quarta-feira, 30 de dezembro de 2015

PASSE DE MÁGICA´

Eram caras que irradiavam importância. Pareciam caminhar como se as outras não existissem,ou estivessem ali para as servirem. Donde viria tanta exaltação? Saberiam das suas limitações,da sua pequenez irremediável,da sua fragilidade? Talvez isso acontecesse e resultasse daí a sua peculiar maneira de ser. Achariam os outros ainda mais insignificantes. Seria como uma espécie de vingança trágica.
Coitados,seriam de lastimar. Quanto tempo duraria o seu reinado? Nem eles o saberiam. Andariam, por isso, irritados,zangados,mal dispostos. Fora deles o dia de ontem,era certo,esse ninguém lhos tirava,mas,infelizmente,já não contava,já la ia,para nunca mais. Tinham-lhe dito adeus,mesmo que em Deus não acreditassem,como num hábito,entristecidos,pois queriam que ele não se fosse, para sempre,que ele ainda ficasse mais um poucochinho. Mas tinham a certeza de que lhes iria escapar,irremediavelmente,como acontecera já a tantos outros dias,e isso punha-os em fúria.
E então viviam desesperadamente o presente,esse nada,essa ponte minúscula que os ligava ao futuro. E queriam ser donos do futuro,e o futuro brincava com eles,fazendo-lhes partidas,de tal maneira,que chegavam a desaparecer, como por encanto. Não davam conta do passe de mágica,pois tinham deixado de ser. Alguns,por estarem distraídos,ainda os procuravam,mas em vão. Ainda há poucas horas os tinham visto,até com eles falado,até planeando. Andavam intrigados uns tempos,mas,depois,era o costume,acabavam por não mais neles pensar.

SEMPRE A PRIMEIRA VEZ

Não seria caso único,que o mundo é vasto e muita é a gente que nele circula. Mas aquela era uma cena que não se podia perder,que merecia registo,ainda que simples.
Os olhos que ele,ao entrar, deitara ao que iria em breve comer,o seu futuro almocinho. Os olhos que ele fizera quando,efetivamente, encomendou,apontando-o. Os olhos que ele pusera quando já lhe não podia fugir,por estar bem seguro na sua mão Os olhos que ele trocara com quem olhara para ele,ao sair.
Era a cena para ficar registada,ainda que ela se repetisse,como,de facto,acontecia,como se fosse a primeira vez. De resto,era,de algum modo,sempre a primeira vez.

TESTAMENTO

O diabo do homem,para o que lhe havia de dar,ali sentado,de manhã à noite. Não devia estar bom da cabeça,coitado,era o que constava. Qualquer dia,ficava-se para ali,para ali e para sempre,seria o mais certo. De qualquer maneira,lá pensaria ele,ou outro,que não seria só ele a pensar,se não fosse ali,seria noutro sítio,o que,bem vistas as coisas,ia tudo dar ao mesmo,o que,aliás,era isso bem sabido,mas todos procuravam esquecer,coitados deles,que já traziam,quando nasciam, o destino bem marcado,que era o mesmo para todos,sem tirar,nem pôr,nem que fosse o mais pintado,ou pintada.
E o que é que ele fazia ali sentado? Pois escrevia o seu testamento. Quem não acreditasse é porque não teria também o seu testamento a escrever,o que seria muito triste,por ter cá estado sem ter nada para deixar. E fora do nada havia tanta coisa para deixar,que só quem não tivesse vivido é que não teria nada para deixar. Ora ter vivido e nada deixar deveria ser uma coisa muio triste,de que todos quereriam fugir.

MUITO GRATO

Ele não podia imaginar quanto o outro lhe estava muito grato,pois não saberia o que era essa coisa de estar agradecido. Depois,ele tinha tido com o outro um procedimento que alguns considerariam reprovável,merecedor de tudo,menos de gratidão. É que tivera a coragem ,não uma vez,mas duas ou três,de expulsar o outro,à má cara,lá dos seus domínios,que achava serem muito dele,pelo que tinha feito para os ter,só por o outro se ter atrevido a pisá-los,ainda que apenas lá num cantinho,sem o seu augusto consentimento.
E o outro,apsar dessa ruindade sem nome,porque é que lhe estaria muito agradecido,sem o declarar,evidentemente? Ora porque é que haveria de ser? Não era ele o dono,para todos os efeitos,de uns tão belos domínios,o que o tornava muito importante? É que sendo assim,teria receio de que a sua importância fosse ensombrada,dalgum modo,ainda que minimamente, por o outro os ter pisado,ao de leve,lá num cantinho,aquelas duas ou três vezes?
Era,assim,o outro tão importante? Só por pensar numa coisa dessas,e não admitir,claro,o outro lhe estava, para todo o sempre ,muito grato.

SÓ DE ENCOMENDA

Há males que vem por bem. Nem sempre sucederá,mas o que se tinha passado com ele poderia ser assim considerado. Uma calamidade abatera-se,inesperadamente,ou talvez não, sobre o local em que ainda há pouco dera os primeiros passos da sua vida profissional. Seria muito difícil,perigoso mesmo,ali permanecer. E abalou.
A terra que o recebeu não lhe foi madrasta,antes muito ao contrário. Um lugar de feitor de grande e rica quinta estava à sua espera. Fora coisa que,porventura,nunca lhe tivesse aparecido em sonhos.
Um verdadeiro palácio abrigava-o,a ele e à família. Carros e cavalos livravam-no de canseiras. Apreciável parte do pão ficava-lhe quase de graça. Não era de exigir mais,podendo dizer-se que lhe saíra a taluda.
Se lá tivesse permanecido,mesmo sem calamidades,quando é que alcançaria uma posição daquelas,de muito invejar? Qualidades não lhe faltavam,é certo,mas outros as teriam e não se encontravam como ele. Era caso para dar graças,o que lhe seria fácil,na quietude dos seus principescos aposentos ,ou numa capela,que ali também havia. Uma tal coisa só de encomenda.

TUDO A EITO

O moço achava-se irresistível. Depois,estava na fase de o ir tudo a eito,não se importando com o estado civil da eleita de ocasião.
Na sequência dos seus apetites,coube a vez a uma jovem casada. Qualquer dia, está-me no papo,era o seu estribilho. Lá pensara que ela tinha para com ele especiais atenções. Nem reparara,na sua cegueira,ou lá o que era,que a jovem mostrava a mesma disposição para com todos ali da casa. Era a sua maneira de estar.
Aquilo não podia continuar assim,sob pena de haver sarilho,que o marido não era para brincadeiras. E assim,o casal mudou de poiso,para bem longe do conquistador sem emenda.

quinta-feira, 24 de dezembro de 2015

A TALUDA

Há males que vem por bem. Nem sempre sucederá,mas o que se tinha passado com ele poderia ser assim considerado. Uma calamidade abatera-se,inesperadamente,ou talvez não, sobre o local em que ainda há pouco dera os primeiros passos da sua vida profissional. Seria muito difícil,perigoso mesmo,ali permanecer. E abalou.
A terra que o recebeu não lhe foi madrasta,antes muito ao contrário. Um lugar de feitor de grande e rica quinta estava à sua espera. Fora coisa que,porventura,nunca lhe tivesse aparecido em sonhos.
Um verdadeiro palácio abrigava-o,a ele e à família. Carros e cavalos livravam-no de canseiras. Apreciável parte do pão ficava-lhe quase de graça. Não era de exigir mais,podendo dizer-se que lhe saíra a taluda.
Se lá tivesse permanecido,mesmo sem calamidades,quando é que alcançaria uma posição daquelas,de muito invejar? Qualidades não lhe faltavam,é certo,mas outros as teriam e não se encontravam como ele. Era caso para dar graças,o que lhe seria fácil,na quietude dos seus principescos aposentos ,ou numa capela,que ali também havia. Uma tal coisa só de encomenda.

PODEM BRINCAR TODOS

Não interessa indicar o local. O que interessa é dizer que ele,ao entrar,deu dois ou três valentes pulos,dizendo,em alta voz,que,agora,com as novas obras,a mercadoria principal deixara de se ver. Teria ele,quando muito,uns quarenta anos. Depois,lá acalmou,mas repetindo as suas críticas.
Alguém,junto de quem se pusera,em tom calmo e baixo,fez coro com ele. O senhor tem razão,já
tinha reparado nisso. Ele,aparentemente,caiu em si,mas defendeu-se,de maneira calma também,dizendo que a livre expressão que,na altura vigorava, permitia que cada um dissesse de sua justiça. Com certeza,mas não indispondo o vizinho do lado. Certamente,concordou.
O outro ainda acrescentou que ele pudera manifestar-se porque vivia em democracia. E,lembrando-se da maneira como ele,de início,o fizera,macaqueando,acrescentou que, em ditadura,só um é que brinca,enquanto em democracia podem brincar todos. Ele esboçou um sorriso de compreensão.

NUNCA SE SABE

Acontecera,vá-se lá saber porquê. Tinham feito caminhos separados e de muito diferente qualidade aquelas duas mães,mas a vida aproximara-as. Próximas eram também as suas idades,bem como as dos filhos únicos,que não as largavam,como se ainda estivessem recolhidos. Elas,já de avançada idade,e eles também já adiantados.
Quando se expunham,notavam-se logo algumas parecenças. Em cada par, era a mãe que comandava,como que rebocando. Num deles,era isso mais evidente,por via de deficiência motora,e não só.
Até quando aqueles dois tristes quadros deixariam de se ver? Não se sabia,mas muito provável era que o termo ocorresse com o claudicar dos rebocadores. E qual seria o primeiro a fraquejar? A qualidade dos trajetos poderia ter aqui um efeito decisivo. A aparência de um deles apontava para uma maior duração. Mas nunca se sabe. Os maus tratos,às vezes,enrijam,e os bons tratos,por vezes,amolecem.
Quem iria vencer aquela corrida? E quem estaria lá para dar disso testemunho? Seria que os dois pares iriam teimar,saindo vencedores de tantos que naquela altura os estavam vendo?

A FOME

Da mera observação das coisas do presente e do passado,e também de um outro antes não observado,dos acontecimentos,das crises,dos desencontros,dos encontrões mais ou menos calamitosos,de tudo,enfim,que sucedeu e vai sucedendo,fica-se com a impressão,com a certeza,talvez,de que este mundo é um muito desiquilibrado.
É claro que ,num mundo assim,não é de admirar que o que vigore,que a regra, é o salve-se quem puder. Num mundo assim,as disposições mais típicas,porque as mais vencedoras, são o egoísmo,o estar-se nas tintas para o outro,mesmo muito chegado,o cada um governar-se. É o panorama dos dias que correm,foi o panorama dos dias que já lá vão.
Daí,o pé de meia,o poupar,muitas vezes no essencial,o acumular quanto se possa,pois não se sabe que cara apresentará o amanhã. Não se deve estranhar, pois ,o multiplicar de milionários,de bilonários,e assim por diante,que só os trouxas é que se deixam ficar para trás. Ficam estes muito tristes,mas não se têm de queixar,pois podiam ter feito,ou pelo menos tentado,gestos para lá chegar.
Daí,também,as fortalezas do presente e do passado,simbolizado este pelos castelos. Quanto mais muralhados,quanto mais apetrechados disto e daquilo,mais resistiriam ao inimigo que viesse dali próximo,ou lá de longe,que os inimigos nunca se sabia quais e quantos eram. O que se sabia é que inimigos tê-los-iam à porta,em qualquer altura.
No caso da riqueza,inimigos não lhe falta,também,sendo o mais sério a fome

quarta-feira, 23 de dezembro de 2015

RADICAIS LIVRES E ANTIOXIDANTES

Radical livre é, como se sabe , um átomo ou grupo de átomos com um eletrão desemparelhado na camada externa,ou camada da valência. São capazes,assim,de reagir
prejudicialmente. Os antioxidantes,ao combinarem-se com radicais livres,
cedendo-lhes eletrões,na sua qualidade de redutores,previnem,ou atenuam,
reações indesejáveis,como se oferecendo em alternativa,"imolando-se".
São vários os antioxidantes,enzimáticos,ou não. Dos não enzimáticos,contam-se,como se sabe,as vitaminas C e E,o beta-caroteno,percursor da vitamina A,o licopeno e os flavonóides(polifenóis),como as antocianinas e as flavonas.

