quinta-feira, 31 de agosto de 2017

GENT UNIVERSITY - BELGIUM

Effect of liming on phosphorus availability in some soils [Portugal].  [1989] Goncalves M.G. Gama M.V. da Gent Univ. (Belgium). Faculteit Landbouwkundige en Toegepaste Biologische Wetenschappen. Estacao Agronomica Nacional, Oeiras (Portugal)

UNIVERSIDAD AUTONOMA DE NUEVO LEON,MONTERREY - MÉXICO

UNIVERSIDAD AUTONOMA DE NUEVO LEON,MONTERREY - MÉXICO A probable case of sulphur deficiency in wheat cropped in pots.  [1977] Gama M.V. Estacao Agronomica Nacional, Oeiras (Portugal) Universidad Autonoma de Nuevo Leon, Monterrey (Mexico). Facultad de Agronomia.

OUTRAS CONTAS

Como os tempos mudavam. Onde é que já se vira aquilo? Um anão a bater o pé a um gigante? Uma pulga a fazer pouco de um elefante? O que eram as coisas. Nada se podia dar como certo,era bem verdade. Julgavam que era chegar ali e já estava? Não,aquilo deixara de ser da Joana. Isso era dantes,de resto,como tinha acontecido sempre. Os tempos,os ventos,tinham mudado,e muito. Quem passava a mandar ali era com outras contas,não como vinha acontecendo,já não se lembravam desde quando,desde muito lá para trás. Era o que faltava. Os tempos,os ventos,tinham mudado.

OUTRO MUNDO

Na NATUREZA, nada se perde,nada se cria,TUDO se transforma. É a FORMA,em constante mudança,a REALIDADE. Todo o mundo é composto de mudança.É assim,não há nada fazer. Porque assim é? É perguntar a QUEM o fez,faz,O do FIAT. E quem tal contrarie está remando contra a maré,acabando,mais tarde,ou mais cedo,por se esgotar,numa luta sem glória. E quem tal contrarie parece estar apostado em não sobreviver,preferindo a morte a tal sorte. Em vez de contribuir para a mudança,alterando-a naquilo que pudesse,deixa-se ficar à margem dela,excluindo-se,teimosamente,como se a outro mundo pertencesse.

O SEU PERIQUITO

Tão feliz que a senhora estava. Não fora uma moeda que ela tinha perdido e que acabara por encontrar,mas muito mais,fora o seu periquito,o seu único companheiro de há longos quatorze anos que voltara para a gaiola. Julgara-o perdido para sempre. A porta da prisão abrira-se e o periquito aproveitara para ir dar uma volta de quase um dia. Tão ralada que ela ficara. Por onde andaria o seu amigo,com quem ela conversava tanto? As voltas que ela dera à casa. Não escapou um canto. Espreitou por debaixo da cama mais de uma vez,revolveu os armários,e o seu periquito não dava sinal de si. Desceu e subiu a escada de serviço do prédio,e foi o mesmo que nada. Nem sombras do periquito. Bateu à porta dos vizinhos em vão. Afinal,o seu periquito não tinha saído da casa. Fora dar com ele debaixo da mesa da cozinha. Tão feliz que ela estava,até pareceu ter remoçado. O que seria dela sem o seu companheiro e amigo de tantos anos? Mais valeria a morte.

FLOR NA LAPELA

Dois amigos encontraram-se, num encontro aí de uma meia hora, pois tinham alguma coisa para contar, já que se não viam há uns bons tempos. Estavam razoavelmente bem de saúde, graves problemas não os apoquentava, pelo que falaram de coisas sem importância de maior,de coisas triviais. Um falou do tempo, do que acabara de ler,ou de ouvir,coisas por assim dizer do lado de fora. O outro,não,falou de coisas bem lá de dentro,de dentro dele,pois então, que doutras não cuidava. Falou de si,mas dum si longínquo,dum si que ele não havia meio de esquecer,dum si vitorioso. Não calculas,aquilo foi um achado,e ainda estou para saber como tal coisa me aconteceu,mas ainda bem que aconteceu comigo,que com outro não tinha graça nenhuma. Era uma história já conhecida do outro,e de outros mais,também,certamente,que ele não podia deixar de contar,que era assim que ele se sentia feliz,uma felicidade só lá muito lá dele,os outros que a procurassem,talvez viessem a dar com ela. Enfim,assim ele vivia,nada o apoquentando, embalado por um si vitorioso,que o revestia,um si feliz,que ele bem mostrava na sua carita rosada,nos seus olhinhos muito vivos,num sorriso permanente,como uma flor na lapela.

quarta-feira, 30 de agosto de 2017

CICLO ATIVO DO CARBONO

Como se sabe,florestar,ou conservar a floresta que já existe,são dois dos meios de manter o carbono,por algum tempo,fora do seu ciclo ativo,reduzindo-se,assim, o teor de CO2 da atmosfera. Não admira,pois,que se tivesse concluído em certo estudo que uma agricultura altamente produtiva,na última parte do século XX,tivesse evitado desflorestação,ou seja,tivesse diminuído a libertação de CO2

APARATO BELICOSO

É uso dizer quem vai à luta dá e leva. Acontece que há uns que só estão dispostos a dar,exibindo sempre um aparato belicoso.

AO FIM

Quando se está disposto a fazer ultrapassagens de qualquer maneira,parece ter-se pressa de chegar ao fim.

UM MODO DE ESTAR

Poupar. Ajudar. Não estar sempre a pensar no mesmo. Observar. Trabalhar. Compadecer-se.

NO SEU CANTINHO

Não sabia para onde havia de ir,o que o trazia muito ralado. É que estar muito tempo no mesmo cantinho não deve fazer bem à saúde. Já andara por vários cantos,mas não fora feliz. Eram todos de fugir,e quanto mais depressa ,melhor,que os males pegavam-se. Para aqueles males não havia ainda vacinas eficazes,constando, até ,que seria muito difícil inventá-las. E assim,apsar da ralação quanto à saúde,lá continuava no seu cantinho. Mas,de vez em quando,ainda que o não desejasse,dava-se com ele a lembrar um ou outro canto por onde andara. E a lembrar-se,também,dos motivos que o levaram a deles debandar. Desses cantos,havia meia dúzia que nunca mais esqueceria,pois tinham deixado marcas para ficar. Um,era uma caixinha de surpresas,em particular nas veredas nobres. Eram alçapões por todo o lado,pelo que os olhos deviam ir bem abertos. Pode dizer-se que esse tinha um gémeo. Não lhe ficava atrás. Ao virar de cada esquina,lá se abria um buraco. Não se sabe como não fora parar ao hospital. Mas havia outro que pedia meças a estes dois. É que as armadilhas não tinham aspecto disso,estavam bem disfarçadas. De uma não se livrara e tivera de baixar à enfermaria. Um outro ,ainda, batia-os a todos. Era um campeão. Ria-se dos hospitais e das enfermarias. Isso eram cuidados a mais e uma sangria de dinheiro. Se não tivesse saído de lá a correr ,só o teriam encontrado na vala comum. Os dois restantes eram muito parecidos. As ruas eram frequentadas por gente estranha,de difícil classificação. Talvez fossem parentes de fantasmas. Como quer que fosse,aquilo era gente que metia medo. Sendo assim,não tendo exagerado ou fantasiado,o que muitas vezes sucede,por variadíssimas razões,o homem parecia ter razão. O melhor fora mesmo ficar lá no seu cantinho. Não estaria livre,porém,de alçapões,buracos,valas comuns,fantasmas,porque nunca se sabe para o que se está guardado.

NAQUELE SILÊNCIO

Fora um encontro inesperado. Uma porta estava aberta e lá dentro um velho trabalhava. Os seus ollhos podiam avistar dali meio mundo. Pois desse vasto mundo, era ele o último na sua arte. A forja crepitava e lá fora uma roda esperava. Aro que ele ajustasse era aro para sempre. As encomendas não choviam,naquela altura,como era de imaginar,mas isso pouco lhe importaria. Naquela atalaia,naquele ermo,tinha o universo a seus pés. Ninguém o incomodava e ele retribuía de igual modo. Não parecia que os anos lhe pesassem. Talvez tivesse desejado acabar assim. Um dia,naquela rarefacção,naquele silêncio,iria por esses ares além,certamente,feliz ,por ter sido o que mais resistira.

terça-feira, 29 de agosto de 2017

SEM AVISO PRÉVIO

Era uma vasta área,quase plana. Quer dizer,a água que lá caísse,só podia sair dali,a bem dizer,na vertical. E assim,quando chovia demais,as plantas que por lá faziam pela vida,uma boa parte das vezes,searas de trigo,viam-se e desejavam-se para respirar,mostrando cara muito amarelinha.Em terreno lavrado,todo o cuidado era pouco, pois,sem aviso prévio,havia o risco de se ir por ali abaixo.

CULPADO

Para o que lhe havia de dar. Um casal de cegos aproximava-se,e a voz dele ouvia-se. Uma esmolinha por favor,uma esmolinha por favor. Primeiro,pensou em mudar de passeio,depois,ao passar por eles,quase nem os olhou. Teria sido para se furtar ao desembolso? Talvez um pouco,ainda que pouco se esvaziasse. Então,do que mais seria?

NAQUELE SILÊNCIO

Fora um encontro inesperado. Uma porta estava aberta e lá dentro um velho trabalhava. Os seus ollhos podiam avistar dali meio mundo. Pois desse vasto mundo, era ele o último na sua arte. A forja crepitava e lá fora uma roda esperava. Aro que ele ajustasse era aro para sempre. As encomendas não choviam,naquela altura,como era de imaginar,mas isso pouco lhe importaria. Naquela atalaia,naquele ermo,tinha o universo a seus pés. Ninguém o incomodava e ele retribuía de igual modo. Não parecia que os anos lhe pesassem. Talvez tivesse desejado acabar assim. Um dia,naquela rarefacção,naquele silêncio,iria por esses ares além,certamente,feliz ,por ter sido o que mais resistira.

UM REGALO

Era como que um outro "monte" aquele maneirinho cemitério,ali perdido no meio de montados e mais montados. Também tinha merecido cara lavada. Parecia,até, que a cal,azul e branca,fora lá posta de véspera. Assim se pintavam todos os "montes" ali em redor. E também estava lá num alto,mais próximo do céu,que ele ali representava. Mas era mais feliz que os "montes" seus vizinhos,pelo menos naquela tarde de abrasar. É que lhe batia uma aragem leve,fresquinha,vinda de um tapete de água,que ali perto se estendia,quase à sua medida,de maneirinho que também era. Muito raramente as suas portas se abririam. Por isso,como que para ali estava abandonado. Naquela altura,podia dizer-se,apenas as cigarras,formigas e outros que tais,tirando um ou outro nómada,lhe faziam companhia. Viveria conformado o maneirinho cemitério. Não se esqueciam dele,pois,de vez em a quando,lá o vinham tratar,cuidando da sua roupa. Depois,tinha ali aquele tapete,quase a molhar-lhe os pés,um regalo em dias de sol de torrar,como naquela tarde.

segunda-feira, 28 de agosto de 2017

DEFICIÊNCIA DE FERRO EM PLANTAS

Como se sabe,é frequente a deficiência de ferro em plantas,quando os solos são alcalinos,como os calcários. Resulta isso, do facto do ferro se encontrar muito pouco solúvel,ou seja,muito pouco disponível. Nem todas as plantas,e, também, nem todos os solos,porém,se comportam de igual maneira. Uma das razões parece dizer respeito à acção de fungos.É que a maior parte dos fungos sintetizam sideróforos,ou seja, substâncias que formam complexos solúveis com o ferro,de alta estabilidade. Se esses fungos estabelecerem com as raizes das plantas associações simbióticas,a sua nutrição férrica estará,obviamente,ainda mais facilitada.

O MANDO

Até ali, tinha sido só um a mandar,passando o mando de pais para filhos. Depois,passara o mando para quem o povo escolhesse. Para isso,tinha o povo de sair de casa,tinha de se incomodar. Ora o povo,depois de tanto tempo a ser mandado,foi-se a pouco e pouco cansando de sair de casa. E a certa altura,parecia ter-se voltado aos tempos antigos. Eles que lá se entendessem,que era disso,do mando, é que eles gostavam.

