coitado dele,estaria perdido,era ele ainda um moço. Perdido era um modo de dizer,bem entendido,pois sabia-se lá o que lhe iria suceder,indo ele ainda no ínício da caminhada?
Pensara-se aquilo só pela linguagem seleta que ele usava,uma linguagem de sarjeta. Foram meses a suportá-lo. Estaria marcado para sempre,dali não se poderia esperar nada de jeito.
Pois parecia,e bem,que tal não iria acontecer. Olha,quem é? Então,por aqui? E de bicicleta,a uma hora destas? O calor era de rachar.
E ali andava ele,de povoado em povoado,tratando de almas. A alma dele, que parecera já não ter ponta por onde lhe pegar,estaria de cara lavada,como nunca teria estado. Quem o teria achado capaz,ele, um rapazola lá da grande cidade,crivadinho de vícios,andar por ali,por acolá,onde calhava,feito caixeiro viajante de boa nova,cuidando de almas ?
Vá lá uma pessoa fazer vaticíneos. As pessoas são capazes de tudo,de bom,e de mau,ou,melhor,do que se julga bom, ou mau. Vá-se lá dizer que dessa água não se beberá.

MEIO BILHETE

Eram oficiais do mesmo ofício e ambos reformados. Um ,era,pode dizer-se,rico,o outro,remediado. As pernas já lhes pesavam e só muito raramente se viam.
Certa tarde,o remediado tinha saído de um comboio,e o rico esperava por outro. Olha lá,que idade tens?,perguntou o rico. Sessenta e seis. Então já tens direito a meio bilhete. Faz como eu,que não perdoei um dia sequer.
Era uma segunda-feira. O rico ia ao cinema,pois neste dia havia desconto, uma coisa de nada.
É assim que se fazem as fortunas.

sábado, 12 de setembro de 2015

CLARA - JOSÉ MALHOA

José Malhoa

LETTER OF PÊRO VAZ DE DE CAMINHA - MEMORY OF THE WORLD

Pêro Vaz de Caminha

ALGUIDARINHO

Era dia de feira,e num dia assim,para mais em ocasião de férias,já se adivinhava o que se iria encontrar,o espectáculo do costume,naquele remoto tempo. Nem o celebrado rio escapou. Ele eram sacos,garrafões,garrafas e garrafinhas de plástico a boiarem,ele eram papéis de todos os tamanhos,bem como cascas dos frutos mais diversos a fazer-lhes companhia. Um horror.
Num dia de feira,o estômago não descansa,pelo que foi necessário acudir-lhe. Pois é,só que eram bichas à porta por todo o lado,mas lá apareceu uma porta que se condoeu,mesmo ali à vista do celebrado rio,só que água corrente não havia. E foi bonito ver-se montanhas de pratos,copos e talheres a serem lavados à pressa,num alguidarinho,que a bicha não havia meio de terminar.
Enfim,coisas daquele remoto tempo,que tantas saudades deixou,tempo que não volta mais,pois o tempo não volta para trás.  

"SE EU ME LEVO COMIGO"

"Erros meus,má fortuna,amor ardente". Tudo se conjugou para um longo peregrinar,por perto,lá por longe,muito longe. Umas vezes,fugindo,outras, escondendo-se. Mas "De que me serve fugir da morte,dor e perigo,se eu me levo comigo?". Certo dia,teria vindo refugiar-se em lugar humilde. Lá está,em modesto largo,uma placa a assinalá-lo. Quem iria dar com ele ali? Chegar-lhe-ia lá,a toda a hora, o cheiro fresco do seu Tejo,do rio das suas Tágides. Talvez um barquinho lhe valesse,se,acaso,fosse avisado a tempo de que perigo rondava. Lá se escaparia,rio abaixo,ou rio acima,guiado por uma ninfa,sua amiga. "Aquela cativa,que me tem cativo,porque nela vivo já não quer que viva".