FRUTA DO TEMPO

Andara por todos os mares,cruzando-os vezes sem conta,mas pescara muito pouco. Por isso,ali estava ele,de pele curtida por muito sal,sentado a uma secretária,à entrada de templo rico,a ver se algum peixinho lhe caía na rede.
Era ele o guardião. Tinha muito para guardar,mas só dispunha de dois olhos,e já não via lá muito bem. Ainda há dias voara uma imagem,ali mesmo nas suas barbas.Mas aquilo era gente que parecia ter feito pacto com o demónio. Sabiam bem do seu ofício.
Ele também sabia quem eram,uma família ali das redondezas,uns profissionais. Também estavam interessados nas caixas das esmolas,mas ele não podia estar em todos os cantos.De vez em quando,lá sondavam uma. O que os salvava era ele nunca os ter apanhado com a boca na botija.
Havia por ali à roda muita malandragem. Era fruta do tempo,era o resultado dessas liberdades, com cara de terem vindo para ficar. Por isso,ali estava ele,de pele curtida por sal de muito mar...

UMA VERGONHA

Ainda não há muito tempo,um cartaz,ou lá o que era,fazia-se eco duma realidade de bradar aos céus. E isso pela indicação de um número de arrasar. E acentuava-se lá que esse número não era uma mera indicação estatística,mas sim o revelar de uma tragédia. Cinquenta milhões de almas,pelos vistos,penadas,não dispunham de proteção na saúde.
Passava-se isso num cantinho deste vasto mundo,por sinal,um dos melhores cantinhos dele. O que se poderia dizer,então,se se tivesse em consideração todo esse largo mundo? Uma tragédia ainda maior,uma calamidade,de não deixar dormir sossegadamente todos aqueles que dela estavam livres e que dela tinham conhecimento.
E,afinal,só se estava referindo uma única proteção de um conjunto delas,todas importantes,fundamentais. A calamidade era,assim,muito maior. Mas não é ela só dos tempos que correm,pois vem já de há muitos,muitos anos. Pode dizer-se que as gentes têm feito a sua vida entregues à bicharada,como acontecia nos alvores da aventura humana. Tiveram os ancestrais ,para se livrarem dos inimigos de várias qualidades,de se refugiarem em cavernas e de subir ao topo das árvores.
O tempo que levaram a sair desta sujeição,imprópia da sua dignidade de seres avançados. Uma vergonha. Mas saindo dela,uma maioria esmagadora nunca encontrou proteção que se visse. Quase que se tem visto obrigada a recolher-se em "cavernas" e a, permanentemente ,"trepar" às árvores.

TRIUNFOS

É um simples banco de pedra. E nele estão inscritos,singelamente,uma data,perdida no tempo, e uns dizeres. Fora ali,sobre aquela pedra,que ocorrera o nascimento de uma coletividade que se veio a cobrir de glória.
Não seria de esperar outra coisa,sabendo da personalidade que o testemunhou. É que ali muito perto,lá num alto pedestal,estava,e está,alguém que muito alto subiu. E esse alguém não podia ficar indiferente à vista daquela menina que acabara de vir ao mundo. Certamente lhe lançara as suas bençãos.
Ele,que tantas vitórias somara,havia de contaminar aquela criança. Muitas vitórias,de facto,ela veio a ter. Mas à semelhança dele e de tantos outros que se notabilizaram,chegaria um tempo em que vitórias deixariam de se ver. É,afinal, a vida,com os seus altos e os seus baixos. Por isso,o que importa é que a história não vai esquecer quem tantos triunfos alcançou.

PARA NÃO VARIAR

Dali,podia dizer-se,não havia nada a esperar. Mais tarde,ou mais cedo,haveria um afogamento.
Estaria o caso quase a arrumar-se,quando apareceu,inesperadamente, "uma bóia de salvação". E a "bóia" salvou,embora estivesse longe de ir atuar nessa qualidade. E aconteceu o inesperado.
Passou a constar que não iria haver nenhum afogamento. Eram tudo suposições lá da "bóia". Para o que lhe havia de dar. Ela nem era capaz de a si se salvar,quanto mais livrar outro de se afogar.
Mas a questão poderia ser outra,o que vinha baralhar as coisas. É que não se queria admitir que teria havido perigo de afogamento,pelo que não haveria nada a salvar. E assim ficaram as coisas,como,aliás,tem ficado muita coisa,para não variar. E assim,lá se iam,também,entretendo,
para,igualmente,não variar.

SÓ UM MILAGRE

O olhar dele,um homem alto,meio alourado, aí de uns quarenta anos,era triste, parecendo andar ali a cumprir forte pena. Arranjara trabalho,é certo,coisa muito rara de onde viera,mas estaria raladinho de saudades lá do seu torrão. Já iam para seis anos quando de lá saíra.
Então,aquilo por lá não muda para melhor? Não podia,que só com agricultura,que é o que havia por lá,não se sai da cepa torta. Fora sempre assim,não havia nada a fazer. Só um milagre.
Para sorte dele e de muitos outros,onde agora se encontrava a fazer pela vida, a coisa era bem diferente,parecendo que continuaria a sê-lo,o que ele pediria aos seus santos que assim fosse por muito tempo. Também pediria que a disposição dos naturais se mantivesse,enjeitando trabalhos que os de fora não se importavam de fazer. E disse isto de uma maneira híbrida,misto de satisfação e de censura.

UM HOMEM PERIGOSO

Tão contente que ficara o moço com a lembrança do pai. Naquela semana,iria acompanhá-lo,lá na sua vida de terra em terra. E logo na primeira noite,o que lhe havia de suceder na pensão em que ficaram instalados.
Então,é este o filho mais velho de que me tem falado? Está aí já um homem feito. E bem parecido que ele é. Está mesmo bom para a minha filha,e se ela o não quiser,não me importava de ficar com ele,pois o meu marido já lá vai.
O diabo da mulher,o que ela estivera para ali a dizer.O moço esperava lá uma coisa daquelas. Estava crescidinho,é certo,mas ainda muito novo para casar. A mulher devia ter estado a mangar. O certo é que aquelas tiradas perturbaram-no bastante. Ele não sabia o que era,mas lá na sua cabeça iam coisas muito próximas de uma revelação. Crescera de repente.
Um pouco mais tarde, aconteceu-lhe outra que se veio somar à primeira. Num passeio com mais gente,a certa altura,calhou caminhar entre marido e mulher. De súbito,a senhora passou-se para o lado do marido. Mas que é isto? Querem ver que já me consideram um homem,e,pelos vistos,um homem perigoso?

terça-feira, 22 de dezembro de 2015

A REGA E A NUTRIÇÃO DAS PLANTAS

A água é , como se sabe, o veículo dos mutrientes para as plantas. Uma vez que os nutrientes estejam disponíveis no solo,a sua absorção pelas plantas far-se-á,em regadio,sem as dificuldades que frequentemente se registam no sequeiro. Com efeito,um solo pode estar suficientemente provido de elementos mutritivos,mas se a água escasseia,a sua absorção é constrangida. A rega facilita,pois,a nutrição mineral das plantas. Porque assim é,não se mostra necessário, em regadio, constituir nos solos reservas nutritivas particularmente altas,ao contrário do que se tem verificado em sequeiro,ainda,como se sabe,as necessidades das plantas sejam, em regadio,mais elevadas.

CARVÃO MINERAL E EMISSÕES DE DIÓXIDO DE CARBONO

Como se sabe,o carvão mineral é um combustível fóssil,pelo que o seu uso repõe na atmosfera anidrido carbónico com que,pode dizer-se,não se contava. Aconteceu isso mais intensamente com a Revolução Industrial. É o que o continua a acontecer,
sobretudo,na China,o terceiro país com maiores reservas de carvão mineral,a seguir aos Estados Unidos e á Rússia,por via,em grande parte,da produção de eletricidade.

O CUPIDO

Eram dois que já se não viam há uns bons tempos. O mais novo, ia sentado num banco de trás do elétrico, e o mais velho,um senhor muito sério,ia na plataforma da frente,apinhada. Quer alguma coisa para Fátima? Era o mais velho que se casaria lá no dia seguinte,como todos ali ficaram a saber. O que o Cupido é capaz de fazer.

OS "JUÍZES"

O que ia por lá de julgamentos. Todos os sitios serviam para decidir,mas havia dois mais das simpatias daquela gente e que eram as esquinas das ruas e as mesas dos cafés. Julgamentos definitivos,sem apelo,nem agravo. Todos os julgados tinham o mesmo destino,o degredo,assim como o riscá-los da existência,da vida. Ninguém escapava naqueles tribunais,a não ser,claro,os "juízes",gente do melhor,cheia de perfeições,sem uma leve manchinha a enodoá-la. Eram assim,naqueles tempos,e lugares,os "juízes". 

GAGUEJAR

Eram três a exame. Um,coitado,já se tinha perdido a conta das vezes que lá ia. O professor,condoído,mandou-o em paz,depois de duas ou três perguntas a despachar. O segundo,levava a melhor nota do ano. Talvez para ele não se julgar o melhor do mundo,o professor não o poupou. Por um triz,ia chumbando. O terceiro,lá se aguentou mais ou menos,talvez um pouco melhor do que menos. Não admira,pois,que o seu gaguejar se tivesse acentuado,de modo a dar nos ouvidos das testemunhas. Olha que não sabia que gaguejasses tanto.

A SUA DIGNIDADE

O Clementino. magro,muito pálido,de cabelo ondulado,com maneiras de mulher. Prestava seviços domésticos nalgumas casas e andava de avental quando ia às compras. Alvo de dichotes,não se acanhava,repontando com voz de falsete,e,às vezes,muito irritado, por achar demasiada a impertinência. Tinha a sua dignidade. Gostava de ir ao cinema,mas nem aí o poupavam,mesmo em plena sessão. Era uma outra fita,esta inteiramente de graça.

TRESPASSADO

Até ali nunca dera conta do que acabara de descobrir. Os olhos também podem falar. Não de um modo audível,é certo,mas entendível. Um falar,às vezes,de conveniência,como naquela altura. Diziam,mas não se comprometiam. Que bom,ou mau,poder falar assim. Ninguém os leva presos.
Pois ali estava,sem qualquer dúvida,um desses olhares. O que estava claramente dizendo? Que sorte tens tu homem. Aí comodamente instalado nesse belo carro,que não é teu,mas para mim é como se fosse ,que eu não posso ver uma camisa lavada a um pobre.
Assim eu tivesse tido essa sorte. Não calhou,mas eu é que a merecia,pois sou muito superior a ti,um Zé Ninguém. A inveja que eu tenho de ti.
E aqui,a intensidade daquele olhar quase varava. Sentira-se trespassado e tivera medo. De que seriam capazes aqueles olhos? De fulminar? Sabe-se lá.

ESTENDAL ENORME

Para caraterizar uma figura histórica,um ilustre ensaísta encheu de adjetivos uma página inteira. Pois o que se ouve e se lê acerca das muitas figuras públicas por esse vasto mundo não enche só uma página mas muitas.
O estendal de termos inclui,entre outros,além desses prestimosos classificadores,substantivos e verbos,como subir,fragilizado,descer,surpresa,castigado,promoção,
vingado,aparelho,premiado,independente,apressado,injustiçado,despedido,um nunca mais acabar.
Alguns deles fazem lembrar brincadeiras de crianças,lutas,até guerras,pela sua agressividade. Parece,ás vezes,que as estimulam,que as querem,o que é muito triste.

segunda-feira, 21 de dezembro de 2015

À CONTA

Era de ter muita pena do merceeiro,que ele merecia,coitado dele. Mas aquilo começara mal,e do mal não passava. E assim,para lhe dar alguma alegria,passava-le por lá para lhe comprar um quilo de arroz. Não se podia exagerar, que ele tinha as coisas como que à conta. Quer dizer,as prateleiras estavam quase vazias. Tinham lá as suas razões,os fornecedores,e,sobretudo,o mercieiro. É que ele não queria cair noutra. Se aquilo,mais uma vez,desse para o torto,não ficaria,como já acontecera,sem camisa.

TALVEZ NADA

Um muito pouco à semelhança de António Gedeão,ele,mesmo,foi analisar. O quê? Simplesmente,dois simples líquidos. Um,extraído a muito alta temperatura,o outro,ao contrário,a muito baixa. E fez isto muito depressa,muito ansioso. Havia qualquer coisa nos ares,que não lhe estava nada a agradar. Não sabia o que era. Era qualquer coisa.
E o que é que ele viu? Uma diferença muito grande. O da alta tinha muito mais cálcio. Era o que ele já andava temendo. E confirmara-se. Ora isto queria significar qualquer coisa,mas ele não sabia o que era. Talvez pedra,talvez rocha,talvez pó,talvez nada.