UM INVENTÁRIO

O homem das sete léguas. A mulher dos esconsos de portas de prédios. A velhota entre dois carros,em berma de rua movimentada,aliviando-se. O dos abraços a senhoras,nas ruas. A passageira,de pernas enganchadas,de uma traquitana já muito gasta. O que tinha como vizinhos gatos sem eira nem beira. Os de à volta cá te espero. O tribuno orando aos pombos. O rapaz da trança até à cintura,e da casa abandonada,com os seus dois grandes cães de estimação. Os de vinganças. O que visitava meticulosamente contentores de lixo,com uma vassoura na mão,não fosse sujar a rua. O eterno batedor em portas certas,que a vida tem de ser suportada. O homem das dez léguas,e muitas mais,que, um dia,ainda iria ao fim do mundo. Os velhinhos imitando remadores de galés,das fitas,antigas,ou modernas. Os videirinhos. O andarilho,de botas de gigante,que tratava todos por doutores,burro é que ele não era. O casal que inventara um novo calorífero,o seu amigo cão. A senhora que falava pelos cotovelos com quem passava. A velhota que parecia voar. O janota colector de beatas. O parado em qualquer sítio,à espera de alguém,que já tinha partido para sempre. O do chapéu às três pancados,especado,suspenso de moças que ele perto via. Os telemóveis sempre engatilhados. Os cigarros em bocas de donzelas e de senhoras. Os condutores de automóveis,ao telefone. O filho, já homem,na peugada da mãe velhinha. Os dos amigos são para as ocasiões. Os que dizem coisas pela primeira vez. Os do só eu é que sei,é que vi,mais ninguém. Os do dantes é que era bom. Os do ai se eu mandasse,ia tudo raso. Os das casas que estão para ali. Os espertos. Os da poeira para os olhos. Os troca-tintas. Os pobrezinhos. Os pobrezinhos que sonham,que querem ser ricos,também têm direito,porque não? Os ricos,que não querem ser pobrezinhos,também têm direito,porque não? ...

A VISITA

Fora visitá-la. Era uma senhora já de muita idade,acamada há largos meses. Devia-lhe muito,uma dívida muito antiga. Tinha sido,pode dizer-se,uma sua segunda mãe. Mas isso já lá ia há um ror de tempo,talvez ela nem já se lembrasse. Mas mesmo assim,nunca ele se tinha esquecido. Há coisas que nunca esquecem,ou não deviam ser esquecidas. O que é que lhe havia de dizer? Não queria que aquele encontro,que podia ser o último,estivesse povoado de tristezas. Recordar-lhe momentos de festa que ela proporcionara seria uma boa saída. E foi o que fez. Via-se que ela ficara um tanto admirada. Não esperaria. Mas bem depresssa aceitou,com satisfação,aquela franqueza,aquela fraqueza,colaborando e recordando factos que se supunha estarem esquecidos. O prazer que aquilo lhe deu,até parece ter ganho novo alento. Estava ali um que lhe mostrava reconhecimento,ao contrário de outros,que fugiam de o manifestar. Com isto,ter-lhe-ia dado mais uma justificação para a sua longa vida,que não teria sido em vão. Prestes a encetar a tal viagem,estava ali aquele a lembrar-lhe que tinha sido amiga. Podia morrer descansada. Morreu,de facto,pouco depois. Parecia ter demorado,à espera daquela visita.

VONTADE

O rapaz prometia,assim lhes tinha dito o mestre-escola lá da aldeia. O que é que os pais haviam de fazer? Pois se o filho podia vir a ser mais do que eles ,então era pôr mãos à obra. O comboio passava-lhe mesmo ali ao pé da porta. Era só levantar de madrugada e ir apanhá-lo. Muita gente acordava com as estrelas para ir para as fazendas ou para as fábricas. Ele ia para o liceu. Sempre parecia ser melhor. A viagem era de graça por o pai trabalhar na Companhia. O almoço e a merenda iam na cesta. Apenas ele tinha de estudar. E aqui residia a dificuldade. Cada professor supunha ser a sua disciplina a mais importante,pelo que a matéria a decorar ou a compreeeder formava uma montanha, As viagens eram também longas e barulhentas. Chegava a dormir ns aulas,coitado. Mas a vontade era muita. As notas nunca andaram lá muito por cima,mas chegaram para não ficar para trás. Se tivesse tido vida folgada,outro galo teria cantado. Mas não foi caso único naquela altura. Os irmãos trabalhavam no campo,à jorna. Parecia ser este igualmente o seu destino. Estava escrito,porém,que não seria assim. Alguém resolveu investir nele,tinha o moço já quinze anos. Isso não o perturbou. Em três anos fez os sete da conta. Também lhe vinha de casa o farnel,que ele ia buscar todos os sábados a um sítio certo. Muito custa a vida para alguns,sobretudo quando se metem em cavalarias altas.

domingo, 27 de agosto de 2017

PREOCUPAÇÕES

Como é sabido,o óxido nitroso derivado da redução do ião nitrato,qualquer que seja a sua origem, tem causado preocupações. Na sequência do processo redutivo,o óxido nitroso não é,porém, o produto final,mas sim o amoníaco,antecedido do azoto molecular. Quer dizer,que na desnitrificação,incluída no ciclo do azoto,o óxido nitroso pode vir a dar lugar,pelo menos,a uma forma inerte.

COOPERAÇÃO

O que ele mostrava ser amigo dos pobrezinhos. É que,por tudo,e por nada,não se cansava de os lembrar a outros. Constava,porém,não ser ele um benemérito por aí além,ainda que o pudese ser. Estaria a contar com larga cooperação,para a qual muito trabalhava.

IMANENTES

O moço era um simples,um confiado,de boa fé. Mas não sabia que trazia consigo outros moços,de outras caras. Não sabia nada disto,e ia partir para a vida. Não sabia que iria ser assaltado por lobos,postados a cada esquina. Não sabia que devia saber defender-se deles e ser raposa e até lobo,também,recorrendo aos companheiros que,com ele,vinham. Não sabia que a outros moços, iguaizinhos a ele,já lhes tinha acontecido o mesmo,nos assaltos,e nas defesas. Que alguns dos lobos,teriam sido já raposas,e até confiados,como ele era ainda. Não sabia,assim,que devia ser tolerante,compreensivo,em suma,estar preparado para tudo. Porque,em boa verdade,ele era igualzinho a todos os outros moços e não moços. Teria de ser confiado,raposa,lobo,consoante o momento,melhor dito,a circunstância. A circunstância. O que ela encerra,um monte de surpresas. Em última a análise,a vida a isso obrigava. Era o princípio da conservação do indivíduo,a montante do da espécie,princípios imanentes,talvez mais aquele do que este.

NATUREZA SELVAGEM

Porque ficara impressionado o homem com aqueles registos? Talvez tivesse sido a sucessão de montes pintados de cores violáceas. Mas também o lajedo rochoso,o verde dos prados,o mato florido,a promessa de silêncio. E algumas vezes as gentes. Rudes,talhadas a machado,como o passador.Era este a imagem de um sobrevivente de muitas calamidades e contratempos. Porventura, o modelo de todos os que conseguem,apsar de tantos reveses,ficar à tona. Parece,por vezes,ir submergir para sempre. Mas com um golpe de rins,um salto mais atrevido,uma marcha mais veloz,lá surge ele com maior determinação para viver.Era uma irradiação da natureza selvagem que o rodeava,de onde ele brotara,como que espontaneamente. Muito aprendera com ela. Vira nascer e morrer. Vira armadilhas e cercos. E vira que nem todos se deixaram prender. Certas vezes,fora a sorte que o lograra,outras,a vontade de continuar,de teimar,como ele.Como que fora levado a isso. Aquela beleza rude,dominante,quer ser vista,apreciada,gozada. E só aceita gente forte,corajosa,destemida. É capaz de aborrecer os fracos,os desinteressados,os apáticos,os abúlicos.

VALOR ACRESCENTADO

Ali não tinha chegado a guerra,mas da guerra não se livraram de todo. A comida minguara. E,assim,nasceram as senhas de racionamento. Quem se habituara a papar o que tinha na vontade,as senhas eram de menos. Para aqueles que sempre tinham apertado o cinto,as senhas eram de mais. E estes,alguns pelo menos,vá de as vender com valor acrescentado. Abrira-se a estes uma novidade. É que nunca lhes teria passado pela cabeça virem,um dia,a ser negociantes. Havia,porém,uma outra forma de abastecimento,reservada só a amigos dos produtores. É que estes não vendiam tudo,ficando com as suas reservas. Era,no entanto,uma saída de alto risco,pois a fiscalização não brincava em serviço. E assim,só os muito habilidosos conseguiam escapar à sua apertada malha. Aos outros,retilham-lhes,pelo menos,as mercadorias. Mas não passava tudo isto de uma questão de comida,que se podia remediar,melhor ou pior. Não uma questão de vida,que essa,uma vez perdida,é sem remédio.

sábado, 26 de agosto de 2017

CLIMATE CHANGE

Climate change | Environment | The Guardian https://www.theguardian.com/environment/climate-change Traduzir esta página 25 August 2017 ... Climate Consensus - the 97% New study finds that climate change costs will hit Trump country .... About 19,711 results for Climate change. ‎World has three years left to ... · ‎Health · ‎Record-breaking climate ... · ‎I blame men

SOBRE A BATATA DOCE

Como muitos sabem,e muitos não devem saber,a batata doce pouco tem a ver com a batata,sendo uma,a batata,do género Solanum,da família Solanaceae,e a outra,a batata doce,do género Ipomoea,da família Convolvulaceae. Uma,a batata,é um caule subterrâneo,a outra,a batata doce,é uma raíz. É cultivada há milhares de anos,sendo originária,muito provavelmente,da América Central. O seu valor alimentar reside,sobretudo,nos teores de amido,açúcar e vitamina A. É na Ásia,em especial,na China, que mais se cultiva,para consumo humano e animal. Utiliza-se,também,muito em África,mas aqui,quase só para consumo humano. Apesar das diferenças,o Centro Internacional da Batata,com sede no Peru,inclui nas suas atividades a batata doce.

A SORTE DOS BURROS

A sorte dos burros. Estavam em vias de desaparecer,que os tempos já não estavam para burrices,e,de repente,veio-se a descobrir que o leite que os alimentava era assim como o melhor leite do mundo. Grandes burros eram eles,pois,maiores do que burros não eram. O que eram,pois,as coisas. E entraram numa era que nenhum se lembrava de ter vivido,mesmo naqueles velhos tempos em que os burrinhos eram considerados quase da família. E foi um multiplicar de burros por tudo quanto era sítio,mesmo sítios onde nunca tinham entrado,por serem o que eram,por serem burros,que eles não podiam deixar de ser o que eram,nem eles,nem outros quaisquer,por mais burrices deixassem de fazer. O que eram,pois,as coisas. De repente,deixaram de ser,pode dizer-se,burros,para ser outra coisa,ainda que burros continuassem a ser,em boa verdade,pois não se podia deixar de ser o que se era.

IR DESCANSAR

Era aquela uma terra de ninguém,uma espécie de baldio,quer dizer,qualquer um podia lá entrar,colher dela o que entendesse,não exagerando,claro,mas não demorar-se. Tratava-se de um costume muito antigo,sempre respeitado. Aconteceu,um dia,vir instalar-se nela alguém que não estava para esses ajustes. Achava que aquela terra era mais dele,pelo que podia por lá permanecer. Os outros,só a correr. Mas isto de a correr já eles todos sabiam e faziam,escusava de o estar a lembrar. Quanto o ser mais dele,queriam ouvir as razões. Ele deu-as,pensando ter convencimento geral. Quase acertou. É que um não esteve para as aceitar e passou também a frequentá-la mais vezes. Era para ter havido guerra. Não houve,porque,de maneira inesperada,o opositor,já um tanto velho,decidiu ir descansar.

RECOMPENSA

Quem é bem dotado,ou está disso convencido,já tem aí grande parte da recompensa a que se julga com direito. É como ter nascido em berço de oiro,pelo que não precisaria de mais oiro ter.

CANTO DESOLADO

Aquilo não era um deserto ,mas para lá caminhava. Não se via um riacho e muito menos um rio. As colinas sucediam-se,revestidas de vegetação rasteira e seca. Rocha granítica aflorava por toda a parte. Os carneiros que ali e acolá pastavam mostravam-se tristes por tão grande desolação. Assim andariam animais e gentes naqueles recuados tempos de aventuras sem conta. A fome seria sua companheira fiel ,irmanando-os. Lá ao longe,via-se um povoação,parda como tudo o resto. Apenas uma ou outra torre a denunciava. Lá dentro,em larga praça,dominava a estátua,em bronze,de um cavaleiro na sua montada. Fora assim,do alto do seu poder,que ele conquistara terras longínquas. Onde teria ele ido buscar tamanha energia? Ali perdido,naquele canto desolado do mundo,como lhe teria brotado aquela vontade forte que tanto obstáculo tivera de vencer? A magreza dos proventos seus ter-lhe ia dado a resistência das pedras que atapetavam o chão que magramente o sustentara. Teria sido ele quase uma pedra,volumosa como algumas à vista,que,rolando,esmagara,na sua passagem,tudo quanto lhe aparecera pela frente.