UM PRÉMIO

Não se sabia quem ele era,só se sabia que viera de longe,muito longe. E viera como que trazido por um chamamento imperioso,a que não pudera resistir.
Era um homem muito rico e trouxera consigo uma grande parte da sua grande fortuna,em ouro,em prata,em pedras preciosas,cintilantes,coisas assim. Seria tudo isso para depositar,lá,no fim da longa jornada. Pelo menos,era o que constava,lá,de onde viera.
Mas como é que ele iria imaginar,à partida,que cruzaria com tanta desgraça,se lá, de onde viera,nem um pobrezinho se via? Era capaz de ter enchido mais os alforjes,pois foi muito grande a tristeza que o inundou quando deu com eles vazios.
E a tristeza que o tomara foi tamanha,que,para se livrar dela,adormeceu profundamente. O sonho lindo que ele teve. Nunca sonhara assim,apetecia,até,não acordar mais,depois de ter visto tanta desgraça.
Parecia ser o sonho lindo um prémio pelo que fizera. Depois,lá nesse lindo sonho,ouvia-se,repetidamente,o que ele nunca mais esquecera. Para a outra vez,tens de trazer mais,tens de trazer mais...

UMA PALAVRINHA

Ele não esperava,coitado,aquela abordagem de um estranho. Que quererá este fora de moda,de sobretudo e o mais a condizer? Bem,vamos lá ter paciência e saber o que ele quer,mas para mim vem de carrinho,que eu tenho mais que fazer.
Desculpe,mas é só para uma palavrinha. É que o tenho observado,uma vez por outra,quando calha e a situação desperta,nas suas intermináveis,teimosas,longas andanças. O senhor,tudo somado,já teria dado a volta ao mundo. E sabe,invejo-lhe a resistência,tanto mais que se não pode dizer que seja um jovem,invejo-lhe,sobretudo,essas cores de saúde para dar e vender. O senhor é capaz de aturar até aos duzentos,ou mais.
Ele sorriu,ele ouviu,pacientemente,com a atenção possível,porque por ali havia muito movimento,e além disso,não estava nada acostumado àquela linguagem,de salamaleques,de palavras caras.
E por ali se ficou. À despedida,ele pousou a sua mão direita,delicadamente,no braço do outro,em quem nunca reparara,pois tinha mais para onde olhar,agradeceu,e lá foi para mais outra passeata de se lhe tirar o chapéu.

FIGURA DESALENTADA

Era dia de eleições,em tempos lá muito de trás. Estava tudo a correr como era costume. De repente,entra na sala um senhor, já com muitos anos , em grande alarido. Que coisa teria ele feito para naquele ano não poder cumprir o seu dever? Sim,que coisa teria ele feito?Deixara de merecer a confiança das autoridades? Considerava isso uma grande ofensa,uma grande injustiça. E lá disse porquê,uma e mais vezes,não fossem ficar devidamente esclarecidos.
Seria por estar agora velho? Já não prestava? E outras interrogações lamuriosas do mesmo género. Chegou a verem-se lágrimas nos seus olhos cansados. Uma figura desalentada. Metia dó.
Tiveram pena dele,deixando-o votar. A satisfação que se passou a ver em todo ele. E não se contendo,desatou a abraçar este e aquele,agradecendo continuamente ,em jeito de reconciliação universal.
Ainda se pensou que não iria resistir a tanta emoção. Puro engano. Deixou a cena já recomposto,muito alegre e sempre agradecendo.

BURNING REMAINING FOSSIL FUEL COULD CAUSE 60-METER SEA LEVEL RISE

Sea level rise

sexta-feira, 11 de setembro de 2015

THE REINVIGORATION OF THE SOUTHERN OCEAN CARBON SINK

Carbon sink

AN INCREASING CARBON SINK?

Carbon sink

WINNING COALITIONS FOR CLIMATE POLICY

Climate policy

COMO EM PARADA

Naquelas manhãs de domingo,os fantasmas não ficariam nas suas caminhas. Tudo convidava,de facto,para eles andarem por ali,por todo o sítio,pelas ruas,pelos parques,pelos ares.A neblina cerrada. A algidez que tolhia as gentes. O silêncio quase tumular das ruas,a lembrar ter sido a terra abandonada por catástrofe eminente. O fumegar permanente das chaminés,em linhas contínuas,como em parada. O badalar dos sinos,de quando em quando,a chamar,a apelar.Apsar dessa presença,era agradável fazer como eles,acompanhá-los até. Porque não? Se eles,coitados,não faziam mal a ninguém. Todos fossem como eles.De vez em quando,lá surgia alguém da névoa,para bem depressa se enfiar nela,qual fantasma que se não via,apenas pressentia. As árvores dos parques pingavam. Ao longe,pareciam também fantasmas de muitos braços. Mas eles não estariam lá,que era tempo de andarem por outras paragens,que os fantasmas também gostam de variar.