SONHARA DEMAIS

Coitado dele,tinha sonhado demais. Aquilo não era carga para as suas fracas forças. Como ele ia ali,parecia um derrotado. Já nem malinha trazia,de que ele tanto gostava.
Passara a ser o patrão,coisa que vinha desejando ser desde há muito. Vivera para isso,suportando sabe-se lá o quê. Chegara a sua hora,e ele iria agarrá-la,que a não podia perder.
Pois é,mas a coisa dera para o torto,e, naquela altura,já muito gasto,ninguém o quereria para dar uma ajuda. Não faltariam outros mais novos. Sonhara demais,fora o seu grande mal.

UM DIA DE PRIMAVERA

Estava a família,de novo,reunida. Ela ainda conseguira recuperar da doença que a minava,que a consumia,o que bem se via,na sua magreza,na sua palidez extrema.
Era meio-dia,de um dia lindo de primavera,pelo que tudo convidava a deixar a toca. Tinham acabado de sair dela,uma toca que lá vai teimando,apsar do caruncho,apsar,sobretudo,de dois incêndios,que a deixaram ainda mais alquebrada.
Saiu ele,primeiro,com o seu grande cão negro,saiu ela,depois,com o seu grande cão branco,que se lhe adiantou,pois não podia mais. E ali mesmo,em pleno passeio,aliviou-se. Mas por muito pouco tempo,uns segundos apenas,lá ficou o presente exposto,que ela,pressurosa,não permitiu,era feio,muito feio.
E para que outros aprendessem, ela atravessou, rapidamente, a rua, muito movimentada,abriu o saco-mala,tirou de lá um saquinho negro,de plástico,e,como mandam as boas regras,enfiou nele o presente do seu cão,que foi logo depositar no contentor ali perto.
E lá foram os quatro,como de outras vezes,tratar da vida,que se fazia tarde,que ela,a vida,não está para brincadeiras. Voltariam,lá pelo fim do dia,depois de terem tratado dela,da vida que lhes coubera.

VIA SACRA

O ato chegara ao seu termo. Todos os bens,incluindo os da mulher,tinham ido na voragem. Ainda há bem pouco tempo o futuro lhe sorria,mas naquela altura,amarga altura,estava reduzido a nada. Não se contivera. Chorou lágrimas grossas,vindas dos fundos das entranhas. Ouviu-as o filho,uma criança aí de uns oito anos. Não as entendeu lá muito bem,no momento,mas ,mais tarde ,teve delas a real dimensão,vertendo-as,também,uma e mais vezes,que ocasiões não lhe faltaram.
Depois de uma maratona,que quase o arrasara,o filho recebeu dois prémios,cada qual o melhor,na forma de duas doenças graves,a dele próprio e a do pobre pai. Foi obrigado a esconder a sua,para acudir á outra,pois não havia mais ninguém de serviço. Sozinho,fazendo das tripas coração,acompanhou,dia a dia,a via sacra do pai,o costume,consultas,operação,internamento prolongado. Quase vacilou,mas lá cumpriu,mais morto que vivo,a sua missão. Pouco tempo,depois,encostou. Sozinho,sempre,a sua condição,lá se recompôs,mais ou menos,mas mais para o lado do menos,uma sorte,ainda,ou não,que podia lá ter ficado.
A mãe,coitada dela,lastimava-se,que mais não podia fazer,pois tinha lá também a sua carga,a sua conta,nada leve,como tantas,por esse mundo de contrastes gritantes,clamando aos céus,não se sabe bem porquê e para quê. O coração dela andava amarfanhado,dorido,muito dorido,como o de tantas mães,por esse mundo de interrogações e de interjeições. Merecia ela também um prémio. Entregaram-lhe,é certo,mas igualzinho ao calhado a muitas,um redondo nada. Tantas heroínas desconhecidas

NÃO DARIA PARA MAIS

Coitada da senhora,ou não,sabe-se lá,que ela estava ali ainda como nova. Saberia ela muito bem da sua vida,que já estaria quase no termo,ainda que não parecesse,e de mais meia dúzia de outras vidas,aquelas que à sua volta gravitariam.
É que estava ali a ouvir coisas lá de longe,coisas que ela acharia só serem contadas por quem lá tivesse passado,ou melhor,vivido. Tem assim viajado tanto? Soubesse ela que não. Eram coisas ouvidas,lidas,só isso. Não seria bem assim,talvez,mas o retrato não seria muito diferente da realidade.
Pois muito me admira isso,não imaginava. De resto,sabe,são coisas que não me interessam. Já bastam as coisas da minha vida,em que entrariam coisas de outras vidas,da tal meia dúzia que à sua volta gravitariam. Não daria para mais,sabe-se lá porquê e para quê.

QUEM MUITOS BURROS TOCA ...

Fora um balde de água fria. Lá estava a mansão que devia ter muito para contar. Uma escadaria em leque levava ao andar nobre. Em frente,estendia-se um amplo terreiro mal cuidado,que se prolongava por campos a mato. Um não sei quê de abandono escapava-se do solar. Não era aquilo que se esperava.
Lá dentro,mais se acentuou a desilusão. As paredes e os tetos estavam numa lástima. Se não lhes acudissem,em breve desabariam. Os móveis pediam reforma urgente. A cozinha,com uma chaminé de convento,parecia uma loja de ferro-velho. A um canto,cobria-se de poeira uma mesa de séculos. Pelas bancadas,espalhavam-se vitualhas diversas,com aspeto de estarem ali para servirem de pasto a baratas,ratazanas e demais família. Uma tristeza.
Lembrava tudo aquilo a casa de um fidalgo arruinado por dívidas de jogo ou de negócios mal conduzidos. Mas não era este o caso. Simplesmente,quem muitos burros toca,algum há-de ficar para trás.

domingo, 20 de dezembro de 2015

A MESADA

Recordava-a com saudade,mas também com gratidão. A sua ação fora determinante no arranque da sua vida profissional. A energia que ia ali naquele corpo baixinho,naquela cabeça de cara muito rosadinha. Só quem com ela convivesse é que dava conta do que ela era capaz.
Era a tradutora oficial lá da casa,mas não ganhava como tal. Coisas que acontecem quando os quadros são rígidos. E assim,fora contratada como auxiliar de laboratório.
Não era ela,pois,que lá mandava,mas tinha uma grande influência nos que mandavam. A sua vitalidade,a sua palvra fácil,desatada e rica,os seus muitos conhecimentos,de línguas,e não só,a sua cultura,haviam de lhe servir para alguma coisa.
Ele tinha sido admitido como tarefeiro. E chegara a altura de lhe fixarem a mesada. Estavam presentes ele,ela e o chefe. E o chefe lançara para a mesa uma quantia muito modesta. Ela não se contivera. Oh senhor chefe,isso nem dá para o moço mandar cantar um cego. Então,o que propõe?E ela lá disse o que lhe pareceu razoável. E o chefe aceitou e o moço ficou todo satisfeito.

A SUA VIDA

Chapas metálicas volteavam no céu como simples papéis arrastados pela ventania. Lá tinha ficado sem cobertura a bancada do campo de futebol. Muitos telhados não resistiram,seguindo o exemplo de muitas chaminés. As árvores despiram-se de folhas e de ramos e muitas tiveram de mostrar as raízes. O ciclone,na sua fúria,quase desmoronou o grande jardim,a sala de visitas lá da terra.
Por essa altura,um pai de família,angustiado, fizera-se ao caminho,única forma de chegar onde se queria ir. Dias antes,deixara em casa mulher e filhos pequenos. Era o costume,era a sua vida.
Como estariam? Onde se encontrará o pai? Como estará ele? Devem ter rezado para que estivessem bem. Foram longas horas de angústia,naturalmente.
Teria muito para contar este pai quando a casa chegou. Mas pouco contou. Um inferno aquela estrada. Vira tombar árvores,vira outras lutando para se manter de pé,que as árvores gostam de morrer assim. Fora uma sorte não ter ficado lá.

OS DOIS MIRANTES

Não tivera a vida que ela sonhara. Coisas que acontecem,vá-se lá saber porquê. Mas acabara por se conformar. Depois,viera-lhe uma compensação inesperada.
É que,para além do corpo,há a alma, e esta ficara,em boa parte,lá onde fora uma menina feliz. E esse "eldorado",esse "paraíso perdido",passara ela a tê-lo ali bem na sua frente, do mirante da sua penúltima casa. Consolava-a vê-lo. Era como se o tivesse de novo ali,era como se o não tivesse deixado.
E sentava-se na varanda sempre que podia. O panorama era amplo,mas não abrangia todos os sítios das suas belas recordações,talvez das mais lindas. Um dia, poderia também os ter a seus pés.
E esse dia chegou,quando a levaram para a sua última morada,um outro mirante.

APETITES

O dia estava soalheiro,à semelhança da bolsa de muitos. Assim,as estradas eram como rios caudalosos a confluir no mesmo mar.E o que fazia mexer tanta gente? Um festival de gastronomia. No ar, pairavam aromas que estimulavam os apatites.
Muito perto,repetia-se similar desassossego. Podia dizer-se que ali havia sempre festa,pois calhaus não faltavam. Um pouco mais além,era um frenesim da mesma família. Filtrados pelas paredes,chegavam sinais de bodas de arromba.
Era tudo isto o resultado da bondade do ano. As terras tinham-se desentranhado em tomate,uvas,milho,arroz e outros mimos. Abençoda chuva que enchera barragens e algares. Pena era que o mundo não fosse todo assim.

PARA AS OCASIÕES

Ainda bem que te encontro. É que estou aqui com um problema que não há meio de resolver. Já te digo que não é coisa de dinheiro. Tenho-te em conta de seres meu amigo,pelo que não me irás recusar uns minutinhos de atenção. Os amigos são para as ocasiões,não é assim?
Pois claro que sou teu amigo,e de há muito. Mas vens em muito má altura,pelo que agora não pode ser. É que tenho lá em casa o cãozinho á minha espera,de que sou também muito amigo,e ele de mim.

DOUTRO MUNDO

Toca o telefone. O "amigo" atende. Olha lá,não me podes dizer a morada de fulano? Ainda há dias estiveste com ele,deves saber. Espera um momento,que é só ir ali ver. O momento passou,um largo momento. Olha lá,tu não sabias ir à lista?
Ainda bem que te encontro. Estou a precisar de um quarto aqui perto. Como conheces este bairro,és capaz de saber. Vens mesmo na boa altura. Vais ficar como em tua casa. Era uma casa... É escusado classificá-la.
Vens mesmo a calhar. Aos anos que se não viam. A minha mulher está a precisar de uma pele,dessas que há lá para onde tu vais. Aí são mais baratas. Olha que se não ma trouxeres nunca mais te falo. Receber, estão sempre prontos. Dar,é coisa doutro mundo.
Estou aqui tão satisfeito.Vê lá tu que o professor disse que eu colaborei num trabalho de muito préstimo. O professor sempre foi muito exagerado.
Muito me contas. Mas isso não é nada,comparado com o que se passa com os meus. Todos uns génios. Não há outros.
Que sorte tu tiveste. Já reparaste nas perguntas que te fizeram? Assim também eu.
Vou-te contar o que há tempos me sucedeu com fulano. Pode lá ser. Ele era incapaz,conheço-o bem. Outro exagerado.
Olha que na net há montes de coisas. Pois sim,mas estão apenas as que são lá postas.
Quero-te dizer que continuo com o blogue. Ah,sim? Mas quem é que te lê?

UMA ESCADA

Já há muitos anos que o não via,mas estava ao corrente do seu brilhante percurso. De resto,não era de esperar outra coisa,do que dele sabia. Ainda há pouco tempo tivera novas dele por alguém que muito o considerava. Era difícil encontrar melhor pessoa,sempre pronto a ajudar,sem regateios.
E foi uma grande surpresa a colhida naquele fim de tarde. Vinha dele uma profunda melancolia,que as olheiras ainda mais acentuavam. Não esperava o seu desabafo. Fora uma incontida necessidade,para descomprimir. O que ele sofrera ultimamente. No passado,tivera já uns ameaços,mas coisa sem importância. Mas naquela altura, não. E veio o esclarecimento.
O patamar que ocupava,um patamar cimeiro,devia-o a uma esmola. Sim,não se lhe podia chamar outra coisa. Chegara ali,porque alguém,por capricho, por vaidade,talvez por bondade,lhe dera a mão. Nesse tempo,era muito novo e o gesto agradara-lhe. Se assim não tivesse acontecido,ainda,muito provavelmente,lá estaria naquele buraco,trilhando os mesmos,ou muito parecidos, caminhos do pai,um bom homem,mas um pobretana.
Trabalhara,era certo,pondo a render os dons que herdara,e ali estava sem precisão de mendigar. Não pedira nada,mas aceitara,o que para ele ia dar no mesmo. Quantos não podiam ter trepado como ele,se uma escada lhes tivesse sido oferecida,mas a sorte não os bafejara. Porquê ele e não outros? Fora uma injustiça. E isso amargurava-o,por ele e por muitos. Não foi possível consolá-lo.