FESTIVAIS

Os festivais iam recomeçar. O local é,sem dúvida,atraente,pois um rio,com azenhas e praias,corre perto. Em vasto terreiro,levantara-se um enorme palco. A coisa prometia,como já acontecera. Uma velhota ia a passar. Então,o que nos diz dos ajuntamentos que aqui se têm dado? Não me fale nisso,desabafou ela,toda escandalizada. É uma pouca vergonha. Estão a ver ali aqueles milharais? Pois dormiam por lá. Foi uma estragação. Não os queremos cá mais. Uma mulher nova,com o filhito ao colo,era da mesma opinião.Não sei quem é que os autorizou. Coisas de gente que não é de cá e que se põe para aí a mandar que é um desatino. Não consultam o povo e depois têm-no à perna. Mas a terra ficou mais conhecida,muitas pessoas falam agora dela,o que não sucedia antes. Que nos importa a nós isso? Melhor seria que não fosse assim. E conhecida porquê? Por aqueles atrevimentos? Pois dispensamo-los. Isto é terra de gente simples e séria. Perguntem aí se gostariam de vê-los cá de novo. Tenho a certeza de que muito poucos concordariam. Se não podem passar sem eles,que os façam lá nas suas terras. Se para aí vierem outra vez,contrariando a vontade da maioria,é capaz de haver sarrabulho. Tão certo como eu me chamar Joaquina. Eu sei de uns tantos que estão muito dispostos a isso. O povo,quando lhe chega a mostarda ao nariz,pode ir às do cabo. Eu cá avisava-os. O melhor é esquecerem-se de uma vez .

sexta-feira, 25 de agosto de 2017

QUE SAUDADES

Pois ela tinha muito para contar. Durante anos,acreditara no destino,que fora assim que a sua mãe lhe ensinara. Mas,depois de muito pensar,chegara à conclusão de que não devia ser bem assim. Ainda que houvesse uma certa sina,com força de vontade tudo se podia alterar. E o caso dela era bem uma prova disso. Divorciara-se e estivera para morrer,ou melhor,entrara em forte depressão. Mas, com muito querer ,vencera-a. Naquela altura,sentia-se dona de si. Havia,porém,algumas didiculdades. Não tinha emprego e ficara com uma filha. O pai atrasava-se ,às vezes ,com a prestação. Estava ali a ver se ele já fizera o depósito em falta,que bem precisada se encontrava. A filha andava com muitas exigências. O que lhe valia era a mãe,coitada,que vivia de uma boa pensão. Passava a maior parte do tempo com ela,embora tivesse a sua casinha. Estava também atravessando um mau bocado. O prédio ia ser demolido e queriam pô-la num quarto com uma vizinha ou então davam-lhe dinheiro. Não sabia o que fazer.Vinha mesmo a calhar o fim do mundo. Aproximava-se o ano dois mil. Uma vizinha,muito crente, afiançara-lhe que o fim chegaria por fases. Por onde iria começar era a sua grande preocupação. Tudo isto a fizera desinteressar de muitas coisas,como de eleições. Nunca votara. Eram todos os mesmos. Só votaria num que a empregasse. Dantes não havia nada disto. Que saudades. Ela estava ainda nova e podia ser que as viesse a matar.

VIRAGEM HISTÓRICA

Não passavam aquelas rixas de umas brincadeiras. Pulavam,gritavam,gesticulavam,arreganhavam os dentes,arranhanhavam-se e pouco mais. Acabavam os contendores de ocasião por voltarem aos seus cantos,aos seus territórios,esfalfados,de cabeça baixa. Andavam por lá, mais uns tempos,a remoer. Para a próxima vez,a vitória estaria certa. A próxima vez chegava e a sensaboria repetia-se. Era uma grande e dupla tristeza,sem remédio à vista. Certo dia,um dia,aparentemente,como muitos outros do seu longo passado,aconteceu viragem histórica. Coisa do acaso,ou não,sabe-se lá. Andava ele,talvez um chefe,talvez um simples peão,por aqui,por ali,a fazer pela vida,no rasto de algum bichinho que lhe matasse a fome,quando dá com um monte de ossos de um pobre animal,que morrera de velho. Não seria aquilo novidade,mas ,desta vez,deu-lhe para tocar ali,tocar acolá,assim como a divertir-se. E de repente,pegou num fémur,ou numa tíbia,tanto faz,um osso comprido,enfim. Com ele na mão,talvez a direita,levantou o peludo braço,bem acima da sua cabeça desgrenhada. Assim esteve uns segundos,suspenso. Depois,como movido por uma ideia nova,descarregou-o,com força,no monte dos ossos. Estilhaços voaram à sua volta,como numa explosão. E uma nova ideia brotou. Parecia estar encontrado o remédio para aquela tristeza em que se andara envolvido tempos largos. No próximo recontro,o remédio foi usado. Que rico remédio. O inimigo,coitado dele,quase não deu luta. Fugiu,espavorido,mas disposto a desforra. Teria aprendido a lição. Para a vez seguinte se veria. Viria também brandindo ossos,ossos compridos,que era coisa que não faltaria por lá. Só que não lhes teria ocorrido usá-los. Não eram para ali uns atrasados empedernidos.

O GÁS DOS PÂNTANOS

Anda muita gente preocupada com o metano,por ser ele,como bem se sabe,um tremendo gás de efeito de estufa. Trata-se de um hidrocarboneto,o benjamim de família numerosa,o muito conhecido gás natural,o gás dos pântanos. Para além das suas muitas jazidas,e dos pântanos,isto é,das "wetlands" desse vasto mundo,não têm conta as suas naturais fontes,como sejam o estômago dos ruminantes,os sedimentos das barragens,as térmitas,os arrozais,as lixeiras,o "permafrost" das regiões polares,e outras mais,até as plantas. Na sua gestação,ainda que não totalmente,estão,como é sabido,bactérias anaeróbias. Como para viverem precisam de oxigénio, vão-no buscar onde o há,a matéria orgânica vária,tendo artes para alterar a valência do carbono a seu belo prazer,do que resulta,ente outras coisas,o metano. Um prodígio,há que concordar.

TER PENA DELES

Eram malabaristas da palavra,tendo armazéns delas. Procuravam enredar,confundir,deitando poeira para os olhos,quer dizer,debitando caudais delas. Mestres no sofisma,deleitavam-se com as suas conclusões enganosas. Assim é que se sentiam bem. Embalados pelas suas aparentes vitórias,que só o eram para alguns,pavoneavam-se como triunfadores,chegando a convencer-se de que tinham saído vencedores. A paciência que era preciso ter com eles,sabendo-se que não os demoviam,pois eram assim, tinham nascido assim,gostavam de ser assim,morreriam assim,pelo que não havia nada a fazer,a não ser perdoar-lhes,e ter pena deles,que eles não sabiam o mal que a eles próprios infligiam

A INSTRUÇÃO

Não terá limites o ter. Havendo ensejos para mais ter,será um teimoso acumular. Para o reprimir,muito poderá fazer a instrução,alargando o leque dos interesses. Sobejará menos tempo para ter.

TER É TARDAR

Antes de adormecer,passavam em revista,demoradamente, as coisas possuídas,no temor de que alguma delas tivesse levado sumiço. Mal acordavam,iam logo a correr fazer o mesmo,pois,sabia-se lá o que lhes poderia ter acontecido. Era,assim,um desassossego ,tanto à noite,como de manhã,e,muito provavelmente,durante o dia,e mesmo quando dormiam. Talvez por isso,havia quem não quisesse ter,de maneira a poder levar uma vida descansada. "Ter é tardar".

quinta-feira, 24 de agosto de 2017

SEM TOCAREM NUMA PALHA

Ah,ele era isso? Queria dizer se ele tivesse duas galinhas,uma ficava para ele,sim senhor,mas a outra tinha de a dar,porque havia gente que nem uma tinha. Se era isso assim,então que passassem por lá muito bem,que em negócios daqueles não estava interessado. Tinha duas galinhas,era certo,mas trabalhara muito para as ter,os outros que nem uma tinham tivessem feito o mesmo. Os espertos,a quererem ter coisas sem fazer por isso,sem tocarem numa palha. Os espertos.

CALCÁRIO

Estavam preocupados,ou assim parecia,com a qualidade da água que saía das torneiras,pelo que se dispunham a alertar os utentes. Para isso,faziam um contacto telefónico prévio,a preparar uma visita-inquérito,prestando,desde logo,algumas informações. Sabe,a água deve ter calcário. Desculpe,mas isso é que não pode ter,porque é uma rocha. O que quer dizer é que deve ter cálcio,ou melhor,o ião cálcio. Sim,é isso. E por ali se ficou.

O COSTUME

Por cerca de duas horas,as ruas da cidade despovoaram-se. Parecia estar-se à espera de uma coisa de outro mundo,talvez transcendente.Seguiu-se,logo depois,a vida costumeira. Afinal,acontecera o costume,nada mais.

EMCANTAMENTO

Estava um fim de tarde ameno de Setembro. Pequenos bandos de gaivotas dispersavam-se no areal extenso. Um ou outro casal de velhos passeava no empedrado fronteiro. O bulício de Agosto era já uma lembrança. Apetecia ficar ali,a sentir a aragem levemente fresca e a respirar o ar fortemente iodado. Ao longe,surge uma figura magra,sobraçando um livro,de mãos nos bolsos. Aproxima-se serenamente,pausadamente. No rosto,esboça-se um sorriso,talvez de encantamento. Era uma figura pública,simpática,respeitada. Dirige-se à esplanada. Senta-se e pousa o livro na mesa. Fica de perfil. Os seus olhos fitam-se no horizonte. Quase não se mexia. O livro jazia esquecido,na sua frente. Que pensamentos ocupariam aquela cabeça?,pródiga em opiniões,carregadas de saber,despidas de qualquer assomo de autoridade. Era aquele,afinal,o cenário que mais se quadrava com ele. A tranquilidade envolvente,o quase silêncio do céu e da terra,o esperguiçar manso das ondas,o azul em frente e acima. E ele ali sentado,sem dialogar,mas comunicando secretamente

VINTE E UM ANOS

A moça sorria,encantada com a sua juventude. Que idade tem ela? Vinte e um,respondeu a mãe. Quem nos dera a nós,considerou a outra. E o tom vinha carregado de tristeza. Ainda era solteira com esses anos,e o tom continuou igual,talvez até mais triste. Saudades? Arrependimento? A vida não lhe teria concretizado os sonhos. Os filhos,se calhar também os netos. Só canseiras. Se eu soubesse,quereriam transmitir os olhos magoados,a cara emagrecida,a cor pálida. Estaria convencida de que seria muito diferente? Igual,não desejaria,certamente,que fosse. Ilusões de quem não pára de sonhar. Mas o seu ar era de quem acabaria por trilhar as mesmas veredas, nem melhores,nem piores. As mesmas. Não havia para onde fugir. A casa lá está,e se for uma como deve ser andará com muita sorte. Os filhos aparecerão,com o cortejo obrigatório de gestos e passos de trabalho. As aflições com a saúde deles,o sustento,os estudos,de acordo com as posses,ou sabe-se lá mais de quê,permitirem. E depois,os namoros,as companhias,os empregos,talvez o casamento. Onde se há-de ir arranjar o dinheiro? Um bom padrinho e uma boa madrinha é que vinham mesmo a calhar. Sempre podiam acudir em alturas decisivas,no encarreirar,que isto está difícil. E a seguir,mais um neto,ou dois,ou mais,que nunca se sabe. Não sei para onde me hei-de voltar. Todos precisam de mim e eu que não posso. Ando para aqui cheinha de achaques e nem tempo tenho para ir ao médico. As horas que lá perderia e eu que não posso faltar aqui e ali,senão como é que eles se arranjariam? Não têm recursos para amas e muito menos para creches. Deus me vá dando saúde,para bem deles,que eu para mim já nada espero. O sorriso não abandonara a cara da moça. Tinha o futuro à sua frente e vê-lo-ia cor de rosa. Para quê pensar em precupações? Guardava-as para mais tarde. Quando viessem,logo se veria.

quarta-feira, 23 de agosto de 2017

QUE COISA BOA

Não cabia em si,de contente que estava. Via-se-lhe bem na cara,aberta num sorriso de deleite. Ser possuidora daquele brinquedo,ela que tão poucos,e muito modestos,teria tido quando era uma criança. Estar ali a andar e ao mesmo tempo poder conversar com este e com aquele. Parecia estar a chupar um caramelo gostoso,enquanto se ia dirigindo, pausadamente, para o trabalho. Que coisa boa,que coisa boa,não se cansava ela de repetir. Nunca teria imaginado que,um dia,isso pudesse acontecer. Ali,em plena rua,chegavam-lhe notícias lá da sua terra distante. Que coisa boa. Era caso para agradecer,não era? Concerteza,mas a quem? Não me pode dizer? Se morasse aqui perto,não me importava de lhe ir lá bater à porta. Estar aqui a ouvir a minha gente. Que coisa boa. Nunca pensara nisso do agradecimento. Comprara aquele lindo brinquedo e,pronto,estava o assunto arrumado. Tinha mais em que pensar,ora se tinha. Mas uma vez que alguém o lembrara,achava isso mais do que justo. Já se distanciara e ainda se podia ouvi-la. Que coisa boa,que coisa boa.