VALOR EXAGERADO

Ainda bem que passou por aqui,que eu precisava de ter uma conversa com gente de fora,para estar mais à vontade. É aqui por causa desta minha courela. Já viu a qualidade dela,certamente. De resto,basta olhar para as oliveiras,que parecem uns fantasmas,de raquiíticas que são.
Bem,as oliveiras não tinham assim tão mau aspeto,mas ele precisava de desvalorizar a mercadoria. O terreno era de granito,mas era fundo. Havendo água,podia tirar dele milho que valesse. Pois era,mas onde ir arranjar o estrume necessário,se ele está pela hora da morte?
Isto tudo,coitado, para se queixar da contribuição que andava pagando,que teria sido fixada num valor exagerado,como lhe parecia. O que é que se lhe havia de dizer? O senhor parece ter razão,mas o meu serviço é outro. Espero que quando da nova avaliação fique mais satisfeito. Passe por cá muito bem.

AS VACAS

A erva mostrava-se queimada da geada. E o rendeiro,todo endomingado,como para uma festa,aproximara-se,contristado. Está a ver? Não me saberá dizer como é que eu vou alimentar as vacas?
Ele sabia que não teria resposta capaz,fora só para desabafar. Vai-me dizer que venda as vacas,antes que seja tarde,como me já têm dito? Não,não lhe vou dizer isso,mas também não sei o que lhe diga.
Olhe,pode ser que o tempo melhor,e que você venha a ter aqui erva para dar e vender,que a terra parece ter força para isso. Tenha esperança,e paciência,que as vacas não hão-de morrer. Deus o oiça.

UM GRANDE JEITO

Tinha vindo lá da sua terra distante. Estava,naquela altura,ali,pois tivera necessidade de aprender umas técnicas que lhe seriam úteis para o seu trabalho. Era um moço simpático,de aspeto humilde.
Aquilo lá na sua terra,às vezes,não andava nada bem. As pessoas davam em queixar-se ainda mais do que era costume. Chegavam ao ponto de de se revoltarem. Na terra ali mesmo ao lado,acontecia mais ou menos a mesma coisa.
Então,o que é que de vez em quando sucedia? Inventava-se uma guerra. Apelava-se ao patriotismo e as pessoas de ambos os lados,com receio de que viesse lá o inimigo entrar-lhes pela casa dentro,esqueciam desgraças e preparavam-se para enfrentá-lo.
Aquilo acabava por não passar de umas escaramuças na frontreira,mas tinha o tal condão de levar a esquecer desgraças,o que dava um grande jeito.

quinta-feira, 10 de setembro de 2015

MAPPING TREE DENSITY AT A GLOBAL SCALE

Tree density

SUSTAINABLE PRODUCTION : PHYSICISTS REPORT ON EU GREEN ELECTRICITY

Green electricity

OCEAN ACIDIFICATION : LABORATORY SEAWATER STUDIES ARE JUSTIFIED

Ocean acidification

CLIMATE CHANGE : TRACK URBAN EMISSIONS IN A HUMAN SCALE

Urban emissions

TRILLIONS OF TREES

Trees

NEM DADOS

Tinha muito para contar aquele caminho,a serpentear entre oliveiras e figueiras. Quase à sua beira,estendia-se uma muralha bem cuidada,que defendera a vila de algumas investidas,muitos anos atrás. Acompanhando-o,derramava-se uma paisagem a perder de vista,verde e amarela,pontoada de meia dúzia de lugarejos,de sinais de uma linha do caminho-de-ferro,de regolfos de minúsculas barragens.
Naquela ocasião,o ar rescendia a figos já maduros. A maior parte não iria ser colhida,que a mão de obra já não é o que era dantes,o mesmo sucedendo à azeitona. Nem dados. Lucravam os pássaros e as formigas,que também têm direito a boa mesa, e alguns nómadas que por ali circulassem.
Mas não foi para isto que tais plantações se fizeram. E uma das saídas está bem à vista. É pôr ali casas. Ressarcem-se,assim,de vários anos sem rendimento. Pena é que muitas oliveiras e muitas figueiras tenham os dias contados. Serão poupadas algumas,a lembrar tempos que,muito provavelmente, não voltarão mais.