SEGUNDAS INTENÇÕES

Era mesmo parecido com a mãe. Entre outros jeitos,dela lhe ficara o de não enjeitar gente de pouca consideração. Quantas vezes a vira à conversa,por largo tempo,com uma velhota que vivia de recados. Lá se entretinham não se sabia bem com quê,mas o certo é que nem uma nem outra mostrava enfado.

Ia lá por casa,também,uma moça um tanto atrasada,mas que se encarregava,a contento,aqui e ali,de vários serviços. A doença, ou lá o que era,parecia ter resultado de maus hábitos dos pais,que abusariam da pinga. Coxeava,e trazia,quase sempre,os olhos muito inflamados. De feitio tristonho,a mãe procurava alegrá-la ,incutindo-lhe esperança num bom casamento. Pode lá ser,senhora. Ela ficava,porém,muito satisfeita,estado que raramente a visitava. Coitada dela,fugia dos rapazes,como se fosse do demónio.

Pois ele herdara da mãe esta faceta. Não é que os procurasse,mas eles aproximavam-se ,talvez por sentirem que não seriam enxotados. Enchia-se de paciência para os atender. Pelo menos,com estes não teria surpresas. Não havia ali segundas intenções,apenas uma necessidade vital de companhia.

sábado, 19 de dezembro de 2015

UM FANTASMA

Nunca ia sossegado. Foi um ano de pavores aquela arrancada escolar. E que longo era o caminho,para os seus sete anitos. A culpa daqueles pavores deve ser lançada à conta da partida que lhe tinham pregado uns meses antes. Até a gaguejar ficara. A coisa também não era para menos,deve-se concordar.
De repente,aparece-lhe pela frente,como vindo do ar,um fantasma. Um lençol a saltar,a guinchar. Uma brincadeira de mau gosto de uma menina já crescidinha. Pois ficou para morrer. O certo é que acreditou e durante largos meses aquela alma penada perseguiu-o.
Ia sempre a olhar para trás,desconfiado. Para piorar as coisas,tinha de passar por um boqueirão de respeito,onde constava morarem,lá nos fundos,lobisomens. O que ele corria naquele troço. Depois,um pouco mais adiante,havia uma ruazinha muito estreita,quase empinada,onde acontecera um milagre. E isso mais o amedrontava.
É de admitir,pois,que esta amarga experiência,em começo de vida, tenha contribuído para uma certa timidez que o acompanhou durante muitos

COISAS DA VIDA

O que uma guerra pode engendrar. Certa terra,que,felizmente,dela se livrara,que estava mesmo longe dela,resolveu também participar,à sua maneira,à sua escala.
Aquilo não passou,a bem dizer,de umas brincadeiras,mas,mesmo assim,obrigou ao fabrico de dois partidos. Podiam ter nascido mais,que sensibilidades várias não faltavam,mas dois chegavam,tanto mais que na guerra a sério eram dois os contendores.
As operações bélicas limitaram-se a duas modalidades. Numa,visaram-se montras,na outra,esmurraram-se caras. Nunca se soube bem porque viera logo para a primeira linha uma das montras. Parecia ter havido ali um grave problema de cofres vazios. Teria sido,assim,uma desesperada tentativa de equilibrar as finanças. Enfim,coisas da vida,que a uns corre tudo sempre muito bem,enquanto a outros é o que se sabe.
Volta não volta,lá apareciam os vidros quebrados em ambas as frentes. A reparação não demorava,uma questão de honra. Mas não dava para descansar,que o inimigo estava sempre de serviço. Era vital não ceder. Sinal de fraqueza,de derrota,nunca nestas duas frentes.
Quanto às caras,houve um caso que deu brado. De uma banda,a cara era a de um gigante,da outra,a de um pigmeu. Foi o grandalhão o derrotado,tal como veio a asuceder ao contendor que ele representava.

PASSARÕES

O moço já trazia a lição estudada. Até ali,viera de comboio,um comboio ronceiro,como eram quase todos os daquele recuado tempo,e,naquela altura,tinha ali uma barca à sua espera. Mas que barca e que ancoradouro,tão desconjuntados eram. Uma e outro davam mostras de não poderem resistir a um inverno mais rigoroso. Pelo menos,assim pensou. É que aquilo eram penedos por todo o lado. Só que ele não sabia o que veio a saber mais tarde. Aquele era um local abençoado,por ter ali atravessado uma santa.
Naquela noite de verão,uma noite calmosa que apenas as estrelas se encarregavam de alumiar, e um ou outro pirilampo,tudo correu como devia ser. Mesmo assim,só quando se viu na outra margem é que respirou melhor. A seguir,tinha pela frente um bom par de quilómetros,sempre a trepar. Mas ele era novo e as cigarras tiveram pena dele,acompanhando-o até ao topo.
Era a sua primeira grande aventura. Muitas outras se sucederam,algumas sem aviso prévio,
como que à queima-roupa. Mas há que estar preparado para tudo. Depois se verá. Em todas elas se notaram traços da primeira. Ele foram os transportes e as pernas,ele foram as ladeiras mais ou menos íngremes,ele foram as noites,algumas escuras como breu,ele foram as pedras e os pedregulhos.
Cigarras é que nem uma. Passarões é que não faltaram,o que não é bem a mesma coisa. Para compensar,teve,mais do que uma vez,anjos a ampará-lo,ou talvez um apenas,que os anjos sabem disfarçar-se.

DE QUALQUER MANEIRA

Oh amigo,não havia aqui uma casa? Havia sim senhor. Como é que você sabia,se não é daqui? Olhe para esta fotografia. Quando ela foi tirada estava cá. Pois estava. E que bem ela se vê. Quem é que fez essa fotografia? Foi alguém que andou por aqui de avião. Então já a gente não pode andar por aí de qualquer maneira? Isto até parece mentira. E agora estou eu a ver. Ali também estavam uns chaparros. Desapareceram para se fazer o caminho. Sim senhor,está-se sempre a aprender.

UMA FESTA

Era um rapazinho de cabelos loiros,revoltos,e de olhos muito vivos,espertos. Irrequieto,pouco parava em casa. Tinha lá o seu grupo,de que era o capitão. Saía,muitas vezes,descalço,manhã cedo. Também,muitas vezes,não vinha almoçar. Ele lá se arranjava. Fome é que não passava. Um desenrascado nato.Percorria a terra em permanente brincadeira. Nos jardins,era uma festa. E foi num deles que um turista,irresistivelmente, o fotografou. Compreende-se o interesse,o entusiasmo, do turista. Aquele miúdo,que teria,quando muito,seis ou sete anitos,era bem a Estátua da Liberdade. Camisa aberta,calções descaídos,pés nus,expressão de desafio. Prometia,não lhe restava a mínima dúvida,visto possuir fortes marcas do sucesso.

MAIS QUE FAZER

O rei não ia nu,antes pelo contrário,mas ia só. Parecia isso uma grande ousadia,pois era sabido que muitos perigos o espreitavam. E a rua que ele descia estaria cheia deles. Tratava-se,de facto,de uma vereda muito apertada,quase imitando um desfiladeiro,de passeios miniaturais.Não admiraria,assim,que os serviços competentes ,muito previamente,tudo tivessem feito para garantir a segurança de sua majestade. A rua estaria vigiadíssima,só que não se notava à vista desarmada. Foi o que constatou um velho,que,por um muito mero acaso,se viu a caminhar atrás do rei. Olha,mas é o rei,e não leva séquito. Donde virá ele e para onde irá?Rapidamente ficou tudo esclarecido. É que,atentando melhor,deu conta de grande festa ali mesmo a dois passos. Estar-se-ia fazendo tarde e outra festa o esperaria,que os reis precisam de se distrair.Talvez sem dizer água-vai,o que não seria de estranhar,ele ali ia muito serenamente,sem olhar para trás,nem para os lados,que ele saberia estar bem guardado,para a sua carruagem,estacionada uns cem metros abaixo,numa meia-laranja,muito conveniente em garganta como aquela.Porque o velho aparentava não fazer mal a uma mosca,não fora incomodado na sua digressão ocasional. O mesmo aconteceu a um casalinho, entretido nos seus amores. Nem deram conta do velho,nem do rei. Tinham mais que fazer.

MUITAS MANIAS

No reino da bicharada, apareceu por lá, um dia, um cágado cego e mudo. Durante muito tempo, tiveram pena dele, desfazendo-se em repetidos cuidados e atenções. Mas, a certa altura, já muito próximo da partida para o outro mundo, tudo mudou, o que não era de esperar. É que, repentinamente, deu-lhe para exibir muitas manias. Se fosse apenas uma, vá que não vá, ainda se tolerava. Quem as não tem? Mas assim tantas, era de perder a paciência e disposição para o aturar. Mas havia uma que dava vontade de rir e era o que muitos faziam, por não resistirem à cena. Então, não é que se julgava o maior saltador do reino? E isso,porque, certa vez, depois de muito tentar, conseguira saltar um milímetro. Sou o maior, sou o maior, não se cansava ele de atroar os ares. Passou a ser, pois, motivo de grande chacota. Ele não dava conta, coitado. E assim permaneceu, até que se foi desta para melhor.

ESCAPE ABERTO

Faziam bicha,eles e elas,junto à loja de peixe frito e de batata frita. Vinham de mota,de escape aberto. E ali ficavam,sentados,de pé,comendo com sofreguidão,lambendo os dedos. Confortados,debandavam,deixando um rasto de gases,de ruídos,de risadas,e,acima de tudo,de vida.

PARECIA VOAR

Toda a gente sabe,ou devia saber,que se não deve mandriar,que se deve fazer pela vida,que a vida está lá à espera,muito nervosa,para ser vivida. E era o que aquela senhora estaria fazendo. Já não era nova,longe disso. Teria aí uns cinquenta ou sessenta anos,que isto de idades tem muito que se lhe diga. Toda ela se vestia de negro,de negro mais negro,da cabeça aos pés.Não se sabe o que ela teria vendido. Apenas se ouviu o que ela disse a alguém que lhe teria ficado com uma parte da sua mercadoria,o resto da qual,que ainda era muito,estava envolvido num pano,também negro,de negro mais negro,a servir de saco.Eu nunca mais esquecerei a senhora dona Maria e a dona Maria também não se irá esquecer de mim nunca mais. Pouco mais tempo ela ali se demorou,pois tinha lá, à sua espera,outras donas,Marias ou não. A pressa que ela levava,rua fora,ligeiramente a subir,merecia ter ficado registada. Parecia voar.

DE CIGARRO NA MÃO DIREITA

O que se estava vendo era isto,mas já se vira isto muitas mais vezes. A idade rondará os setenta. O corpo é esguio,alto. As costas são direitas,que nem tábuas. A cabeça é pequena,como a de um passarinho. O cabelo é grisalho,levemente ondulado. O andar é lesto,ainda que tropeçado,talvez por assim ter saído.E ali ia ela,como sempre,de cigarro na mão direita. Dava um passo,aparentemente,inseguro,e levava o cigarro à boca. Dava um passo,recolhia a mão com o cigarro. Dava um passo,expelia o fumo. Dava um passo,levava o cigarro à boca. Isto,como uma máquina. As costas,sempre direitas,olhando em frente,imperturbável.

sexta-feira, 18 de dezembro de 2015

MUITO QUIETINHO

A ser verdade o que o velho esteve para ali a contar,ele deve ter passado um muito mau bocado,em certo passo da sua vida. É que participou na criação de um posto médico. Os trabalhos,e aflições,que aquilo lhe deu,tanto mais que ele também tinha de estudar.Para começar,a escolha do esculápio. Estiveram vários interessados no anúncio que saiu nos jornais. A vida estava difícil,sabem. Um sarilho, que não há meio de se ir embora. Mas só um é que podia ficar,claro. A escolha parece ter sido acertada,pois entrou novo,e disse adeus quando já era quase um velhinho. Os outros é que não estiveram pelos ajustes.E choveram cartas,algumas de má catadura,até com ameaças disto e daquilo. Mais um sarilho,dos grandes. O moço não sabia onde se meter,e ele que tinha tanto para estudar. Felizmente que os preteridos tinham também a sua vida,pelo que se foram esquecendo,a pouco e pouco. Mas o caso esteve feio.Além do médico,houve as compras a fazer,marquesa,armário,mesa,cadeiras,primeiros socorros,coisas assim. Pois foi o moço que disso se encarregou. Podia ter nascido aqui outra encrenca,por não se ter feito concurso. Não lhe foi difícil,porém, esta tarefa,visto ter batido a uma porta de nome bem sonante,já muito batida nestes fornecimentos.Depois,para compor o ramalhete,uma pessoa muito importante não ficou nada satisfeita com o andamento da doença do filho. A constipação não havia meio de curar e a culpa era do médico. Quis levá-lo a tribunal.Outro sarilho,para o médico e para ele.Enfim,quando se viu livre daquela função,nem queria acreditar. Vá la uma pessoa querer ser útil. O melhor é ficar lá muito quietinho ,num canto muito escondido,de maneira a não darem por ele.

