quarta-feira, 12 de agosto de 2015
MUITO ORGULHO NISSO
O mundo estava sem conserto era a conclusão a que se chegara depois de uma conversa casual com uma simples. Tinha a senhora sessenta e sete anos confessados. Estava ali à espera de uma amiga,e enquanto ela não vinha lá foi despejando o saco. Para já,podia ter declarado muito menos,que estava ali uma jovem ainda cheia de ideias,ideias bem teimosas,que elas custam muito a ganhar. Coitada dela,que nascera lá para a serra,comera o pão que o diabo amaçara,passara as passas do Algarve,ainda que não tivesse lá ido,fizera vezes sem conta das tripas coração,não estudara por razões mais que óbvias. Mas não estava triste por tudo isto,não senhor,sobretudo por causa dessa coisa de não ter estudos. Tinha até muito orgulho nisso,muita honra por não ter estudado. E aqui pusera-se muito nervosa,muito acalorada,de cara muito rosada. Teria sido uma sorte a amiga aproximar-se,senão teria havido desgraça. Mas antes disso, o que ela dissera era bem uma linda amostra do que por aí vai,do que ouvira,do que se dizia,sim, que era isso a pura verdade,e quem dissesse o contrário estivera a dormir,ou ,pior ainda,era dos tais que andam feitos lá com essa gente apontada a dedo,uns demónios. Está o mundo sem conserto,ainda que com muita honra,com muito orgulho,sim, que a mim não me enganam,que eu bem os conheço. Eu sei o que eles querem,mas a mim não me enganam.
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