NADA BEM

Isto está cada vez pior. Dantes é que era bom. Teriam vivido lá nesse tempo e recordar-se-iam dele com muitas saudades. Tomara que ele voltasse. Ele lembrava-se bem de um antes e a esse antes não queria voltar. E esse antes era assim.
Fora um tempo em que uma sardinha tinha de dar para três ou mais,os que lá houvesse. Em que as botas eram cardadas e reforçadas com biqueiras metálicas,para durarem uma eternidade. Em que se aplicavam remendos. Em que se viam fundilhos. Em que se viravam casacos e também casacas. Em que de velho se fazia novo. Em que havia empregadas domésticas a esmo,para aliviar famílias numerosas,a montante e a jusante. Em que se formavam bichas à porta de casas ricas,em dias certos,e aos portões dos quartéis,todos os dias. Em que se abriam bolsas de empregos em largos de aldeias e vilas. Em que se morria,vulgarmente,de tuberculose,de tifo,de sífilis. Em que se trabalhava de sol a sol,por dez réis. Em que vaganbundeavam ranchos para a colheita das uvas,para a apanha da azeitona,para a ceifa dos cereais,que se amontavam,como gado,em casas de malta. Em que,muitas vezes,se acabava a pedir esmola. Em que se rompiam solas ou as plantas dos pés a calcorrear caminhos crivados de buracos. Em que casas de banho e papel higiénico eram luxos. Em que corriam esgotos a céu aberto.Em que o burro e a carroça eram os transportes dominantes,sem falar nas pernas. Em que as costureirinhas se iam desta vida muito cedo. Em...
O que muitos diriam,nesses atrasados tempos? Isto assim não vai nada bem. Dantes é que era bom.

quarta-feira, 9 de setembro de 2015

SOLAR-POWERED PUMPS REDUCE IRRIGATION COSTS IN BANGLADESH

Bangladesh

IN CLASH OF GREENS,A CASE FOR LARGE-SCALE U.S. SOLAR PROJECTS

Solar projects

APRENDIZAGEM

Foram muitas as manhãs que ele ali gastou,sentado no largo passeio,sobre as pedras,frente ao mercado. Teria pouco mais de um ano. Ainda há bem pouco tempo andara ao colo do pai,que a mãe,ali perto,tinha mais que fazer.
Não chorava. Entretinha-se com pequenos nadas e a sua cabecita não parava,sempre à procura da sua estrela norte,que não havia meio de se fixar. Era o pai ou a mãe que andavam lá na sua vida. Sentir-se-ia em casa,uma casa muito grande,cheia de gente e de cães,continuamente a mexerem-se. Seria disso que ele gostava.
Deve ter conhecido meio mundo,meio mundo que parecia gostar de vê-lo ali. Faria isso parte da aprendizagem que o habilitaria para o que estava lá à sua espera.

ENIGMÁTICO

Houve uns tempos em que aquilo eram reuniões quase todos os dias,com a sala a rebentar pelas costuras,e gente sentada no chão. Discutia-se tudo e mais alguma coisa,pedia-se este mundo e o outro,sem pestanejar,como se não faltassem varinhas de condão.
Em toda aquela gente,via-se de tudo,de todos os cantos,de todos os exageros,de todas as pontas,dos extremos,e também do meio,os eternos indefinidos,os da conciliação.
E era engraçado ver a reação de um dos extremos,a cara que ele punha, quando lhe dava para dizer alguma coisa um dos tais do meio,que lhe fazia um nervoso muito miudinho. A cara via-se bem,que ele punha-se sempre nos primeiros lugares,pelo que tinha de se voltar para trás,para encarar o enigmático,que se sentava sempre lá nos fundos,como mandam algumas regras.
E era engraçado ouvir um comentário seu. Irra,que não há meio de se saber para onde pende ele.