SAFA

Já se não viam há muito tempo,pelo que estiveram ali um bom bocado à conversa. Quase a terminar,um deles lembrou-se de uma notícia recente e de alto significado. Então,o que dizes do convite que fulano recebeu?Mal dissera o nome do convidado,o outro raspou-se logo,como se quisesse fugir a sete pés de algum perigosíssimo bicho,ou, quem sabe?,do mafarrico em pessoa. E quando o fez,soltou um safa com tal carga de repúdio,que deixou o companheiro meio atordoado,sem disposição para pedir um esclarecimento.É bem certo que santos da casa não fazem milagres. É bem certo que não há pessoas que valham para o seu criado de quarto. É bem certo que em certos cantos não é o mérito que conta. É bem certo que nos mesmos cantos não são as ideias,mas as pessoas que importa discutir. Coitado,é careca,um rente ao chão,veste mal,está sempre a tossir,não gosta de telenovelas,não vai ao futebol,... Não presta,em suma.Vá lá para onde o quiserem,que cá não faz falta. Faça-lhes bom proveito,a ele e a quem o convidou. Era o mínimo que se podia ouvir. Mas nem isso. Safa.

OS OUTROS QUE ESPEREM

Já repararam nalgumas sumidades que por aí andam,ao pé da porta ou lá por longe,pavoneando-se como em parada triunfal,de recolher os aplausos? Devem ter reparado,porque elas fazem-se ao reparo,pondo-se ali mesmo bem na frente do vulgar peão,ocupando os pimeiros lugares das primeiras filas.E devem ter reparado no ar pomposo que exibem,nos olhares sobranceiros,de desprezo,de desdém,que se dignam lançar,na voz engrossada que soltam,uma voz doutorizada,no peito que salienta,quase a rebentar.É caso para perguntar. O que é que elas fizeram para bem das gentes,da humanidade,de ao pé da porta ou da que se encontra lá mais longe,para assim se mostrarem tão sublimes? Examinando,mesmo à lupa,não se nota coisa que o vulgar peão não soubesse fazer também.Quando muito,umas vagas intenções,umas promessas ôcas. O que se nota bem é o que fizeram por eles. Sim,é que,em primeiro lugar,estamos nós. Os outros que esperem.

UM MILAGRE

Querer ganhar,ou vencer,é uma coisa. Mas querer fazê-lo de qualquer maneira,fazendo disso uma questão de vida ou de morte, é outra muito diferente,a precisar de médico. Estando essa disposição muito espalhada, será uma coisa muito grave,com cara de não ter tratamento capaz. E então,só um milagre

PRONTO E PRESENTE

O professor marcava faltas. O que se ouvia,esmagadoramente,era pronto ou presente. Pois é,o pior era aquele p,a iniciar um e outro,aquele falso,que só servia para atrapalhar uma pessoa. E não só ele,havia,e há,ainda outros falsos,com o b,e também,o c. Uns falsos todos,uns traiçoeiros. Deviam todos desaparecer,mas eles não estão para isso,de resto,têm muitos para os defender.Oh senhor professor,tenha pena de mim. Desculpe,mas eu não gosto do p,e de outros,também,mas,agora,o que importa é o p. Quando for caso doutros,eu venho cá ter com o senhor professor,novamente. Mas,agora,é mesmo só o p,desculpe,repetir. É que o p atraiçoa-me,não gosto dele,cá por coisas,não vale a pena estar para aqui a incomodá-lo. Oh,homem,diga lá,que eu sou todo ouvidos. O que é que o apoquenta,que eu já estou com pena de si?O p,senhor professor,o p atraiçoa-me. Quando eu chamo por ele,faz-se de mouco. Está a ver?,de mouco. O engraçadinho. E não vem,e não vem. Grita ele,lá de dentro,chama outro,não estou para te aturar. E isto,já de há muito,nem já me lembro quando começou. Olhe,senhor professor,venho lhe pedir para o trocar por outro. Mas já agora,estou-me a lembrar,e se o senhor professor me dispensasse de abrir boca? Eu, sempre que vier, sento-me ali na primeira fila. O senhor professor,quando das faltas,olha para lá,para essa fila. Se eu lá não estiver,marca-me falta. É simples. Não custa nada. Concorda? Concordo. Que alívio,senhor professor,muito e muito obrigado. Creia que nunca mais o esqueço. Muito obrigado,para

quinta-feira, 17 de dezembro de 2015

UNS SÁBIOS

Sim,pode ser isso que acabou de dizer,mas também pode ser outra coisa. Sabe,há muitos fatores em jogo,alguns,até,desconhecidos,que o sistema é complexo,pois que de diversas vidas se trata. É difícil,arriscado mesmo,dar uma resposta concreta,ajustada,sem se terem feito experiências.Este senhor,coitado,deve saber muito pouco,sempre com hesitações,sem uma indicação precisa,imediata,ali na ponta da língua. Não presta,em suma.Não é assim que procedem tantos,aqui,ali,em qualquer lugar. Têm logo ali,pronta para servir,ainda a fumegar,a resposta,a solução definitiva. Como a arranjaram,assim tão depressa? Muito simples,tão simples,que até uma criança era capaz. Leram ali,leram acolá,e já está. Não importa que a circunstância seja muito outra. Nem sabem,ou sabem,mas não ligam,que a circunstância é que dita,é que comanda. Uns sábios,em suma.

O INTRUSO


Era o render da guarda no Palácio de Buckingham,ocasião para tirar fotografias. Acontece,porém,o inesperado. O pára-sol da objetiva,sem pedir licença,atravessa o gradeamento e vai pousar no pátio. Uma pequena mancha negra,um corpo estranho,talvez explosivo,podiam pensar,era bem visível.E agora? O mais atilado seria abandonar aquele lugar. Entretanto,um polícia aproxima-se. É avisado. Atenciosamente,com um sorriso,curva-se,apanha o intruso,devolvendo-o. Simples,nada do que se temera.

GRANDE COLECIONADOR

O moço fora a uma festa,longe de casa. Quando ela terminou,já se ouvia o galo cantar. Pior do que isso,o carro que o trouxera sumira-se,sem aviso,sabe-se lá porquê. Coisas que acontecem,
sempre que as bebidas e outras coisas mais intervêem.
Havia de arranjar outro,que os amigos são para as ocasiões. Felizmente,àquela hora,ainda havia um. Mas que um. Era um amigo que estava bem acompanhado. Fora sempre um grande colecionador,e ali,naquela rija festa,arranjara mais duas para a sua coleção.
Quando se preparava para embarcar,uma das meninas desatou numa incontida e interminável choradeira,entremeada com uma forte determinação,ou ordem. Com este é que eu não vou,com este é que eu não vou. E dali não saía.
Teve de se lhe fazer a vontade,tanto mais que o amigo estava muito pouco interessado em a abandonar. Amigos,amigos,negócios à parte. Como já não restavam mais amigos,acabou por se encher de paciência,pois o combóio que por ali passava ainda ia demorar

NOITE PERDIDA

Naquele recuado tempo,havia casas para dar e vender ,assim pode ser dito,e baratinhas,quase a preço de saldo. Não foi difícil,pois,arranjar uma. Não era como a primeira,mas isso era para esquecer. Paciência,tanto mais que a situação dela era para invejar,mesmo em local onde aconteciam coisas.
Depois,o espaço era folgado,não como muitos,lá para diante nos anos,onde mal se podia respirar.Para mais,tinha também um quintalinho,para as galinhas,e,mais do que tudo,uma oliveira,o símbolo da paz,que não se esquecia de cumprir a sua primeira obrigação,que era a de dar fruto,que era todo aproveitadinho,o que fazia um grande jeito,e melhor proveito.
Das coisas a acontecer,há que referir,sobretudo,as entradas de toiros.É que uma das janelas estava mesmo em frente do seu recolher na praça. Quando tal sucedia,era noite perdida,pois não se sabia a hora do acontecimento. Era quando calhava,pois os bichinhos tinham lá as suas manias,pelo que obrigavam andar atrás deles,visto não serem lá muito certos. Mas valia a pena. Um espetáculo,de sons indefinidos,de vozes,de chocalhos,de gritos,de sombras,de mistérios.
Ficam para uma outra altura o desvendar desses e doutros mistérios,e talvez não,porque a vida sem mistérios não tinha graça alguma,era vida acabada.

NO TOPO

Tal como na selva. Parecia ter chegado a vez dele. O outro,o chefe do momento,o mandão,o rei,como se lhe queira chamar,já não era o mesmo de há uns tempos,tempos que não havia meio de mudar de dono,tempos do quer,posso e mando. O que ele passara,ao mando dele,não o desejava ao maior "inimigo".
Naquela altura é que era aproveitar. Era altura de o desafiar,que ele já não era o mesmo de tempos atrás,de tempos de vitória,que ainda cheirava. A volúpia que sentia,um prazer novo. É que já antevia uma hora nova,a hora em que o passariam a respeitar,como se tinha feito com o outro. Era um prazer muito grande,uma coisa que ele nunca tinha sentido. O prazer seria ainda maior,certamente,quando ele lá estivesse no topo,no lugar do "inimigo".
Bastava ter visto e sentido,como o ainda chefe se pavoneava por essas ruas e praças,quando se expunha. Era o que ele iria fazer quando o removesse lá do cadeirão,daquele poiso tão sonhado,que até lhe doíam,às vezes,os sonhos,de tão vividos que eles eram. Havia de lhes mostrar,sobretudo a ele,ao que iria desalojar,o que era pavonear-se. Não teriam sido em vão os esforços que fizera para bem o fazer. Haveria de mostrar,sobretudo a ele,ao derrotado,o que era pavonear-se.

FESTA RIJA

Ora cá estamos na segunda casa. Foi só atravessar o grande rio,que ela estava lá à espera. Não era um palácio,mas também não era nada para deitar fora. Dava mesmo para rua nobre. Até um grande quintal tinha, que se assemelhava um pouco ao da primeira casa. Deu até para se criar lá um porco,que teve direito a festa rija,coitado dele. Mas cada um é para o que nasce,não há nada a fazer. Por ali se esteve um certo tempo,o tempo para se fazerem umas certas contas,que não vale a pena dizer quais são. Feitas as contas,não houve outro remédio senão agarrar na mobília e demais companhia,e atravessar,novamente,o grande rio,e ir à procura de uma nova casa,a terceira casa.

quarta-feira, 16 de dezembro de 2015

DESCULPE

Ele era muito esmoler,talvez por em rapaz ter beneficiado da generosidade de familiares,que,de vez em quando,o contemplavam com umas moeditas,que,todas juntas,davam para uma larga temporada.
Acontecia,porém,que,às vezes,exagerava,não pela quantidade,pois não era assim tão desprendido,mas pelo destinatário. É que não sabia lá distingui-los muito bem,sabe-se lá porquê,se calhar por achar que,mesmo não estando à espera, lhes saberia bem.
Uma vez,pelo menos,até passou um mau bocado,pois antes de dar,quis saber se era habitual. Olhe lá,é costume contemplar aqui esta gente? Parecia não ter entendido. Nem pelo Natal? Não,tem graça,nunca tinha pensado nisso.
O outro era já velho, e como que nadava em dinheiro. E ficara a pensar,coitado. Era capaz de não ter gostado,e, sabe-se lá, ficar doente. Olhe,esqueça isso,era outra coisa que eu queria saber. Desculpe.