A VASSOURA

Coitadas daquelas oliveiras. Metiam dó,de tristes que ficavam. Parecia vê-las chorar,que aquilo não era fruto a cair,mas lágrimas que elas soltavam. E desfaziam-se elas,teimosamente,em tanta promessa. Mas uma doença maldita não as largava. Ainda esperaram que lhes acudissem,mas muito se enganaram. Para ali têm estado,pois, entregues à sua sorte,anos e anos. E o resultado de tanta comida e de tanta bebida,que o chão é úbere e a água abunda,é sempre o mesmo. Depois,os odores à sua volta,na fase terminal,são de fugir. Nem os pássaros,nem as formigas se atrevem a andar por ali. Uma desolação. De vez em quando,vem a vassoura e é o lixo o destino de toda aquela azáfama,que aquelas flores e aqueles frutos representam muito trabalho,que não se viu,mas que foi feito,disso não se pode duvidar. Razão forte têm aquelas oliveiras,portanto,para chorar. Mereciam melhor sorte,elas que são o símbolo de coisa muito séria.

terça-feira, 22 de agosto de 2017

A PASSEAR

Aquilo era como preso por ter cão e preso por não o ter. Se aparecia coisa escrita,não valia nada. Se não aparecia,é porque andara por lá a passear.

A UMA MESA

Uma dúzia de homens,às vezes,duas ou três dúzias ,conforme muita coisa,a uma mesa,ao ar mais ou menos livre. O que faziam? Jogavam,pois claro,ou assistiam,que os assentos não abundavam. Jogavam. Assistiam.

POBRE DO SÓDIO

Pobre do sódio,parece um enjeitado. Havendo caminho livre,vai todo parar ao mar. É que a terra não o segura,ao contrário do que acontece com o potássio,o seu companheiro de algumas andanças.

DÚVIDA EXISTENCIAL

Naquele início de tarde,mais de uma dúzia de pedras da calçada já se não viam,por obra de um aterro que dava mostras de não se ficar por ali. E tudo isso pelo trabalho de uma numerosa e diligente família de formiguinhas,que estava construindo as suas instalações. Apenas fora deixado livre um corredor,via de saída e entrada no palácio. Em toda aquela azáfama,havia,porém,uma coisa que destoava. É que,de vez em quando,uma ou outra obreira,em vez de descarregar o que lhe competia lá longe,fazia-o mesmo ali no corredor,ou por estar cansada,ou para se poupar. Aconteceria isso quando não havia testemunhas. Quem lhes teria ensinado um tal proceder? Até formiguinhas se encostavam?De quem copiariam elas tal proceder ou estariam elas a dar maus exemplos? Dúvida imensa,dúvida existencial.

UM PASSARINHO

Pode dizer-se que não era ele de nenhuma terra,mas também não era um cidadão do mundo,nem lhe acudira uma tal classificação. Fora como que encontrado,e isso não escondia ele,até parece que disso se orgulhava. Era como tivesse sido de espontânea geração. Tudo quanto conseguira a ele o devia. E sentia-se livre como um passarinho,pousando onde lhe apetecesse,desde que riscos não corresse.

VIDA MUITO ENCALACRADA

Como é que os dois se haviam de entender se um só pensava na sua vida,uma vida muito encalacrada,que a via sem saída? Dizia este que os autocarros que ele reparava,pois era um operário,podia ele ajudá-los a construir,pois sabia-se fazê-los como os lá de fora. Mas eu sei de quem é a culpa. É dessa gente lá de cima e a desses países do petróleo. Mas essses não fabricam autocarros. Isso é a sua opinião. Fique-se com ela,que eu fico com a minha. E dali não saía,embora para o fim já não estivesse com tantas certezas. E para não dar o braço a torcer,saiu-se com mais outra razão,daquelas de arrasar. E sabe de quem é mais a culpa? O outro disse que não. Pois fique sabendo que enquanto isto estiver assim,eu receber só mais dois contos e os engenheiros quarenta,não se endireita. Era isso que lhe enchia a cabeça,coitado. Não pensava em mais nada. Tudo o resto eram tretas. Mas apsar de tudo,apsar,talvez,até,de incluir também o outro no grupo daqueles que não deixavam que isto se endireitasse,não era homem de rancores,pelo que não se importou de perder um bocado do seu pouco tempo livre para o ajudar.

MUITO DIFERENTE

Trabalhar para ser o primeiro,é uma coisa. Ser o primeiro porque trabalhou,é outra coisa muito diferente.

A MINHA LOJA

Então,perdeste-te? E,depois,assim tão pequenino,não tens medo? Nem uma coisa,nem outra,foi o que se ouviu. Vês ali aquela casa,à esquina? É a minha loja. Tem lá coisas muito bonitas. Queres lá ir? Vem,que eu levo-te,e pegou-lhe na mão. Vem,e puxou. Olha,hoje não posso,estou com pressa. Pode ser que noutro dia calhe. E lá foi a correr para a sua loja,ali mesmo à esquina

EMPATAR E INCOMODAR

Quando alguém,naquela terra perdida,muito para além das fronteiras,de onde muito raramente vinham notícias,se ia desta para melhor,era isso um grande alívio,embora pudesse parecer o contrário,o que se compreendia muito bem. Para o,ou a, que partia,por se ver livre,de vez,de uma aventura desastrada,para os,ou as, que ainda lá se demoravam,não se sabia quanto tempo aida,anos,dias,horas,minutos,um suspiro,por se livrarem,de vez também,de mais um,ou uma,que já estava há muito não só a empatar,como, o que era bem pior,a incomodar. Tudo isso,e mais alguma coisa,por ser toda aquela gente que por lá se arrastava muito dada ao teatro.

FUNDO SUSPIRO

A menina da caixa dera um fundo suspiro. Então,está cansadinha? Doem-me as costas

COMER E CHORAR POR MAIS

O que por ali havia ,de confortar os olhos e a alma. Parque frondoso,recantos misteriosos,a portentosa catedral,igrejas várias,ruas de remota traça,largos,onde, à noite,o silêncio falava. Pois nada disto o atraíra. Não fora para isto que ele pusera as já cansadas pernas ao caminho. Seria muito melhor ter ficado lá em casa,a ver televisão,sobretudo,os jogos de futebol,e,claro,as telenovelas dos seus encantos. Queria ele lá saber de coisas que não entravam nas conversas com os amigos? E,além disso,coisas velhas,a cheirar a mofo.E apontava. Não vê ali aquele tapete de musgo? O que o movera,o que o fazia andar alvoroçado,logo que chegara,quase não sabendo para onde se voltar,fora, simplesmente,a comidinha. Por uma questão de delicadeza tinha-se de o ouvir. Não calcula,aquilo é de comer e de chorar por mais. O que eu tenho perdido. Em cada refeição,uma surpresa. Depois,ele tinha feito uma prévia investigação,visto ser muito exigente. Não abancava em qualquer mesa. E ssim permaneceu,nunca se deixando levar por algumas lembranças. Os outros que se divertissem lá à sua maneira. Ele tinha a dele,o que muito o alegrava.

FALTA ESSENCIAL

Morreu o burrinho do tio João. Uma morte rápida,em poucos dias,quase uma morte súbita. Deixou de comer,deixou de beber. E,depois,os olhos dele,de tristes,pareciam chorar. Mas afinal,que morte o levou, assim tão de repente? Morreu de saudades do tio João. Lá deve ter pensado que o tio João se desgostara dele,que o abandonara,pois deixara de lhe aparecer. Ele que se mostrara sempre tão seu amigo,de tal maneira que durante muitos anos não se largaram. Ele trasportava o tio João às courelas,ele ajudava-o a cultivá-las. O tio João não o abandonara,só que se esqueceram de o informar. Adoecera, repentinamente, de doença ruim, e tivera de ir para o hospital. Aqui esteve uns dias,indo,depois,para uma casa amiga,onde passará,talvez,o resto dos seus dias. O burrinho não ficou desamparado. Tratavam dele,como se fosse o tio João. Por esse lado, não tinha de se queixar. Só que não era o tio João,como ele estava acostumado. Só que deixara de o ver,de estar com ele. E isso fazer-lhe-ia muita falta,uma falta essencial. E porque era assim,seria melhor partir. E foi o que aconteceu.

AS COSTAS

Quando pensam que estão a perder,lá no seu reto entendimento,dão o encontro por terminado,alegando que os esperam lá em casa,ou então,o que é pior,disparam,quer dizer,vão-se embora,dando,desabridamente,as costas.

RECADOS

Era ele um homem que não soubera dar conta de um recado. Mais concretamente,desbaratara as coisas da sua própria casa. Pois fora ele o escolhido para dar conta de um recado ainda maior,que eram as coisas de muitas casas. Lá teriam pensado que ele aprendera muito com o recado da sua própria casa.

É NOSSSO DEVER

Eu bem os oiço,mas se quer que lhe diga não entendo quase nada do que eles dizem. A culpa é toda deles,que não sabem falar com o povo. Mas vou votar,sim senhor,que não sou para aqui um labrego. E todas as vezes, pois então,a não ser que estivesse muito doente,sem me poder mexer. É nosso dever. Boto lá a cruzinha no sítio certo,que isso sei eu ver muito bem,escusam de me vir ensinar. Daquela boca era para ter saído outra coisa,que ele tinha todo o aspeto de a vida não lhe ter corrido nada mal. Mas era assim,já não havia nada a fazer.

EM SENTIDO

Sabe com quem está a falar? Ora vamos lá a põr-se em sentido.

NA ORDEM

Sentem-se sempre como se estivessem em casa sua,ou em terreno seu. E se alguém se atrever a disso duvidar,têm artes para o pôr na ordem. Sabe,porventura,com quem está a falar?

TOLERAR

Pensar nos outros. Falar com toda a gente. Empregar palavras simples,que todos entendam. Confiar. Tolerar. Ter esperança.

SABIAM FALAR

Uma sumidade tinha vindo lá da sua terra distante dizer de sua justiça. Na sala,não cabia uma mosca,que uma coisa daquelas era para aproveitar. Falou de coisas já velhas,e de outras que estavam a dar os primeiros passos. Era nestas em que estava mais interessado,e esperava encontrar ali ajuda. Da assistência,meia dúzia falou também,mas do que ele esperava,nem uma palavrinha. Falaram muito,até mais que a sumidade. Quiseram mostrar apenas que sabiam falar. A sumidade agradeceu,sugerindo que agradeceria mais se o tivessem ajudado.

OS DA TERRA

Coitado dele. É que lá no buraco onde morava, só poderia falar com algum ratinho,ou alguma baratinha. Assim,era visto a procurar falar com algum desconhecido,em paragens de autocarros, que os da terra mandavam-no passear.

segunda-feira, 21 de agosto de 2017

BEBIDAS ALCOÓLICAS

Na decomposição de matéria orgânica,há lugar para a produção de etanol,que é,como se sabe,volátil. Assim,só por engenho do homem há bebidas alcoólicas. A natureza seria incapaz de tal habilidade.

GENTE MUITO VIAJADA

Só ali,naquela terra,é que se via uma coisa daquelas,uma vergonha. E não se cansavam de o repetir. Quer dizer,era gente muito viajada. Tinham andado por lá, demoradamente,convivendo muito. Podiam,assim,dizer de sua justiça,fazer comparações,opinar,classificar.

SER VENENO

Há gente que vem ao mundo para o envenenar. Que diabo de sina a dessa gente. Ser veneno.