UM ESCÂNDALO

Quando ele soube o que ganhavam os homens encarregados da recolha do lixo lá na terra para onde viera trabalhar por uns tempos, não queria acreditar. Mas assim estão a ganhar mais do que eu,que me tenho fartado de estudar,e fazer coisas muito úteis. É um exagero,não resta dúvida. Um escândalo.
E uma noite,uma noite muito fria,em que caía muita neve,cobrindo as ruas,deu conta de vozes lá fora. Eram os homens do lixo. Coitados deles,ali ao frio,à neve,ao vento,que ele também ouvia,e ele ali no quentinho da sua cama.
E caiu em si,e teve muita pena deles,e deixou de achar exagerado o dinheiro que eles recebiam,pois não se sentia capaz de os ir substituir. Consolá-lo-ía o ele saber que também não estava a ganhar nada mal.

DISCRETOS

Ali iam eles,um tanto enfiados,rua abaixo,ela,com sinais evidentes de ter conhecido homem, certamente,o que caminhava a seu lado. Traziam séquito. Talvez a família mais chegada,talvez alguns amigos. De tão silenciosos,parecia aquilo um funeral. O galo não cantara ainda. Teriam querido ser discretos,passarem despercebidos. O conservador seria boa pessoa,pelo que não se importaria,volta não volta,de se levantar de madrugada. Como mudam os tempos.

PASSAR DESPERCEBIDO

Caminhava rente ao edifício ,de olhos no chão,como que a esconder-se. Foi triste vê-lo,ali vergado ao peso dos muitos anos. Melhor seria não se ter salientado tanto,que o contraste não se mostraria tão doloroso,para ele e para outros,dos que tinha encantado.
Não era o seu caso,mas é bem verdade que o trambolhão é maior quanto mais alto se vai. Ele não caiu,de facto,muito longe disso,mas aos seus olhos é capaz de assim se ter passado. O que eu fiz,onde eu fui,e agora,para aqui estou,uma pobre sombra de mim,nada mais.
Parece ter-se arrependido de querer passar despercebido,pois ainda o viram virar a cabeça,com intenção,talvez,de corresponder ao cumprimento que pressentira e de que escapara.
O respeito e a dmiração de alguns podem servir de lenitivo perante a triste realidade do envelhecimento sem recuos,pelo que não se devem desperdiçar as ocasiões para isso,tanto mais que outros estão dispostos a esquecer,a ignorar.

terça-feira, 8 de setembro de 2015

MUSEU DE SÃO ROQUE - LISBOA

Musei de São Roque

HISTORIC CENTRE OF GUIMARÃES - PORTUGAL

World Heritage

UM RICO ALVO

Não era ela a pianista que figura num quadro que muitos têm podido ver ao longo dos anos,por estar exposto em lugar público. Mas era notável a sua semelhança.
Lá estava o busto estrangulado,o loiro do cabelo,a saia a tapar os pés,o tronco forte.Faltava o piano,mas não os adornos. Os dedos quase se não viam,os pulsos iam pela mesma,o pescoço não destoava. Predominava o grosso. Pareciam correntes.
Um rico alvo para os amigos do alheio. Ela não dava sinais de preocupação. Seriam falsas as jóias? Ou talvez confiasse na força dos seus músculos. O meliante,coitado,devia sair-se mal do atrevimento,ficando,muito provavelmente,com um braço partido e com a cara amolgada.
Quando se levantou,mais se acentuou a solidez do reduto. Os atavios podiam ser de lei,mas à vista daquele forte,ninguém se atreveria a tomá-lo. Quando muito,passaria de largo,cheio de pena de não a aliviar.
E a pianista? Porque se estrangulara ela tanto? Porque escondera ela os pés e escancarara o busto? Ah estas modas poderosas,dominadoras,quase absolutas. E quem a elas não se submeta,tem de as ouvir.

UM MAÇO DE NOTAS

Coitado dele,ali se sentava,frente às tabernas,apinhadas de gente,por dentro e por fora. O ar era humilde. Muito magrinho,muito amarelinho,a barba de dias,de bengala ao lado,ali passava horas.
Uma manhã,alguém deu com um maço de notas,caído no chão,muito perto dele. Contente que ele vai ficar. Tome lá,devem ser suas. Ele olhava,admirado,um tanto retraído,mas por muito pouco tempo tempo,que uma voz se ouviu,uma forte voz,desembaraçada. Esse dinheiro é meu. Não tinha cara disso. Mas o que se havia de fazer?