COLABORADORES

O diabo do homem,sempre a mudar de empregado. Mas não será ele a cansar-se de ver sempre a mesma cara,e sim o contrário,pelo menos,por um tempo. E isso pela razão simples de que a paga não será por aí além, que o negócio não dará para mais. Tem chegado,pelo menos,
também,para ele ir dilatando a barriga,que ali perto não falta onde a tratar.
Os ajudantes,coitados,que já estariam a precisar de reforma,a certa altura,que eles lá saberão qual é,perderão a paciência,e vão dar uma grande volta,de onde só regressam passado algum tempo,quando já não podem mais resistir à penúria. Têm de voltar,coitados,pois por ali não haverá muitos patrões a precisar de colaboradores como eles,mais para o velhote,que são mais baratos,e para o que é servem muito bem.

PARA A RUA

Ele andava ali com uma alma nova. Ainda não estaria tudo perdido. A casa estava cheia,não era como em outros dias,em que estivera às moscas. As apreensões por que passara. Se calhar,iam-no dispensar,era o mais certo,que aquilo assim não dava,ele compreendia,e depois,com é que se iria arranjar?
A casa estava cheia. Poderia ser que fosse o começo de uma nova era,que a casa passasse a estar sempre cheia,que era assim que o patrão gostaria de ver,e assim,já não o mandaria embora.
Parecia alegre,pelo menos,sorria. Mas olhando-o bem,ainda se viam,bem visíveis,os maus momentos que atravessara,na cara muito pálida,magra,nos olhos encovados,olheirentos,naquele olhar onde havia ainda uns restos de pavor,de ter ir,mais uma vez,para a rua,para ficar em casa,sem nada fazer.

SEMPRE SÓ

Naquela manhã,apeteceu-lhe ir até à beira-rio. A temperatura amena convidava a desentorpecer as pernas. No céu,uma barreira de nuvens escondia o sol. A companhia era escassa. Num carro,o condutor punha-se a par das últimas da bola,e uma cana de pesca estava montada na ponta do esporão. Sentou-se,a olhar para as águas castanhas que vinham bater mansamente na muralha. O barco da carreira lá ia em mais uma viagem. As gaivotas estavam recolhidas. Um homem aproximou-se e sentou-se. Trazia a camisa aberta e sobraçava um jornal. Deslocava-se com dificuldade. A cara não lhe era estranha. Já o vira algumas vezes,sempre só. Então,anda também no seu giro? Tinha dificuldade em se exprimir,mas lá se percebia. Estava reformado e o jornal era para regressar ao quiosque ,depois de o ler. De súbito,pôs uma pergunta. Quer que lhe faça alguma coisa? A resposta tardou. Interpretando, ou nã,o o silêncio,vá-se lá saber o que lhe ia na cabeça,como um consentimento,chegou-se mais e a sua mão,onde luzia uma aliança,avançou,pairando. Não se lhe deu tempo para ele a pousar. Já se estava fazendo tarde para ir pelas sopas. Ele levantou-se também, e lá foi devolver o jornal,caminhando,ao longo de largo passeio,muito lentamente,de modo trôpego,olhando para o chão.

DAVA GOSTO

Para baixo todos os santos ajudam. Mas nem deles precisavam. Eram jovens,era manhã e o bem-estar enchia-os. Elas usaram o elevador,eles serviram-se das escadas,quase a voar.
Eram oito,quatro pares,quatro lindo pares. Eles,sãos e escorreitos. Elas,sãs e escorreitas. Tinham sido uma noite de sábado e uma madrugada de domingo bem passadas. Viviam no mesmo andar,em sociedade. Era melhor do que alugarem quartos.
Juntaram-se à saída. E ali ficaram uns momentos,rindo e assentando ideias. Dava gosto olhar para eles e elas. Descontraídos,desinibidos,de cores sadias.
Lembravam maquinismos acabados de sair da fábrica,novinhos em folha. Nem uma mácula,tudo só brilho. Lembravam, também,cavalos à solta em vastos prados. Tudo aquilo para eles,erva tenra a perder de vista e água a jorros. O que eles corriam,como eles o faziam. Dava gosto olhar para eles.

UM DESASTRE

Não interessava saber em que ela se tinha ocupado durante anos e anos. O que interessava saber era que ela tinha vivido durante a maior parte desse longo tempo em barracas,tinha,até,
nascido numa.
A dada altura,porque ,na ocupação ,conseguira cem por um,ou coisa parecida,mudara-se para uma casa como devia ser,nem precisaria de tanto. E foi um desastre,um modo de dizer.
Os indícios já se vinham mostrando,avolumando-se mais depressa do que se poderia imaginar,e quando da mudança de poiso houve lugar para uma alteração definitiva. Nem olhar para os antigos companheiros lá das barracas podia,que lhe vinham umas febres insuportáveis.

terça-feira, 15 de dezembro de 2015

SALVA

Ela já ali se encontrava,naquele banco,há um bom bocado,o que não estava nada a agradar-lhe. Para ali sozinha,em terra estranha,à espera de transporte,que não havia meio de aparecer.
Pior ficou quando um homem se lhe veio juntar. Como que a fugir de perigo eminente,chegou-se mais para a ponta,quase em risco de ir parar ao chão. Sabia lá das intenções do sujeito. E depois,ele pusera-se para ali a falar,como já se conhecessem.
Mal o transporte chegou,enfiou-se nele quase voando. Mas o homem entrou também,que ela bem vira. Era domingo de manhã e o autocarro ia quase às moscas. Lá pensou que ficaria mais protegida se arranjasse aliança capaz.
E assim,assentou arraiais ao lado de senhora muito bem composta,que estava muito longe de saber a séria razão de tal preferência. Talvez por isso,acolheu-a com um olhar de alta perplexidade. Com tanto lugar vago,e logo me calhou esta.
Que lhe importava a ela tal estranheza,ou sabe-se lá mais o quê,se era ali que se sentia salva.

SOMBRAS

Tinham uma mesa reservada,uma mesa grande,redonda,a de horizontes mais amplos. Ficava a um canto,junto à única janela,uma janela larga. Dali viam bem o que se passava na rua,frente ao mercado,e dali dominavam toda a vasta sala do restaurante. Se tivessem olhos de olhar para muito lá para trás no tempo,até poderiam ter visto a Mariana Alcoforado,a escrever as "Cartas de amor,enviadas do convento para Paris ao cavaleiro de Chamilly,e que,traduzidas em todas as línguas da Europa,fizeram do nome da pobre freira um dos mais gloriosos na história do amor".
Nunca estavam todos. Iam à vez,como se estivessem de prevenção. As caras eram sérias. Teriam receio de alguma cilada,que aquela era uma terra de muito poucos amigos. O olhar era distante. Também se fugia de os encarar. Eram sombras e como sombras se queriam passar os que com eles casualmente se cruzavam.
Ele era frequentador assíduo,só pelo quarto, da Pensão Coelho,ou Toca do Coelho,como alguns lhe chamavam. Pensão ou Toca,não era a casa,uma casa de luxos. Era a mais baratinha que havia por ali,em pleno centro histórico. Passava por lá gente de toda a espécie,tavez gente de desconfiar. Seria uma casa vigiada.
De qualquer modo,os quartos só permitiam conversas em surdina,pois separava-os,não cortinas,mas tabiques de escassos milímetros. Um espirro ouvia-se bem do outro lado. O ressonar,então,parecia que a madeira o fortificava. Lembrava uma trovoada que se estava abatendo ali mesmo. Para compensar,a casa de banho,a única,era um salão. Ecoavam os sons,quaisquer que eles fossem. Não daria muito trabalho esta Toca.

segunda-feira, 14 de dezembro de 2015

DE UMA CAJADADA

Os materiais carvão mineral,petróleo e gás natural, deixados estar lá na sua condição de fóssil, são garantia,como bem se sabe,por um lado,de muito do oxigénio que por aí anda nos ares,e,por outro, do muito dióxido de carbono que nesses mesmos ares andaria,mas que disso ficou impedido. Trazendo esses fósseis materiais à luz do dia e deles fazendo uso para os combustar,pode dizer-se que,de uma cajadada,mata-se um "coelho",ou seja,o oxigénio,e se liberta outro "coelho",o dióxido de carbono.

GIGANTES DISFARÇADOS

Como se sabe,sabe-se muita coisa. Sabe-se,por exemplo,que é no ar que reside o grande reservatório de azoto,mais concretamente,azoto molecular,que  não é directamente utilizável. Sabe-se,porém,que nos solos há bactérias,umas de vida livre, outras em simbiose com leguminosas e não-leguminosas,que o convertem em azoto amoniacal,e que nos oceanos há também microorganismos que fazem o mesmo. Ora,sabe-se muito bem que sem azoto utilizável  não havia vida. Quer dizer que a vida está pendente de uns gigantes disfarçados de serezinhos muito pequeninos.

COISAS LIGEIRAS

Eram coisas que se diziam,que apareciam em jornais,em letra gorda,não se sabia bem para quê,se só para os venderem,se para mais alguma coisa. E essas coisas pareciam ser ridículas,e essas coisas tinham cara de serem marginais,quer dizer,mem aqueciam,nem arrefeciam,pelo menos parecia.
E essas coisas eram,depois,lidas,tinha de ser,senão não se compravam os jornais. E, depois ainda,essas coisas eram repetidas,em conversas várias,lá em casa,à mesa,nas mesas dos cafés,
nos empregos,nas ruas,por toda a parte. Os ares ficavam saturados com essas coisas ligeiras,ridículas,impróprias,parecia,para serem respiradas por gente que gostaria de fazer coisas com jeito.
Seria isso que se pretendia,seria isso que se desejava? Ora bolas para essas coisas ridículas,
ligeiras,que apareciam em jornais,coisas desmoralizadoras,coisas desmotivadoras,coisas sem jeito nenhum,coisas que não serviam a ninguém,nem mesmo,era de se dizer,a quem as lá punha,essas coisas ridículas,ligeiras

PIORES CARTAS

Parecia andar por ali o diabo à solta. As cenas eram a repetição,a bem dizer,de muitas outras do passado longo,ali ou nos mais variados cantos. Já quase não traziam novidade a quem as estava observando de longe,a coberto. Sim,porque quem nunca sentiu na pele uma coisa daquelas não sabe bem,ou melhor,não sabe mesmo nada do que verdadeiramente acontece em tais infernos.
Afinal,porque se estava violentando aquela gente? É que os campos,com o andar dos tempos, tanto se estremam que,a páginas tantas,dá-se o que era de prever. Tudo aquilo era,de facto,facilmente previsto,mas não dá para parar de ambos os lados.
As coisas acabaram por se recompor,pois não há mal que sempre ature,como lá diz o povo,o bom povo. A paz dava mostras de ter voltado. Tudo ou quase tudo decorria como se nada de grave tivesse acontecido,ainda há pouco,mas isso era só aparente. Algumas cinzas ainda se viam e algumas feridas não haviam meio de sararem totalmente. E,assim,a pouco e pouco,quase sem se dar por isso,as nuvens negras vão-se acumulando,e,a dado momento,sem aviso ,estala de novo a trovoada.
E assim,de trovoada em trovoada,lá vão caminhando,ficando uns para trás antes do tempo. Há quem diga que nestas andanças intermináveis paga o justo pelo pecador, muito em particular as criancinhas e os velhinhos. Mas tirando estas e estes,há quem se atreva a atribuir a culpa a todos,porque os do meio,as maiorias,dum lado e doutro,tendem a comportar-se de igual modo. E o resultado não varia. Vão-se mais depressa os que têm piores cartas neste jogo.

O COSTUME

Já há muito tempo que se não viam. Tinham andado na mesma escola,tinham estado no mesmo emprego,ali lado a lado,pelo que havia coisas em comum,algumas das quais gostariam de ter lembrado. Poderia ter sido isso motivo de alguma conversa,mas não.
Ficaram,é certo,ali retidos uns minutos,mas com coisas banais,daquelas de que se costuma falar,quando não se tem nada para dizer,porque não ocorre,que a memória está gasta,ou simplesmente não se está para perder tempo com coisas que não dão lucro.
Assim,falaram do tempo,da saúde,também de uma ou outra coisa que não havia meio de andar, por culpa de outros,não deles mesmo,claro,que ideia,enfim,o costume. E não havendo mais nada a tratar,lá se despediram,com os desejos de se voltarem a encontrar de novo,para continuar a conversa,que,naquela altura não,que a hora já ia adiantada.
Que vitórias não teriam para contar,ou que um apenas teria,e que gostaria de estar ali a narrá-las,o que não se estaria para ouvir,que não havia com que equilibrar? O melhor,portanto,era terminar,e que passassem lá muito bem,ficaria para outra vez o resto que tinha ficado por dizer.

sábado, 12 de dezembro de 2015

TRANSGÉNICOS NATURAIS

Para quem tenha outras preocupações,e tantas são elas,uma multidão,assim se pode dizer,é de esperar que não saiba que,para além dos transgénicos induzidos,com determinadas finalidades,e que tanta celeuma têm causado,há os transgénicos naturais. Os induzidos não são,pois,almas de outro mundo,mas sim almas de um que já existe.
De resto,uns e outros,não são criações. Criar,só Deus. Já lá dizia Lavoisier,o grande Lavoisier,que na natureza nada se cria,nada se perde,tudo se transforma. Os "tijolos" são sempre os memos. A forma é que vai variando.
Só o que se pede é que os induzidos o sejam com recta intenção,como parece terem sido os que tanta querela têm originado,e se submetam à peneira dos códigos morais vigentes.