UM FRASE

A FRASE É ESTA:A DIFICULADE DE DESPEDIR DESINCENTIVA O EMPREGO SEM PRAZO. É pouco,ou nada,para dela alguém se ocupar. Mas talvez se possa dizer que quem a proferiu,a escreveu,é realista. Sim,parece que a realidade é esta,uma muito triste realidade,tem de se concordar. Mas dizê-la ou proferi-la,custar-lhe-ia muito. Era caso para chorar,sobretudo,se fosse economista. E sou eu economista e pouco posso fazer. Uma tristeza. É a crise,a crise perpétua,desde,talvez,sempre. E só há que geri-la. Uma fatalidade. Mas bolas para o gerir. É que,em pano de fundo,ou mesmo ali,na primeira linha,estão espectros,o desemprego,a precaridade,as dores de barriga e de coração,o choro dos filhos,o ralhar da mulher,talvez,até,o ela sair de casa,e ele que se desenrasque. Bonito,não é? Tantas filosofias,tantas economias,tantas palavras bonitas,tantas frases catitas,para isto. A DIFICULDADE DE DESPEDIR DESINCENTIVA O EMPREGO SEM PRAZO. Ora bolas.

OUTROS JOGOS

O St. James Park,onde o Newcastle United pontificava,ficava ali a dois passos. Pois foi como não lá estivesse. Imperdoável. Havia outros jogos,pelo que não deu para la ir espreitar.

UMA PRISÃO

Gaiolas,grandes ou pequemas,para passarinhos e quejandos,enchiam a ampla montra e as prateleiras. Gente parava,deleitando-se com a variedade do exposto. Gente que parecia prezar,acima de tudo,a sua liberdade,sem se importar com a clausura que aquilo significava,sem pensar,talvez, que não passava também de gente aprisionada,e ,como tal,estivesse a ser vista por outra gente lá dos infinitos espaços,que,por sua vez,sabendo,ou não,imitava todos os demais. Era,afinal,tudo uma prisão.

GENTE

Com tanto nome,que é o mesmo que dizer,tanta gente,e haver ruas sem nome de gente. Parece isso mesmo de gente,que nunca mais quer lembrar certa gente.

PEDRINHAS DE CALÇADA

De que país seriam aqueles moços? Eram todos altos,fortes,de cabelo quase rente,de cor alourada. Talvez fossem desportistas. De onde tinham surgido,parecia isso indicar. Vinham caminhando ao longo de uma rua,sobre o passeio. Não teriam muita pressa,pois as passadas eram lentas. O ar deles era de curiosidade e estavam gostando muito do que viam. A rua,era uma rua humilde,de humilde bairro. Tudo para eles era novidade e não se cansavam de manifestar a sua admiração. Nice,very nice. Era tudo nice. A montra da padaria,a loja dos frangos,a drogaria,a sapataria. Mas o que mais os encantava era o empedrado do passeio,aquelas pedrinhas de calçada. De que país atrasado teriam vindo,para assim ficarem extasiados perante tais maravilhas? Houve alguém que não resistiu a perguntar-lhes. Tinham vindo de Chicago. Que pena não poderem levar aquele empedrado tão giro. Very nice.

SANTOS DA CASA

Não,não tinha qualquer satisfação por ser vizinho de um grande escritor,de um grande poeta. Antes,pelo contrário. Porque seria? De uma pessoa tão prendada. Talvez por se sentir lá muito em cima,quem sabe? Livra. E quase saiu dali a correr. Só porque se tinha estado a louvar um fulano que ele detestava,não se sabia bem porquê. Coisas muito misteriosas. É bem certo que santos da casa não fazem milagres. Olhe que assim ia ter uma maior colheita por hectare? O que é isso? Que palavra tão esquisita. Estou aqui tão consolado. Vê lá tu que fulano esteve a exaltar um trabalho em que eu tive uma humilde participação. Esse fulano sempre foi muito exagerado. Eram dois "amigos". Um deles tinha uma filha médica. Coitada,dizia o outro. Felizmemte que nenhuma das minhas teve essa triste lembrança. Na net só lá está o que se lá põe. Assim como que a apoucar. Ele não estava lá. Eu? Navegar? Meu riquinho tempo. Tenho mais que fazer. Só obrigado,por decreto. Tenho muito com que me entreter com os meus botões. Os meus parabéns. Tem mesmo agora ao pé da porta uma galeria,legado de um grande galerista. Sim,já ouvi falar nisso. Qualquer dia vou lá. Tenho andado muito ocupado.Onde já lá iam os setenta. Então,já visitou ali a biblioteca? Olhe que há lá jornais,livros,revistas,videos,computadores. Não tenho tido tempo. Esta vida não nos deixa tempos livres. Sabe,o café,as esquinas,os amigos,as cartas,o falar deste e daquele. Umas pestes. Olha la,tu que és um intelectual,vê lá como achas essas historiazinhas. Dias depois. Olha,tenho um amigo que é dono de um jornal lá na aldeia. Vou ver se ele as mete lá. Mas já ficas sabendo que nem um tostão. Mais uns dias depois. Tenho a dar-te uma triste notícia. A folhinha faliu. Venho pedir-lhe um conselho. Acabei de me especializar e não sei o que faça. Se fico aqui ou se vou lá para a terra. Não caia numa coisa dessas. Olhe que aquilo lá é onde há maior número de invejosos por metro quadrado.

DONDE VIERA

Casara tarde e não tivera filhos. E no final da vida, mostrara um sério interesse em assuntos de hereditariedade,muito em especial no seu lado químico,particularmente,nas bases orgânicas. Seria o donde viera a sua grande preocupação.

MAUS JUÍZES

Parecia que tinham andado todos na mesma escola,dando as notícias como quem recitava uma lição bem estudada. O ar era de participação e não de distanciamento,vindo carregado de certezas. Quando das entrevistas,eram inquisitoriais. Um tanto desabridos,exerciam ali o papel de juízes,de maus juízes. Nunca se satisfaziam. Insinuavam,ficando sempre o novelo mais emaranhado. Despediam-se,no final,triunfantes,como quem tinha cumprido uma missão. Com artistas assim,não se sabia como havia quem se sujeitasse àqueles vexames,àqueles julgamentos na praça pública,com tudo ali às claras. E os ouvintes,convencidos,transmitiam a quem lá não tinha estado as verdades ali ditas.

MISSÃO

Lá se iam entretendo c0mo podiam,uns,muito convencidos de que tinham uma missão,outros, nem por isso,e ainda outros não sabiam que bicho esse era.

DA SUA LAVRA

Eram quatro a opinar. Três,lá disseram da sua justiça,com simplicidade,como a dar a sua humilde contribuição para uma obra que se afigurava de alta complexidade. Chegou a vez de se ouvir o outro,que se guardara para o fim. Podia ter feito o ponto da situação,à maneira de um professor,que talvez fosse ou desejasse ser,e acrescentar mais alguma coisa da sua ciência. Mas não.Tudo quanto escutara soara-lle a velho. O cerne da questão não tinha sido beliscado,nem de longe,nem de perto. Era isto mais uma confirmaçãode que só ele via claro,de que só dele viria a resposta certa. Outro iluminado. Estaria convencido de que tinha uma missão a cumprir e de que a sua mensagem era única,inteiramente da sua lavra.

MEIA DÚZIA DE FILMES DE UMA VIDA

A ESTRADA A humildade,a inocência,daquela Gelsomina(Giulietta Masina). O CARTEIRO DE PABLO NERUDA O carteiro que empregava metáforas(Mario Ruoppolo-Massimo Troisi),sem o saber. UMA HISTÓRIA SIMPLES(THE STRAIGHT STORY) Um velho que se faz à estrada com um trator tão velho como ele,para um abraço fraternal de reconciliação. MILAGRE EM MILÃO Um simples,a quem deram uma varinha mágica para satisfazer carenciados, livra-se dela, ao ver que todos queriam sempre mais um. PORTAS DO INFERNO Alguém,que perdera a confiança no Homem,vem a recuperá-la,porque um pobre,com uma carrada de filhos,espontaneamente dá um passo para ficar com uma criança que fora abandonada. UM REI DO ORIENTE Partiu com a bolsa cheia de ofertas para o Menino. No caminho, encontrou muita miséria, e lá se esvaziou a bolsa. Os últimos a serem contemplados foram uns escravos,que ele libertou. Pois estes escravos,já libertos,maltrataram-no, porque tinham fome. Contavam que o rei lhes valesse mais uma vez.

CONSELHOS DO VENTO NORTE

Liberte-se de si. Corte as amarras,desprenda-se. Olhe em frente,não mais para trás. Esqueça o umbigo. Pense no outro,ao menos. Não tem asas,é certo,mas pode ser que chegue a voar. Quem sabe?Tente,talvez aconteça,que há para aí energias escondidas,ou já nem tanto. O Universo expande-se. Olhe que possível é não estar cá amanhã. E era uma pena não ter experimentado. Tente,ao menos,uma vez. Olhe que quem aconselha por bem,bem lhe quer.

O ALVO

Como não tinha nada de especial em que se reparasse,sempre que saía de casa,acompanhava-o o seu muito especial cão,que era o alvo de toda a gente.

TUDO A PERDER

Do que ele se lembrara não lembraria ao diabo,que a sabe toda. Que diabo de ideia a dele. Aquilo fora mesmo coisa de quem já estava por tudo,de tão sem saber o que mais fazer,sobretudo,o que mais dizer. É que uma tal lembrança era uma que poderia deitar tudo a perder,sem remédio,pois havia um outro que a podia aproveitar,sem,ao menos,agradecer. Teria sido um tiro no pé,um serviço prestado ao inimigo. Ficaria,assim,tudo na mesma,ou seja o que o tinha posto naquele estado de não saber já o que mais fazer. Ou pior. Havia,de facto,esse fatal risco. E se tal sucedesse era isso muito capaz de o levar a ter alguma coisa má. Não estaria livre disso,que,as coisas más,às vezes,acontecem,quando menos se espera.

MÃOS LARGAS

Pão é saúde. A embalagem é gratuita. Dois registos sujeitos a reparos. Quem desconheceria a bondade do pão? Lembrá-lo,parecia ser ideia de quem não tinha em grande conta a ciência dos outros. Depois,era de ficar desconfiado de quem se mostrava tão mãos largas. Como raramente se dá alguma coisa,o preço do pão era capaz de incluir o custo da embalagem.

OUTRA MORADA

"It's time to abandon Earth". Vindo de quem vem,Stephen Hawking,uma ideia destas pode querer significar que isto aqui não tem solução,já deu o que tinha a dar,e que muita gente anda muito incomodada com a vizinhança. Assim,o que há a fazer é procurar outra morada onde não cheguem os maus cheiros que por cá se sentem. A seleção dos habitantes do novo condomínio será fácil, pois as viagens irão ficar um bocadinho carotas.

NÃO,QUE IDEIA

Então,o que se está fazendo aqui é para...?,qualquer coisa que não valia a pena dizer o que era,uma coisa. Não,que ideia,nada disso. Mas nunca diziam para o que era,e quando diziam,era assim uma coisa vaga,muito vaga. O que lhes interessava dizer,acima de tudo,era o não,um não redondo,bem vincado,que se ouvissse a grandes distâncias,para que todos soubessem do grande disparate que acabara de nascer,vindo da boca do outro,do "inimigo". Fazia aquilo parte de uma estratégia bem montada,porque a vida não era uma brincadeira,mas sim uma luta,uma luta sem tréguas,que era o que o "inimigo" queria,para se refazer. Mas dessa estava ele bem livre,pelo que havia de se render.

domingo, 20 de agosto de 2017

CIDADÃO DO MUNDO

Não,não era um querer,ou um achar-se diferente,não senhor. Acontecia que não se sentia pertencer a um único lado. Seria ,assim,uma espécie de cidadão do mundo,de um mundo artificialmente dividido.

OUTRA VIDA

Os pais que ele tanto amara tinham abalado. O que ele faria para os reaver. Assim,acreditava numa outra vida.

PARECIA OUTRA

A terra estava muito diferente,até parecia outra,mas as pessoas que lá viviam não tinham mudado.

SEM UM SEGUNDO

O que se há-de pensar de um "amigo" que nunca lhe estendeu a mão quando dela precisou? Como se há-de chamar um "amigo"que está sempre apressado,sem um segundo sequer para o atender? O que se há-de pensar de alguém que nunca está de acordo com o "amigo" e que acode sempre pelo "inimigo" do "amigo"?

AS SUSPEITAS

As suspeitas são piores do que as carraças. Agarram-se às vítimas com unhas e dentes,não mais as largando. Mesmo que não provadas,ficam delas restos pairando nos ares,para sempre

UMA COISA FRIA

Ele trazia uma mão cheia de linhas,de linhas curvas,de linhas de uma família que estava a dar os primeiros passos,mas já seguros. Não eram elas,pois,coisa nova,tanto mais que se estava perto do local do seu lançamento,mas diziam respeito a um material ainda não experimentado,sendo ainda também um trabalho de meses. Pois nem um olhar interessado,nem um querer comparar. Apenas um isso também se cá tem feito. Uma coisa fria,uma coisa tresandando a suficiência, uma coisa de sempre,para sempre.