PATROA

Entrou logo a matar,quando a porta se abriu. Antes de mais,quero ver cumpridos os meus sagrados direitos. E indicou-os,sem faltar um sequer,para que se soubesse,caso os ignorassem. Quanto aos deveres,ficaria para depois,que não era oportuno o momento. Valeu-lhe apanhá-los em fraqueza,se não veria a porta fechar-se.
Ao longo da caminhada,manteve-se sempre fiel à amostra. A cada passo,dava indicações seguras de que nela habitava um incontido gosto de ter e um outro de imitar. Hei-de possuir também um,deixava ela escapar ,diante de um tareco que não figurava lá no seu mostruário,ou então avisava que também tinha um,só que muito melhor
Podia dizer-se que estava com saudades de um futuro em que ela fosse patroa,como quase o fora em tempo a isso propício. Aquilo tinha sido mesmo um venha a nós. Naquela altura ,é que era aproveitar,que uma coisa assim,nem de encomenda. Tanto colheram,que arruinaram o negócio.
A pensar nisso constantemente,deixava,ás vezes,escapar um suspiro. Estivera por pouco,mas ainda não perdera a esperança. Eram os sagrados direitos a acenarem-lhe. Eles ainda,um dia,lhe haviam de trazer as sonhadas indemnizações,sem esquecer,claro,os juros. Tudo somado,daria para pôr alguém ao seu serviço.
Então se revelaria em toda a sua natureza. Esse alguém não teria o direito de ter direitos,pois para ela só havia duas espécies de gente,senhores e escravos. E ela não queria morrer sem ter sido uma senhora.

RELVADO NOVO

O velho sabia muito bem que o relvado lá do campo de jogos da escola secundária era artificial. E era assim,não por inquirir,mas porque era evidente,até uma criança o dizia.
Talvez por isso,por ser evidente,o velho,uma manhã,por sinal,uma rica manhã de sol,de que se estava cheio de saudades,pretendeu ser esclarecido. E estava ali perto quem o podia esclarecer,
precisamente três moços,quase homens,lá daquela escola.
Este relvado não é natural,pois não? Não,é artificial,disse um deles. Mas aquele não,e aquele é,e aquele artificial,vieram com uma carga de dó tão grande,que metia mesmo dó. Coitado do velhinho,a querer saber uma coisa destas.
É claro que isto não podia ficar assim,que era capaz de se dar por ali um triste dilúvio de tristeza. Pois muito obrigadinho pelo esclarecimento. Mais ainda, faço ardentes votos,ardentes e sinceros votos,podem crer,para que um de vocês,ou mesmo os três,o que seria muito melhor,viessem a inventar um relvado novo,que pusesse este a um canto.
Os moços,como que se transfiguraram. Nem pareciam os mesmos de há bocadinho. Puseram umas caras muito sérias,tão sérias,que pareceu ao velho terem eles,os três,em colaboração esforçada,inventado mesmo o melhor relvado artificial do mundo.

QUASE VOA

Nem parecia o mesmo naquela manhã. Ia só,sem o seu fiel companheiro,um carrinho,algo desconjuntado,que ele vai levando,alegremente,pelas ruas,quase a correr. Desta vez,ia triste,de cabeça baixa,assim como um vencido da vida. Também não trazia o seu boné de pala,o que se compreendia, pois não estava trabalhando.
Talvez a sua carripana estivesse a reparar,que bem precisada estava. De qualquer maneira,poucos dias volvidos ,lá voltou ele aos seus muitos afazeres,que são as visitas meticulosas aos contentores lá do seu bairro,à sua boa disposição,ao seu boné de serviço.
Os caixotes já estariam sentindo a sua falta,pois sempre lhes faz alguma companhia,e,o mais importante,lhes alivia a carga. O carrinho chega a andar derreado,visto ele ser muito aproveitadinho. É que a vida não está para brincadeiras,e lá em casa há mais gente,que,por vezes,o acompanha,mas com dificuldade,que ele quase voa,por mor da concorrência. Tem de dar á perna,não vá ficar sem os melhores bocados.