PALAVRAS PROIBIDAS

Eram palavras odiadas,riscadas dos dicionários. Eram palavras que lembravam reunião de esforços,conjugação de esforços. Eram palavras proibidas. Era o cada um para seu lado. Eram as visadas baixas,lembrando investidas

ETERNO MOVIMENTO

Parecia que não iria ver nada de importante,ali sentado naquele banco à sombra,uma sombra que lá se ia mantendo unida apsar do tempo estar a avançar a olhos vistos.
Para já,as verdes folhas dos rebentos que ele vira nascer não paravam de alargar,pondo a um canto as que compunham a árvore. Aonde quereriam elas chegar,a quem quereriam imitar? Ah,esta mania de grandezas que até em
folhas mostrava residir.
Depois,um friso de pombos voltara a guarnecer o alto candeeiro. Um tanto afastado,um andaime perdera a cobertura de rede,revelando uma larga parede
pintada de amarelo novo. Pena era que não tivessem escolhido o verde. Um trabalhador que estivera a recompor-se das fadigas em banco irmão,incluindo
sombra,lá se levantara,parecendo que a muito custo,para voltar à sujeição. Carros
recolhiam,ou iam à sua vida,num eterno movimento. No empedrado,as formigas andavam na sua faina,repetindo os mesmos gestos de sempre.
A coroar,lá no alto,duas gaivotas perseguiam-se,com modos de estarem muito zangadas,talvez por não se estarem a entender muito bem.

COMEÇO GLORIOSO

Uma obra que se podia ver,não havia dúvida. Uma obra monumental,a atentar nas casinhas que por lá havia,casinhas humildes,algumas de chão térreo,uma meia dúzia se tanto. Era no fundo de um valezinho apertado,junto ao grande rio. As casinhas não caberiam de contentes,até se sentiriam palácios.
Pois aquilo foi obra malfadada. Pouco aturou,não se sabe porquê. Coisas que acontecem,assim vêem,assim vão. E para ali ficou,decompondo-se,esboroando-se,sem préstimo,como que esquecida.
Afinal,uma mão cheia de promessas,um começo glorioso,como tantos,para nada,pior ainda,uma ruína,a perpetuar um sonho ,bem depressa desfeito,como tantos.

UM AVISO

Os nós de pedra a encimar aquele portão de palácio sugeriam um aviso. Tenham cuidado que dali em diante,vindo da povoação,poderiam encontrar o que não estavam à espera.
Não foi preciso,de facto,andar muito. Aquilo eram mesmo olivais,mas de não muito vulgar densidade. Quase se podia dizer que estavam as árvores em cima umas das outras. Para além disso,o chão era vermelho carregado. Tudo junto fizera que ,na fotografia aérea, não passava aquilo duma mancha sem resolução. Um sarilho para quem estava interessado em pormenores. Dali não se saiu tão cedo.
Lá mais para diante,manchas negras moviam-se. Eram touros,daqueles já crescidos,a fazerem pela vida. Não estariam muito interessados em sair donde estavam,pois comida e bebida não lhes faltavam. Foi só o susto,talvez nem isso. É que uma respeitável barreira estava lá a dificultar-lhes os movimentos.
Mas não muito longe,nuvens carregadas,a cada passada,nasciam do chão. Era o chão a desfazer-se em pó,num pó também vermelho. Vermelho ficava-se. O que iria resultar dali? Nada mais nada menos do que mais touros,esses ainda a crescer. Andavam girando, como os carneiros,na mira de ervinha tenra. Já era teima. Outro sarilho,de que se saiu vivo,graças a umas certas habilidades de quem muito os respeitava

sexta-feira, 11 de dezembro de 2015

RENÚNCIAS

Coitado,do moço,não o deixavam ir ao cinema. Em primeiro lugar,estava o estudo. Pois é,mas, às vezes,quando o apelo era grande,não resistia,pisando o risco. Mas para que serve a cabecinha? Todos sabem que serve para muita coisa. Dizia-se nos velhos tempos que não era só para colocar o chapéu. Ele não tinha chapéu,mas queria,às vezes,quando o apelo era grande,ir ao cinema,sem lá em casa saberem.
E era simples. Entrava em casa,mesmo ali ao lado,antes do fim,quando aquilo estava no melhor da festa,no ponto das grandes decisões. Entrava em casa antes de se ouvir a barulheira das carripanas,sinal de que a função tinha terminado.
E está-se mesmo a ver,ou a ouvir,o que acontecia no dia seguinte. Coitados dos amigos que tinham cartão de livre trânsito. Eram massacrados tempos sem fim,até terem deitado tudo cá para fora. Compreende-se. Ele tinha de ver o filme todo.
Moral da história. As renúncias podem começar muito cedo,numa altura em que ainda os tecidos estão tenros. Felizmente,neste caso,sem importância,porque não vital. Mas quantas renúncias,no dealbar da vida,ou não,por esse mundo além,mundo alheio,cheio de renúncias,que só os que passam por elas as podem classificar. Mas há umas em que todos estarão de acordo. Quando não há que comer.

ATREVIMENTO

Ele há cada um,muito senhor do seu nariz,e supondo ser o seu o melhor nariz do mundo. O moço,porque muito ingénuo,não sabendo isso,supunha lá ele que houvesse narizes assim,foi-lhe mostrar umas imagens por ele obtidas. E esse nariz teve o atrevimento de uma pergunta que não lembraria ao diabo mais diabo. Diga-me lá de onde é que surripiou tão sugestivas imagens? Como que a insinuar ser o moço incapaz de tal feito. O desgosto daquele nariz de não ter sido ele o autor delas. O figurão que ele iria fazer,se tal tivesse acontecido. E estava ali aquele rapazola a dizer que as imagens fora ele que as obtivera. Podia lá ser.

A MINORIA VENCEU

O moço,naquela altura,já era engenheiro. A acrescentar a isto,exibia a fitinha de aspirante a oficial miliciano. Um dia,quem é que o diabo lhe havia de pôr mesmo ali à sua frente? Precisamente,uma antiga namorada,que,entretanto, se casara. Vinha ela com duas meninas,as suas filhas.Passaram a encontrar-se. A terra era pequena e o caso alimentava conversas. Ela,talvez deslumbrada com os atavios do moço,parecia estar disposta a voltar atrás. O marido era um modesto empregado de loja.Os colegas do moço,naturalmemte,também entraram nos mexericos,formando,a propósito,dois partidos. Um, apoiava o idílio,e o outro,em clara minoria,queria acabar com ele,e já.Esgrimiam-se razões. Um homem tinha de aproveitar,caso contrário,o que restaria dele? Porque era um homem,e dadas as circunstâncias,ele devia pôr ponto final. Ela era mãe. Ele estava abusando da sua "superioridade".O moço hesitava,via-se entre dois fogos. Finalmente,decidiu. A minoria venceu.

O MOÇO DA LOJA

O moço estava encostado num carro à beira do passeio. Na sua frente,tinha uma loja,uma loja vazia. À porta da loja,talvez a dona,ou a gerente,esperava que alguém entrasse.O moço entregava um papelinho verde a quem passava,papelinho anunciando os muitos serviços da loja. Entregava e agradecia. A sua cara era triste,muito triste.

NÚMEROS MÉDIOS

É um facto o acelerado desenvolvimento dos últimos tempos,que se acentuou quase a cada momento. Segundo alguns,deve-se isso muito menos a individuais cérebros do que a um coletivo cérebro,produto de uma quebra de fronteiras,de uma larga e fácil troca de ideias,de uma forma de hibridização,quase de sexualismo. E avançam,para o colocarem bem em evidência,com números,números médios,de tudo e de mais alguma coisa,de mortalidade,de ganhos,de nível de vida,de bem estar,números médios,que escondem outros números de arripiar,números que se perpetuam,que são uma mancha muito triste no lindo tapete dos números médios.

quinta-feira, 10 de dezembro de 2015

PALMINHAS DE FAVOR

Eram três os ranchos folclóricos e estava uma multidão a vê-los nas suas atuações,pois era dia de festa rija,dia de procissão,de quilómetros,que o povo fazia parte do cortejo,encerrando-o,como mandava a tradição.
Dos três ranchos,dois eram da casa,por assim dizer,o outro,viera de longe,de muito longe. Como foram diferentes,para certos olhos,as atuações. Os da casa,pareciam agrupamentos de bonecos
de trapos,de gestos às três pancadas. Os de fora, mostraram contenção,disciplina,compostura,
rigor,como de uma só peça.
Pois foram os da casa os mais aplaudidos,com direito,até,a repetições. Os de longe,de muito longe,apenas mereceram umas palminhas fugidias,regateadas,de favor. Gostos não se discutem,como é uso dizer-se,mas,às vezes,apetece.

TUDO INCLUÍDO

Um exagero,uma exorbitância,podes crer. Duzentos euros,por um par de lentes. A vida está que não se pode.
Ah,mas isso é de graça,quinhentos euros por uma semana em Nova Iorque,tudo incluído. É de não pensar duas vezes

DE GRAÇA

Então,mudou de emprego? Não,é que eu tenho dois. Este,é de tarde,o outro,é de manhã. É claro que lá em casa também me espera mais um,mas esse não conta,é de graça.
Tem de ser assim,senão não dava para aquilo de que a gente precisa. E é aproveitar enquanto se é nova,embora eu já não seja assim muito nova.Mas é a vida,o que se há-de fazer? O que peço é que a saúde não me falte.

SÓ COM SETE

Não resta dúvida que isto não vai ser nada fácil. A senhora era muito republicana,mas não se importava nada de ser marquesa, condessa,uma coisa assim,com os respetivos apetrechos,claro. Calhava-lhe mesmo bem,agora que já ia no declinar da vida.
Não havia de calhar,e não só a ela? Ah, este bichinho lá de dentro sempre a sonhar com grandezas. Era o caso,com os devidos descontos,daquela outra senhora que só aceitaria um certo lugar se lhe dessem seis criados,seis. Ela,coitada,com a categoria de servente já há uns bons anos,sem possibilidade de ter um sequer,visto o marido estar também como ela.
A pedir,ou a exigir,ao menos,que seja coisa de jeito. Se não,o que se lhe haveria de chamar? Sim,que ou há moralidade ou comem todos. Sou republicana,pois então,com muita honra e pouco proveito,mas se vir que doutro modo me arranjo melhor não hesitarei. Então,não vai com cinco? Nem pensar nisso. Só com seis. Mas pensando melhor,ficaria mais bem servida com sete. Só com sete,está dito.

UMA SOPINHA

Estavam ali umas boas sombras,e ele sentara-se num dos bancos,ocupando-o quase todo. Teria mais de setenta,e o ar era de muito cansaço. A bengala a que se apoiava estava no chão.
Então, ainda andas por cá?,e mais não disse,que estaria com pressa. Que rico amigo você tem. Sim,conheço-o daí. Não é daqui,pois não? Não,vim de longe,mas abalei de lá há quase trinta anos.
Tirou o boné,e alisou o cabelo. Estaria a compor-se,que se estava a aproximar a hora de ir comer uma sopinha,uma sopinha dos pobres

ERA A VIDA

Coitada da velhota,muito carregada ia ela. É que lá em casa não bebiam água da torneira,e não paravam de comer. E era ela que tinha de ir às compras,que os outros tinham mais em que se entreter. Mas era a vida,o que se havia de fazer?