NERVOSO MUITO MIUDINHO

Raramente passava gente por ali. Talvez por isso, os pombos das redondezas procuravam aquele recatado e amplo espaço. Pousavam onde mais lhes apeteceria,em altos postes,nos telhados,no chão,sítios assim. Mas eram eles muito irrequietos,não aquecendo lugar. De repente,levantavam voo,mudando de poiso. Não se via razão para esse mudar. Não bulhavam,não se ouvia um ruído,não fazia uma aragem mais forte. Quer dizer,teriam nervoso miudinho,ou andaria por lá algum bichinho que os estivesse a incomodar demasiado. É que eles,de vez em quando,davam grandes bicadas neles mesmos. Estariam com a mosca.

TALVEZ A UMA SÓ V0Z

Até os pombos querem mostrar de quanto são capazes. E foi o que aconteceu, ainda há pouco,nos ares de uma pacata e sossegada praça,invadidos,lá muito no alto,por um bando de gaivotas, em lúdicas evoluções. Os pombos,talvez a uma só voz, largaram os seus poisos habituais,nos telhados,e lá deram um ar da sua muita graça,cruzando,também em bando,muito por baixo,e por momentos,os ares.

QUATORZE IRMÃOS

Era um homem alto,com ar de muito doente. Ainda não fizera setenta,mas parecia ter cem. Teriam sido os duros trabalhos no mar,em muitos mares,na pesca do arrasto. Seguira a vida do pai,dos seus,uma família de pescadores. Eram quatorze irmãos. Seriam mais,se o pai não tivesse morrido tão cedo,aos quarenta e um.

CERTEZAS

Do alto dos seus vigorosos noventa anos,ele afirmava e negava. É o que lhe digo. Eu é que sei. Um homem de certezas.

OUTROS RISCOS

Seriam dez,seriam vinte,quer dizer,eram muitos,todos jovens. Enretinham-se, em amplo e plano recinto,a patinar,a exibir arriscadas habilidades. Mais tarde,ou mais cedo,outros riscos os esperariam,pelo que o entretém podia ser visto como um modo de para eles se prepararem. Tão a sério o tomariam ,que,.até,lá dormiam. Era o que dois,que mantas cobriam, estavam fazendo. Tudo isto um rei, lá do alto onde o tinham posto,bem testemunhava. Coitado dele,para o que estava guardado.

CORRENTE IMPETUOSA

Aquilo tivera a sua graça,para não dizer outra coisa menos suave. O "inimigo",o perigoso "inimigo",capaz sabe-se lá de quê,pelas muitas suas "maldades" do estendido passado,tinha estado uns meses lá fora,passo que ele não precisara de dar,nem precisaria,pela simples razão de ter nascido ensinado. É que não queria acreditar no que estava vendo,mas só isso,que ler,não estava para isso,nem se queria sujeitar a um vexame desses,pois era um escrito do "inimigo". Era um escrito que dava conta da tal ida,acontecida uns anos antes. Parecia despropositada uma coisa daquelas,sinal claro de que não tinha mais nada para narrar,ao contrário dele,que debitava qual corrente impetuosa, imparável. Mas nem uma palavrinha sequer sobre o que lá se dizia,talvez porque nada tivesse entendido,o que era uma grande tristeza.

UMA GRANDE INTERROGAÇÃO

E ele ficara-se ,ali,naquele sítio,não importa qual,um qualquer,ficara-se,ali,sozinho,com aquela pergunta. E se fosse aquele sítio o último,entre os outros muitos sítios onde estivera já,que a sua vida já ia longa,talvez demais? Sim,se fosse o último? Mas que importava isso,se fosse aquele sítio o último? Não eram os sítios,ao fim e ao cabo,todos iguais,para quem seria aquele o último? Poderia ter sido o último,até,o primeiro em que estiivera. Que adiantaria ter sido o primeiro,ou o último,se os sítios eram todos iguais,com o mesmo Sol,quando ele aparecia,com a mesma Lua, quando ela surgia? Então,porque não deveria ser o primeiro o último? E que importava ter sido o último,se para lá de um qualquer tudo igual era,ou seja,uma grande interrogação.

TODOS IGUAIS

X era um cidadão exemplar. Um dia,querem saber a sua opinião sob a condução da coisa pública que estava vivendo. Pior do que aquilo não podia haver. Noutro dia,quando era outra gente a gerir a coisa pública,quiseram saber a sua opinião sobre a coisa pública que passara a viver. Pior do que aquilo não podia haver. Em outras ocasiões,anos mais tarde,não muitos,estava X na condução da coisa pública,era opinião corrente de que pior do que aquilo munca houvera. Quer dizer,as coisas iam de mal a pior. Parecia não haver volta a dar-lhe. Era assim,cada qual que se governasse,que eram todos iguais,incluindo os cada quais,de que saíam lá os da condução da coisa pública.

TAL CATÁSTROFE

"Bradam aos céus as carências que por aí vão,por esses muitos cantos do mundo. Muitos falam disso,muito contristados,e até dão mostras de as querer mitigar,senão com elas acabar,hasteando bandeiras." E é de se ficar muito admirado quando se vê na linha da frente do combate a essas carências quem,aparentemente,só se lembra disso quando estão em causa posições para decidir sobre rumos futuros. Será que os move o querer esbater,ou mesmo anular,essa situação triste,de uma teimosa permanência de incontáveis casos de falta de meios para uma decente vida? Ou será que receiem virem a faltarem-lhes os meios,tomadas as medidas que urgem,para manter a abundância a que estavam habituados? E então,estando lá,a mexer os cordelinhos,irão actuar de maneira a evitar tal catástrofe.

SIMPLES CURIOSO

Tinha vindo,mais uma vez,fazer uma visita ao parque. Por lá andou,tecendo considerações sobre o que estava vendo,que a sua mulher ouvia,talvez com não muita atenção,que os seus interesses seriam outros. Parecia ser ele um entendido de coisas de árvores e companhia,pois estavam essas considerações,por uma casual amostra,carregadas de certezas. Ele sabia de doenças,de habitantes dos solos. Não era um especialista,mas um simples curioso muito convencido.

MARCOS DE UM CIRCUITO

Conversa,de pé,com duas boas almas,sobre o sofrimento. Cantares de galos,ao desafio,em quinta urbana. Encontro com um São Bernardo,chamado Beethoven. O canil do bairro está quase pronto. Um velhinho em cadeira de rodas,a apanhar sol. Reparam-se computadores e telemóveis,em casa de crédito popular. Afinal,não se devia nada,fora engano. Marcas de um circuito,de menos de uma hora.

sábado, 19 de agosto de 2017

SALTARECO

Sabem vocês quem ele me lembra?,perguntava o saudoso tio Joaquim lá na sua roda de amigos. Olha o tio Joaquim com mais uma das suas. Não queria mais nada,a querer imitar o muito saudoso Eça na Ilustre Casa de Ramires. Depois,atrever-se a pôr ali lado a lado o Gonçalo Mendes com o outro,era de velho já sem tino. Mas tinha de se dar o desconto,porque ele já estava quase a partir. De resto,o tio Joaquim não era assim tão atrevido. É que,afinal,lembrava-lhe um saltareco,um gafanhoto pequenino,que agora poisa aqui e logo a seguir além. Mas a ele,ao tio Joaquim,parecia-lhe que dali não viria grande mal lá à meia dúzia de becos que o tal outro frequentava. Estava convencido,até,que aquilo não passava dali,como,aliás,acontecia,no geral,com os saltarecos,que muito raramente davam pragas. Tinha ouvido,também,o saudoso tio Joaquim,que aquela de andar aos saltos já era pancada antiga. Um dia,até lhe tinham feito um reparo,assim como a gozar. Irra,que você não se fixa,sempre a mudar de tema. Mais tarde,um chefe não se contivera. Irra,que você não se fixa,sempre a mudar de poiso. Esse levou troco,na forma de uma frase de arrasar. É certo,mas em todos eles cumprira a sua obrigação. Um dia,cansado de tanto saltar,passou a bater sempre na mesma tecla. Isso era o que constava. Assim como as cores,como o azul. Azuis há muitos. E ele via-os,ou,pelo menos,tentava vê-los. Mas outros só viam azul.

E MAIS,E MAIS

Há, pelo menos,duas maneiras de ser,um estar que não tem mudado desde que o mundo se conhece,dizem,pelo menos,os entendidos das coisas do ser,essa gente que,além de terem sempre os olhos bem abertos,varrendo todos os quadrantes,até os mais escondidos,ou mais maneirinhos,também a eles muito bem se conhecem,talvez da convivência,quem sabe. Uma delas, é o ser por ser,pela comezinha razão de não se poder ser outra coisa,pois não pode haver,pelo menos é o que se diz,seres ao quadrado,ou mais ainda,assim como lá com os números. A outra,é o ser mais do que o outro,ali o vizinho do lado direito,por estar mais próximo,por se ver mais vezes. O mesmo parece passar-se com o ter,talvez por uma mera questão de imitação,quem sabe,que a originalidade custa mais. Uma delas,é o ter por ter,assim como um desporto amador,sem estar a pensar em competições. A outra,é coisa muito séria,tão séria que parece ser obra do diabo mais velho,daquele com muita experiência,muito batido. É o ter para ter mais do que o outro,que pode ser,à partida,o vizinho do lado,mas,depois,é um parar sem destino. É o ter sempre mais,e mais,e mais...

O PÃO E A CAMA

Dizia ele que se entregara nas "Mãos de Deus". Parecia querer, com isto, significar que acreditava na Sua Existência. E por ser assim,bastar-lhe-ia,no seu entender,o pão que comia e a cama onde se deitava,para além,claro,de uns acrescentos,que,vistas bem as coisas,não eram nada para deitar fora,ainda que não fossem uns luxos,nem ele estava para extravagâncias,que era como ele os classificava,os tais acrescentos. No fundo,no fundo,estaria também confiante de que esse pão e essa cama nunca lhe faltariam,bem como os acrecentos,que não podem ser esquecidos. Mas se um dia, um supor,não os viesse a ter,sabe-se lá porquê,era ele muito bem capaz de se zangar com Deus,ou até mesmo deixar de crer na sua existência. Enfim,assim,quase, como com os amigos,amigos,negócios à parte.

UM VIVO JÁ MORTO

Ele sentia-se definitivamente arrumado,tantos eram os sinais de enfado à sua volta,à sua beira. Podia dizer-se que era um vivo já morto. Tudo concorria para essa definitiva arrumação. Para além das ausências,havia os abrir de boca, mal ele contava pela primeira vez alguma coisa,os essas estavam fartos de ouvir,os estão com muita pressa por terem uma vida muito atarefada,e muitas coisas mais,que não valia a pena apontar,que muito conhecidas eram,sendo escusado,até,ter referido as que atrás ficaram,para perfazer meia dúzia de linhas. É a vida,a que ninguém escapa,e muito menos um vivo já morto.

É A VIDA

Então,mudou de emprego? Não,é que eu tenho dois. Este,é de tarde,o outro,é de manhã. É claro que lá em casa também me espera mais um,mas esse não conta,é de graça. Tem de ser assim,senão não dava para aquilo de que a gente precisa. E é aproveitar enquanto se é nova,embora eu já não seja assim muito nova.Mas é a vida,o que se há-de fazer? O que peço é que a saúde não me falte.

LÁ EM CASA É QUE NUNCA

Não pode estar de pé,que as pernas não deixam,e a idade também não,e sabe-se lá mais o quê. E então,fica sentado todo o tempo que ali permanece,que lá em casa é que nunca. Ali está com os seus,que pouco lhe ligam,é certo,mas ele faz de conta. Ali,há movimento,ali, conversa-se,onde eie não entra,ali, bebe-se,ainda que ele nem um copinho,que o dinheiro não dá. Todos estes nãos ele os deita para trás das costas,e até sorri. Sempre está ali melhor,que lá em casa é que nunca.

POR TABELA

Ele passara por ali há uns bons vinte anos. Pois, dessa passagem,ainda havia forte lembrança. Os sulcos que aquele homem deixava. E ali não era um sítio qualquer. A alguns,talvez,até,a muitos, não lhes custaria nada afirmar que ali era um dos sítios mais exigentes do mundo. E foi uma grande surpresa vê-lo,e,também,uma grande satisfação e proveito,pois apanhou por tabela.