CIDADÃ DO MUNDO

Alta,magra,pálida,cabeça oxigenada,quase branca,um mostruário de "piercings",nas orelhas,enfeitando a boca e os olhos,quarenta anos confessados. Dirigiu-se a uma mesa,ao fundo da sala,poisou um maço de tabaco,foi ao balcão buscar um café,sentou-se e acendeu um cigarro. A duas mesas de distância,estava uma senhora de idade vetusta e o marido,um velho também. Logo a seguir,junto a uma janela,um cavalheiro,já avô. Estão feitas as apresentações.
O cavalheiro pega no seu cachimbo,acende-o e volta-se ,duas ou três vezes,para melhor observar a cabeça oxigenada. Na última vez,pergunta à senhora de idade vetusta se está a incomodar. Esteja à vontade,que não incomoda nada. Até estou a gostar,pois o seu tabaco é perfumado.
E ali começou uma conversa ,que parecia ser a continuação de muitas outras,tal a naturalidade do diz tu e depois eu. Aproveitando ocasião propícia,a cabeça oxigenada interveio,entrando no jogo. E foi uma bonita troca de impressões a quatro. E foi também uma agradável surpresa,pois o comando das operações passou,com todo o merecimento,a pertencer-lhe.
Pode dizer-se que era uma cidadã do mundo. Só na Suiça estivera quatro saudosos anos,os melhores da sua vida. Aquilo é que é um país. Que civismo,que organização,que asseio. Estava envolvida no movimento de proteção dos animais. Coitados deles. É preciso quem os defenda. Fazem-se hoje tão boas imitações,que é uma dor de alma saber-se que continuam a ser dizimados por causa das suas peles. E assim por diante.
Os empregados estavam de boca aberta,surpresos e suspensos. Tinham de passar a tratá-la com mais consideração. O casal de velhos teve de abandonar a cena,pois se estava fazendo tarde,e os outros dois lá continuaram na vonversa.

MUDANÇA DE ARES

O senhor não devia estar bem. Arregalava muito os olhos e respirava fundo,como fazendo um grande esforço,quando queria intervir. Mas isso foi só nos primeiros dias. A mudança de ares ajudara-o a recompor-se. Quase não parecia o mesmo. Ficou mais calmo e deixou os exageros de opinião do início.
Pelo que revelara,a sua vida não fora nada tranquila,caraterizando-a a instabilidade dos lugares por onde tinha passado,mas sempre em cima da onda. O que o teria levado a este saltitar? Talvez um procedimento análogo ao que exibira nos primeiros dias,de alguma,para não dizer muita, intolerância.Tê-lo-iam salvado as suas muitas capacidades. Seria de grande competência e isso permitir-lhe-ia a sua permanência por algum tempo. Passado este,as vontades das duas partes concordariam em que uma mudança de ares lhe faria bem,como estava,alás,acontecendo ali.
Interessava-se muito pelas riquezas dos locais que frequentava. Passava-as a pente fino,não fosse escapar algum pormenor importante. A sua natureza nervosa não suportava a monotonia,a rotina. Isso explicaria o seu circuito profissional e estaria de acordo,também,com as suas longas viagens,tal como a última,da ordem de milhares de quilómetros. Viria daqui uma das razões,porventura,a de mais peso,para aqueles olhares muito alargados,dos muitos horizontes vistos e que quereria envolver num só.

quarta-feira, 9 de dezembro de 2015

MILAGRE EM MILÃO

Um simples,a quem deram uma varinha mágica para satisfazer carenciados, livra-se dela, ao ver que todos queriam sempre mais um.

O MILAGRE

Coitada da senhora,fora ludibriada. Recebera uma pequena fortuna,mas ela necessitava de uma maior. É que a permanência no lar em que se encontrava,ou em qualquer outro,não estava segura. Só tendo muito dinheiro,e aquele ainda não chegava.
Mas era simples,dissera-lhe alguém. Aquela quantia a render alto juro faria o milagre. Bastava seguir os seus conselhos. Ficasse descansada. Esse alguém era simpática,dava mostras de ser muito sua amiga,e ela acreditou.
Passou-lhe toda a sua riqueza. Em troca,ficou com um documento,muito bem redigido,com todos os pormenores em casos destes. E esse alguém sumira-se,sem deixar rasto.
A cara da senhora era um misto de tristeza e de comprometimento. Ela sabia que o rendimento prometido era exagerado.Fora,afinal,vítima de si mesmo.
Mas que outra saída teria ela? É que talvez a esperasse um fim muito triste.

SOBRE OS POLIFENÓIS

Como é sabido,os polifenóis são substâncias que têm na sua estrutura dois ou mais anéis benzénicos. Constituem uma numerosa família em que se incluem taninos,lenhinas e flavonóides. Fazem parte dos flavonóides as antocianinas,pigmentos azuis,roxos e vermelhos,e as antoxantinas,pigmentos amarelos.
Como fenóis que são,cedem, fàcilmente,hidrogénio,pelo que são redutores,ou seja,antioxidantes.Esta qualidade valoriza,assim, os alimentos e bebidas que os contenham,como frutas,vegetais,chocolate,chá e vinho tinto.
Devido ao seu carácter ácido,ainda que fraco,a sua presença na matéria orgânica,sobretudo,no humus,a fração mais resistente á degradação microbiológica,
dá aos solos maior capacidade de retenção de nutrientes.

ESTRATÉGIA

Era rico,muito rico,mas quem o não conhecesse,parecer-lhe-ia ir ali um pobrezinho,daqueles de pedir. Não passava isso,porém,de uma estratégia. Quem se atreveria a bater a uma porta daquelas?

CORES

Nem parecia a mesma de há pouco. A tristeza daqueles cansados olhos,a tristeza. Muito só,muito branca,muito lá com ela,ali estava,ligeiramente curvada,ali estava à espera,numa espera talvez de um fim próximo.
E bastou uma ligeira atenção,uma coisa de nada,para muita coisa nela mudar. Não,não é preciso,posso esperar,ela que tanto já tinha esperado. Até vieram cores àquela cara pergaminhada.

TÚNEIS

Que rica ideia aquela,a de pôr ali aqueles túneis,com a luz bem à frente deles. E eram as vacas que se vinham sentar à mesa,pois a comida,a silagem,estava mesmo a jeito de a abocar.
As poupanças que se faziam. Nada de silos em altura,apenas uma cobertura de plástico,e,claro,os tratamentos devidos. Quando chegassem ao fim de um túnel,era só mudar para o outro ao lado.

LEVEM TUDO

Aquilo é que eram uns tempos,que uns quererão esquecer,e outros lembrar com saudades. Tinha um pai de família a dispensa cheia,e a arca também. Mas poderia ser sol de pouca dura,como,por vezes,acontecia.
É que lhe podia invadir a casa,sem aviso prévio,um servidor de quem ali mandava mais. E lá ficava a dispensa vazia,e a arca também. E o motivo era um muito sério,pois o inimigo vinha aí a caminho.
Como é que haveria de ficar um pai de família? Muito agradecido,ainda,pois então,que o inimigo precisava de ser derrotado. Para isso, o exército que o enfrentasse não podia passar fome,está-se mesmo a ver porquê. Levem,levem tudo,e que a sorte nos favoreça.

quarta-feira, 2 de dezembro de 2015

UM SANTO HOMEM

Ao tempo que se não viam. E ali estava,naquela tarde e naquele jardim cheio de flores e de sombras,o velho sacerdote. Um santo homem. Engordara,talvez demasiado. Andara por aí,por esse vasto mundo,onde estivessem emigrantes. E ali ficaram a recordar velhos tempos. Lembrava-se,daquela vez,lá naquela terra,quando lhe pediram para benzer uma taberna? E o senhor,como sempre,não disse que não. Tão contente que o homem ficou. Dali em diante,ainda venderia mais copos.
Despediram-se. Pôs-lhe a mão na cabeça,como se fizesse a um filho a quem se quer dar proteção. Nunca o fizera.Parecia um gesto transcendente,talvez um último gesto. E foi,de facto,o derradeiro. Aquele coração trabalhara muito.
Fora um encontro para nunca mais esquecer. Um encontro naquele banco rodeado de árvores frondosas e de silêncio,apenas cortado pela conversa dos pássaros. Era capaz de se entender com eles,à semelhança do santo de Assis.

SOBRE A FIXAÇÃO DO AZOTO DO AR

A subida de preços dos adubos azotados,bem como a elevada energia para os sintetizar,apontam cada vez mais para o aproveitamento crescente de azoto do ar por via bacteriana. Para isso, há necessidade de conhecer as estirpes de bactérias envolvidas,a sua capacidade fixadora,os fatores intervenientes,bióticos ou não,as relações entre bactérias e hospedeiros. Dos fatores intervenientes,têm merecido aprofundada atenção a acidez do solo e os diversos nutrientes,particularmente, o fósforo,o enxofre,o cálcio,o magnésio,o boro e o molibdénio. Porque a relação bactéria/hospedeiro é biunívoca,o estudo da influência dos nutrientes tem de respeitar os dois componentes do simbionte. Qualquer ação que tenda a incrementar o fotossintato determinará um maior rendimento da fixação . A fixação inicia-se,como se sabe, por uma redução do azoto,formando-se amoníaco,que posteriormente é convertido em compostos orgânicos azotados de complexidade variável. Para ser reutilizado,o azoto dos resíduos das plantas tem de ser mineralizado,à semelhança do azoto da restante matéria orgânica do solo. Da taxa de decomposição do azoto orgânico, depende o grau de fertilização azotada a efetuar. Daí, a importância de um adequado método laboratorial de determinação da disponibilidade do azoto orgânico. A escolha dum método não é facil. Com efeito,a taxa de mineralização depende de diversos fatores,estando também influenciada pelo fenómeno inverso,a imobilização de azoto por via microbiana.

POPULAÇÃO E BENS ALIMENTARES

O crescente aumento da população implica um crescente aumento da necessidade de bens alimentares. A agricultura tem de estar,pois,preparada para esta realidade. Assim,entre outros aspetos,há que estar atento à salinização das áreas regadas,grandes fontes de alimentos,há que procurar mais altas produtividades,recorrendo,sobretudo,a cultivares mais produtivas,há que usar cada vez menos bens de consumo para biocombustíveis,há que cuidar mais dos solos,procurando não degradá-los,há que explorar a colaboração de bactérias e fungos,na perspetiva da fixação de azoto atmosférico e da mobilização dos nutrientes,em especial,do fósforo.

terça-feira, 1 de dezembro de 2015

NETWORK STRUCTURE AND INFLUENCE OF THE CLIMATE CHANGE COUNTER-MOVEMENT

Climate change

2015 HUNGER GLOBAL INDEX

Hunger

A PATH FOR CLIMATE CHANGE,BEYOND PARIS

Climate change

A PROPÓSITO DE BIOCOMBUSTÍVEIS

Como se sabe,da combustão de bioetanol e de biodiesel liberta-se anidrido carbónico,
à semelhança do que sucede com os combustíveis fósseis. Acontece,porém,que os produtos de onde eles derivam,milho,soja,ou outro qualquer da mesma natureza,e materiais ricos em celulose,dariam lugar também a anidrido carbónico,mais tarde,ou mais cedo,caso fossem utilizados na alimentação humana ou animal,via respiração ou decomposição microbiana,aeróbia,ou anaeróbia,de resíduos.
Num caso,como noutro,trata-se,afinal,de repor anidrido carbónico que fora consumido na fotossíntese. Ao contrário,no caso dos combustíveis fósseis,há só libertação. Assim,do ponto de vista da concentração do anidrido carbónico da atmosfera,há vantagem em usar-se biocombustíveis,e tanto mais,quanto menos combustíveis fósseis se gastarem no processamento e transporte,e quanto menos novas terras forem usadas na sua obtenção.
É claro que o desvio de bens alimentares,como o milho e a soja,para produção de biocombustíveis,não é pacífica. Acentuando-se a sua procura,os preços estão sujeitos a subirem. Seria melhor,pois,o uso de materiais celulósicos,ou de outra biomassa não alimentar,como algas.

FIXAÇÃO E LIBERTAÇÃO DE DIÓXIDO DE CARBONO

Como se sabe,pela fotossíntese, as plantas portadoras de clorofila fixam dióxido de carbono atmosférico,uma parte da qual regressa à atmosfera por via da respiração. A outra parte,maior ou menor,fica retida na forma das mais diversas substâncias orgânicas nos tecidos das plantas. Essa parte ir-se-á libertando na medida da sua decomposição microbiológica,resistindo menos as plantas de vida curta,como as ervinhas,mas muito mais,pela sua longevidade,as árvores. A campeã dessa resistência é a muita matéria orgânica que se foi depositando,ao longo de milhões de anos,nos fundos dos oceanos,e sofrendo sucessivas alterações,transformando-se em carvão mineral,petróleo e gás natural. A resistência acaba,tem o seu triste fim,quando esses materiais fósseis são combustados.