QUARTA CASA

Um caso para pensar,esta mudança. Talvez para se estar mais perto da primeira casa,quem sabe? Como quer que seja,valeu a pena. Podia lá haver melhor varanda sobre o grande rio,que corria lá a dois voos? A vista era franca,soberba, para todo aquele amplo e rico vale. A variedade de cenários,em toda a roda do ano,que por ali ia. Um encanto,de ficar ali,preso a ele. Só isto dava para pagar a renda e sobejava,que elas continuavam baratinhas. Só tinha um senão aquele belvedere. É que o muro de suporte que ali se pusera não era de grande confiança,pois,aqui e ali,dava sinais de que,um dia,haveria grande desgraça. E o que são,também,os tempos. A casa,além deste senão,era,aparentemente,um tanto ou quanto vulnerável,parecendo ser de muito fácil invasão. É que,nos fundos dela,abrira-se uma porta,no seguimento do tal muro. Era uma saída,não para a rua,mas para uma terra de ninguém,pelo menos assim parecia. E por parecer,permitia que se tivesse quintal e nele se instalasse um galinheiro. Não houve,porém,surpresas,talvez com receio de que as galinhas dessem o alarme.

LEITE INTEGRAL

Se os pratos não agradavam,não se ficava com fome. Aquele leite integral,quer dizer,sem gordura corrigida,e aquele student pudim, chegavam muito bem.

DEFINITIVAMENTE

Em apreciações sobre este e aquele,sobre o "inimigo",não se ficavam pelo meio,quanto mais pelo cimo,onde os visados pertenciam. Eram eles burros,e o "inimigo" ainda mais burro,sem tirar,mem pôr. Até um ceguinho o diria,pelo cheiro. E pronto. Dali não saíam,definitivamente. Se assim não fosse,como é que poderiam dormir descansados? Se assim não fosse,também não teriam o dia ganho,o dia que não era deles,definitivamente,o dia que lhes fora permitido viver.

PARES DE OLHOS

Pares de olhos era o qua se via por onde o foco passava. Pareciam estrelas,ali muito mais perto. Estariam como que imobilizados os pobres bichinhos. Não eram olhos que interessassem,senão estariam bem arranjados,nem alma se lhes aproveitaria. Escaparam naquela vez. Eram outros os olhos procurados. Levou seu tempo. Encontrados eles,adeus erva tenra do vale,que não mais te vejo.

UM DESPLANTE

Coitado do velhote,assim se pensava,quando o viam carregando sacos,às vezes,mais do que um em cada mão. É que se julgava ter ele de se deslocar de muito longe,para se vir abastecer. Afinal,não era caso para ter pena dele,antes pelo contrário,quanto àquele palmilhar de respeito. É que o fazia por gosto,convencido de que estava ter sido esta proeza o que lhe tinha servido para aguentar o crescer dos anos, sem fim à vista.Chegava ao ponto de dilatar em muito as muitas passadas,caminhando para locais opostos ao de sua casa. E isto,sempre na companhia dos carregos,como se gostasse deles. Um desplante,um prodígio,na idade que já contava,que,ele,a cada passo,anunciava,acrescentando nunca ter precisado de médico. Sabia-se lá até quando ele iria resistir. Era capaz de ir desta para melhor depois de muitos que reparavam nele ,de início,com pena,depois,com admiração.

DARLINGTON

Estar em Newcastle upon Tyne e não ir a Darlington,em condado vizinho,seria imperdoável. E isso por duas notáveis razões. É que a primeira linha de caminho de ferro pública ligou Darlington a Stockton,em 1825. Depois,estava em exposição,numa plataforma da estação,a Locomotion nº1,de George Stephenson,usada nessa viagem.

sexta-feira, 18 de agosto de 2017

VELHO ATILADO

Já estava reformado,que os anos assim pediam,e o que recebia não era por aí além. Ele até alugava quartos,que a sua casinha a isso se prestava. Depois,sempre ficavam mais acompanhados,ele e a muher. Então,concorda que lhe vão ao bolso,para dar bolsas a esses meninos e meninas,sem excepção,por andarem lá a estudar? Concordo,sim senhor,não havia de concordar? É que a maior riqueza de uma nação está nas cabecinhas. E as deles e delas têm de ser muito bem tratadas, escuso de dizer porquê. Aquilo é que era um velho atilado.

O COSTUME

O tempo era de dor. Era o tempo a seguir à tragédia,uma coisa medonha,em que se tinham perdido vidas,muitas vidas. Era altura para se pensar na vida,na vida imprevista,na vida que um futuro guarda,quando guarda. Pedia-se silêncio,pedia-se recato,pedia-se reflexão. Pedia-se... Mas foi o costume. E foram as descrições,e foram as imagens,imagens de familiares,de densa tristeza,carregadas de irremediável.O tempo era de dor,e não de palavras.

PARTE DA FAMÍLIA

Se um pobre interpela,ou deveria interpelar,o que aconteceria se se atendesse aos muitos milhões de pobres que vão por aí,nesses muitos cantos desse vasto mundo? É que um pobre é gente. E é pobre sabe-se lá porquê,se tantas são as portas por onde eles podem sair.E se interpela,ou deveria interpelar,isso quer dizer que se pode pensar em querer acabar com a pobreza. Como? Talvez todos juntos,os não pobres,pudessem dar uma ajudinha,que a coisa não parece fácil,mas é muito triste,e não fica bem a esses não pobres. É que eles,os pobres,são pessoas,fazem parte da família,por assim dizer.

"BOA FAMILIA"

Diante das maravilhas do universo,mesmo ali á vista para quem as esteja a ver,ou queira e puder ver,ou saiba que elas lá estão porque outros as viram,diante de tanta grandeza,de tanta riqueza,haverá razões para sentir alguma consolação com isso,ainda que se seja um parente pobre da família humana? Talvez,se for capaz de se sentir parte dessa grandeza,ainda que muito pouco ou nada usufrua dessa riqueza. Pertence,pelo menos,a uma "boa família".

A VIDA CONTINUA

A conversa não havia meio de terminar entre um mais velho e um muito mais novo. Parecia que não se viam há séculos. Então,despejaram os sacos? Deviam estar bem cheios,pelos vistos. Pode-se saber quem era? Pode,era o meu pai,já há muito tempo que não estávamos juntos. Aquilo parecia ficar por ali. Mas o muito mais novo lá achou que uma explicação não ficaria ali nada mal. E deu-a,descontraidamente,como se tratasse da coisa mais natural deste mundo. Sabe,a minha mãe não cumpriu. E então,sim,a coisa ficou mesmo por ali. A vida continua,quer lá saber dessas coisas,não faltava mais nada?

UMA DESGRAÇA

Onde vai você a correr? Deixe-me lá,estou aqui que não posso. Era um moço interessado em saber mais coisas sobre o petróleo. Lá no sítio que me calhou, só o chefe é que eu entendo. Todos os outros é uma desgraça. Quero chegar a casa o mais depressa para abrir a televisão. Ali,sim,entendo o que eles dizem.

ATÉ LOGO

Não iam para a Índia,como fora,pela primeira vez, o Vasco da Gama,mas sim para muito mais perto,repetindo,até,o que outros já tinham feito,mais canto,menos canto. Não iam de caravela, mas sim em veículos de todo-o-terreno. O local da partida é que era o mesmo. É um local simbólico,carregado de história,propiciador de novas gestas. À semelhança do que acontecera com a viagem do Gama,veio muita gente assistir à largada.Era um mar de gente. Seria de curiosos a maioria,mas também lá estariam familiares e amigos a dizer adeus,tal como no passado Ao contrário,porém,do que então sucedera,não se viam lágrimas. Alguns perigos correriam,é certo,mas nada como o das águas e das terras desse remoto tempo. E depois,era uma aventura de apenas uns escassos dias. Em vez de adeus,poderiam ter dito até logo.

INESPERADO ENCONTRO

As surpresas que se podem ter quando se anda a trabalhar,ou a passear,em pleno campo. E foi o que aconteceu naquela altura,manhã ja alta. De repente,por detrás de uma cortina de árvores,em que pontificavam ameixieiras,lá nas imediações de uma vila do Alentejo interior,surge um chapéu colonial,que protegia a cabeça de uma senhora jovem. Encontrava-se de férias. A senhora também ficara surpreendida,pois estava muito longe de adivinhar o que levava o outro a andar por ali. Mas era interessada,e sabendo de que se tratava,acabou por agradecer as informações,pois talvez fosse aquilo também útil ao marido,para quando regressasse. Certamente por isso,à despedida,disse que tivera muito gosto naquele inesperado encontro.

A CIRCUNSTÂNCIA

Sim,pode ser isso que cabou de dizer,mas também pode ser outra coisa. Sabe,há muitos fatores em jogo,alguns,até,desconhecidos,que o sistema é complexo,pois que de diversas vidas se trata. É difícil,arriscado mesmo,dar uma resposta concreta,ajustada,sem se terem feito experiências. Este senhor,coitado,deve saber muito pouco,sempre com hesitações,sem uma indicação precisa,imediata,ali na ponta da língua. Não presta,em suma. Não é assim que procedem tantos. Têm logo ali,pronta para servir,a solução definitiva. Como a arranjaram? Muito simples. Leram ali,leram acolá,e já está. Não importa que as circunstâncias fossem muita outras. Nem sabem,ou sabem,mas não ligam,que a circunstância é que comanda. Uns sábios,em suma. Uns sábios convencidos.

POMBO CORREIO

Teria quando muito uns sete ,oito anos,e nunca tinha estado naquela terra,pelo que não sabia os cantos dela. Era uma terra onde um menino como ele se perderia. Poi este menino,tal como um pombo correio, foi capaz,sozinho,orientando-se,talvez por cheiros,de que só ele dava conta,de aparecer junto de sua mãe,que deixara para ir dar uma grande volta. Não se sabe porque decidira deixar os companheiros. O que se sabe é do que ele foi capaz,sinal de que teria um bom sentido de orientação,o que se veio a confirmar.

EM PLENO CAMPO

Você por aqui,em pleno campo? O mesmo digo eu, Senhor Professor,não o fazia por estes sítios. Foi uma boa surpresa,acredite. Para mim,foi uma grande surpresa. Estava-o a ver só em laboratório, e,afinal,aqui está em trabalhos de campo. É a vida,Senhor Professor,é a vida. Um grande Professor este,de primeira escolha. Por onde passava,deixava rasto fundo. Para não mais o esquecer.

PARA APRENDER

Era um caderno eleitoral,ali bem aberto,sobre o tampo da mesa dos almoços e dos jantares. E ele,e um seu ajudante,ainda que sem tesouras,fartaram-se de cortar. E este também é para cortar?, queria saber o ajudante. Sim,esse também se corta. Para aprender. Estiveram naquilo a manhã inteira,quase sempre sozinhos.

DEVIDO DESCONTO

Acabara por o reconhecer,depois de várias hesitações. O tempo que já lá ia. O seu avançar fora meteórico. Ainda muito novo,ocupara altos cargos. O seu ar respirava confiança,mais que importância. Era isso de sua natureza,do que recordava dele. Muitos anos tinham,de facto,passado,mas,aparentemente,apsar do trajeto de alto nível,continuava igual a si mesmo. Não olhava de cima,ao contrário de tantos. Mas não se pode ser prefeito,pelo que não se conteve. É humano,há que dar o devido desconto. Sabe,estou aqui,pois ele foi durante algum tempo meu chefe de gabinete.

quinta-feira, 17 de agosto de 2017

VOZ DOUTORAL

Não interessa como se chamava. Interessa é saber que,lá na turma,era ele,de longe, o mais lido. Que lhe importavam a matemática,as ciências,mesmo o português,com aquela horrível gramática? Nada,mesmo nada,ou melhor,o suficiente para não perder o ano. É que os seus gostos eram muito outros. A cada passo,referia este ou aquele livro,citava esta ou aquela frase,resumia este ou aquele enredo. Os colegas admiravam-se de tanta sabedoria,de tanta precocidade,incapazes de o acompanhar. Nem isso,de resto,os movia,pois as matérias das aulas,em variedade e quantidade,não deixavam. Doutra maneira,como se havia de passar com boas notas? Notas. Era superior a tais convenções. Os outros que decorassem aquelas mixórdias,que ele a isso não estava disposto. Havia de se arranjar mais tarde. Se os imitasse,como poderia estar a par das últimas edições,que ele se apressava a anunciar? Adquiriu,assim,uma certa áurea entre a rapaziada,que muito o respeitava. Tinha prazer nisso,era bem evidente. Talvez,até,fosse o seu objectivo primeiro. Impressionar. Parecia não o preocupar o futuro. Ele saberia construí-lo. E um dia,sumiu-se,sem dizer água vai. Constou que emigrara,para lá onde tinha família. Durante anos,viveu-se na expectativa de saber novas dele,que fossem o reflexo das suas muitas promessas. Talvez não se estivesse no lugar apropriado para as receber. Deviam andar por aí, encantando outros. Mas não mais fora esquecida a sua figura. Sempre de capa e batina,o cabelo muito negro,puxado para trás. A voz era doutoral,de acordo,aliás,com a importância que dele irradiava.

OS "JUÍZES"

O que ia por lá de julgamentos. Todos os sitios serviam para decidir,mas havia dois mais das simpatias daquela gente e que eram as esquinas das ruas e as mesas dos cafés. Julgamentos definitivos,sem apelo,nem agravo. Todos os julgados tinham o mesmo destino,o degredo,assim como o riscá-los da existência,da vida. Ninguém escapava naqueles tribunais,a não ser,claro,os "juízes",gente do melhor,cheia de perfeições,sem uma leve manchinha a enodoá-la. Eram assim,naqueles tempos,e lugares,os "juízes".

O BADALAR DOS SINOS

Naquela algidez das manhãs de Domingo,naquela bruma leve,alimentada pelo teimoso fumegar das chaminés,naquele silêncio das ruas,o badalar dos sinos tinha qualquer coisa de irreal,apelando ao sonho.

CADEIRINHA

Um largo para não mais esquecer,um largo que começou por ser grande,mesmo muito grande,e que depois,com o dobrar dos anos,foi encolhendo,encolhendo,até ficar reduzido ao que hoje é,um larguinho,com uma pequena estátua ao meio. E tudo isto,este grande fenómeno,deu-se por obra e graça dos olhos que o foram vendo. Pois neste largo sucedeu uma coisa importante,melhor dito,muito importante. É que foi lá,numa casa para ela virado,que certo menino,de pouco mais de seis anos,aprendeu as primeiras letras,letras que lhe custaram o ter trazido de casa uma cadeirinha,senão seria obrigado,querendo sentar-se,a fazê-lo no chão. Acontecera,simplesmente,que outros meninos e meninas se lhe tinham adiantado,esgotando as cadeiras que lá havia. Foi isto um sério sinal para o menino,que ele,naquela altura,não entendeu. É que,ao crescer,não muito perto dos começos,mas um tanto lá mais para diante,não lhe foi nada fácil ocupar outras cadeiras,não só por causa da concorrência em si,mas por causa de outras coisas,coisas de velhos e de novos,mas mais de velhos.

UM BRINCALHÃO

Num "bus",bem visível nos dois lados,em carateres garrafais,lia-se o apelo - Pede-se a intervenção dos passageiros no caso do cobrador ser assaltado. Um brincalhão fez alterações num dos lados,com cortes e acrescentos - Pede-se a intervenção dos passageiros no caso da cobradora ser assaltada pelo condutor. Deve esclarecer-se que a cidade ramificava-se por uma vasta área,pelo que havia zonas muito isoladas.

ESCAPE ABERTO

Faziam bicha,eles e elas,junto à loja de peixe frito e de batata frita. Vinham de mota,de escape aberto. E ali ficavam,sentados,de pé,comendo com sofreguidão,lambendo os dedos. Confortados,debandavam,deixando um rasto de gases,de ruídos,de risadas,e,acima de tudo,de vida.

DE PÉ

Bastava ele. Só uma ou outra vez se viu acolitado. Sempre de pasta,uma pasta preta,já muito gata,como ele,onde trazia o Livro,e demais auxiliares do seu apostolado incansável,teimoso. A volta que dava era um estirão de respeito,que era assim que tinha de ser,que o "peixe" andava arredio. Parecia ser isso demasiado para a sua idade,pois os cem aproximavam-se a passos largos. A figura era magra,branca. Sempre de passo lento,repousado,lá ia cumprindo a sua missão,de olhos bem abertos,todo entregue à descoberta de alguém a necessitar de salvação. Na rede,quantas vezes nada encontrava. Mas nunca desanimava,persistindo sempre. No dia seguinte,mais propriamente na manhã seguinte,teria mais sorte. E quando assim era,não se sentava ao lado de quem lhe dava atenção. Ficava de pé,e de pé expunha as suas verdades,e de pé usava o Livro,o seu apoio por excelência,o seu mundo. O Livro o alimentava,o Livro lhe dava energia para continuar de pé,sem um aparente desfalecimento. Foi capaz de ter passado para o lado de lá,o lado que ele conhecia de cor e salteado,de pé,como as árvores,das quais se diz que morrem assim, de pé.

ETERNO FAZ DE CONTA

Naquela altura,estavam descansando da labuta da vida,que bem o mereciam. Servira-lhes para isso o estreito poial de uma porta. O que eles tinham apregoado naquela manhã ,sobretudo ela,que seria assim que ele queria,exigia,que a vida custa. As vozes,em especial a dela, vozes fortes,penetrantes,apelativas,alcançam grandes distâncias. É só um euro,é só um euro. E são morangos,e são mangas,e são ananazes,e é hortaliça,é o que calha,é o que der mais jeito,desde que seja de comer,é o que der mais lucro,certamente. Trazem a mercadoria num carrinho,já um tanto gasto,que a vida não está para luxos. Um carrinho nervoso,sempre de uma esquina para outra,a fugir da autoridade,que faz vista grossa,num eterno faz de conta,compreensivo quanto baste.

COMPANHIA

A sala estava bem composta,e o palestrante lá foi dizendo de sua justiça. Seguiu-se o debate,como era norma. A certa altura,lá do seu canto,um jovem quis saber uma coisa a que ele parecia atribuir uma grande importância. Pode-me dizer para que serve isso? Naquele tempo,e lugar,sobretudo este,era aquilo considerado de grande impertinência,só para gente que apenas pensava em resultados imediatos,talvez por se estar com muita pressa. Mas ele teria obrigação de saber isso,só que lavraria nele uma grande preocupação. É que ele andaria a concluir que o que estava ele fazendo não valia nada. E então, vá de tentar arranjar companhia.

CASUALIDADE MUITO REMOTA

Muito aquela máquina fotográfica trabalhou,não sabendo para onde mais se virar. Foi nos Cheviot Hills,muito em especial em Otterburn e Bellingham. Teria ficado com pena de não lá se demorar,mas havia horários a cumprir. Uma casualidade muito remota aquele encontro de dois colegas que já se não viam há uns bons anos. Para não mais esquecer.

NOMES

Ele estava convencido de que durante largo tempo vivera,em boa parte, à sombra do seu nome. E isto magoava-o,de alguma maneira,pois ficaria para sempre em dívida com quem disso se lembrara,e, pior do que isso,teria de carregar com essa memória,o que era o mesmo,como que a presença de um outro,que não ele mesmo,que não era um nome,mas mais algo do que isso. Depois,estaria sempre a ouvi-lo,ao nome,a dizer que era a ele que tudo devia,que sem ele não iria longe,ficaria lá atrás como os demais,coisas assim,que se está farto de saber,e ele,o nome, muito bem,pela sua muito vivência,que lhe mostraria o costume. Ele é isso? Pois vamos lá ver se isso é assim,pois assim é que isso não pode ficar. Vou tentar arranjar aí um sítio,onde ninguém me conheça,onde nunca me viram,nem mais gordo,nem mais magro,e vou-me expor,e vamos ver o que daí sai. Então não é que foi atendido tal como não tivesse aquele nome? Afinal,o nome não fora nada para ali chamado. E foi um grande consolo para ele sabê-lo. Consolo! Ele há cada um. Consolar-se com uma coisa destas. É que com nome,ou sem ele,um nome qualquer,ele,como tantos,não valiam nada,porque,de facto,não passavam de nomes,que o tempo se encarregava de esquecer.

OS AMIGOS SÃO PARA AS OCASIÕES

Toca o telefone. O "amigo" atende. Olha lá,não me podes dizer a morada de fulano? Ainda há dias estiveste com ele,deves saber. Espera um momento,que é só ir ali ver. O momento passou,um largo momento. Olha lá,tu não sabias ir à lista? Ainda bem que te encontro. Estou a precisar de um quarto aqui perto. Como conheces este bairro,és capaz de saber. Vens mesmo na boa altura. Vais ficar como em tua casa. Era uma casa... É escusado classificá-la. Vens mesmo a calhar. Aos anos que se não viam. A minha mulher está a precisar de uma pele,dessas que há lá para onde tu vais. Aí são mais baratas. Olha que se não ma trouxeres nunca mais te falo. Receber, estão sempre prontos. Dar,é coisa doutro mundo. Estou aqui tão satisfeito.Vê lá tu que o professor disse que eu colaborei num trabalho de muito préstimo. O professor sempre foi muito exagerado. Muito me contas. Mas isso não é nada,comparado com o que se passa com os meus. Todos uns génios. Não há outros. Que sorte tu tiveste. Já reparaste nas perguntas que te fizeram? Assim também eu. Vou-te contar o que há tempos me sucedeu com fulano. Pode lá ser. Ele era incapaz,conheço-o bem. Outro exagerado. Olha que na net há montes de coisas. Pois sim,mas estão apenas as que são lá postas. Quero-te dizer que continuo com o blogue. Ah,sim? Mas quem é que te lê?

PAZ DEFINITIVA

Como as coisas podiam mudar tão radicalmente. Já não era pela calada da noite,já não era em segredo. No tempo triunfante de novíssimas tecnologias, tudo, naquela altura, era às claras.E isto para um qualquer. Anunciava-se,com muita antecipação,eles lá sabiam porquê e para quê,aos quatro ventos,todos os pormenores da acção,o dia, a hora,o número de pedras envolvidas,a cifra dos meios ultrasofisticados. Chegava-se ao preciosismo de indicar quantas caixas eram precisas para as remessas. Nada escapava. Era claro,que, por trás de tudo aquilo,convinha não esquecer,estavam os tais meios nunca vistos. Sem eles,seria impossível lidar com tantas variáveis. Assim,era,de, irresistivelmente,bater palmas,até cansar,e de ficar estarrecido com tanta maravilha,com tanta franqueza,com tanta abertura. Não se poderia dizer,depois,que não tinha sido dado aviso do que se iria passar. Estava-se,assim,muito a tempo,para se procurar recato. Mas para o comum dos mortais,o problema não era o tempo,mas onde o encontrar. Talvez nos polos,e mesmo assim,com os olhos bem abertos,visto que por lá aquilo também não andava muito seguro. Pelo andar das coisas,era muito provável que só noutra galáxia morasse o sossego,a paz definitiva.

quarta-feira, 16 de agosto de 2017

MAIS QUE FAZER

O rei não ia nu,antes pelo contrário,mas ia só. Parecia isso uma grande ousadia,pois era sabido que muitos perigos o espreitavam. E a rua que ele descia estaria cheia deles. Tratava-se,de facto,de uma vereda muito apertada,quase imitando um desfiladeiro,de passeios miniaturais.Não admiraria,assim,que os serviços competentes ,muito previamente,tudo tivessem feito para garantir a segurança de sua majestade. A rua estaria vigiadíssima,só que não se notava à vista desarmada. Foi o que constatou um velho,que,por um muito mero acaso,se viu a caminhar atrás do rei. Olha,mas é o rei,e não leva séquito. Donde virá ele e para onde irá?Rapidamente ficou tudo esclarecido. É que,atentando melhor,deu conta de grande festa ali mesmo a dois passos. Estar-se-ia fazendo tarde e outra festa o esperaria,que os reis precisam de se distrair.Talvez sem dizer água-vai,o que não seria de estranhar,ele ali ia muito serenamente,sem olhar para trás,nem para os lados,que ele saberia estar bem guardado,para a sua carruagem,estacionada uns cem metros abaixo,numa meia-laranja,muito conveniente em garganta como aquela.Porque o velho aparentava não fazer mal a uma mosca,não fora incomodado na sua digressão ocasional. O mesmo aconteceu a um casalinho, entretido nos seus amores. Nem deram conta do velho,nem do rei. Tinham mais que fazer.

SABIAM DEMAIS

Mas a mim não me engana ele. Olha o esperto,ou sabe-se lá mais o quê? Eu já lhe vou mostrar como se fazem as coisas. E pespegou-se,levando companhia,lá na sala onde ele,dizia,ia dar umas explicações de matemática,a quem não tivera tempo,lá para trás no tempo,de as ter. Matemática,estou para ver. Abre bem esses ouvidos,que eu vou fazer o mesmo,que ele não vai brincar conosco,ai não vai, não,não me chame eu Maria. E de lá não saíram,feitas rigorosas inspetoras Um exemplo de profissionalismo,não havia mesmo melhor. Ela há cada uma. Está-se mesmo a ver que elas não precisavam daquelas explicaçóes,ao contrário das outras, coitadas. É que elas sabiam demais.

UMA RAZIA

Legião foi uma peça fundamental,talvez a mais representativa,do todo poderoso exército romano. Podemos imaginar o que essas muitas legiões fizeram,mesmo sem saber,ao certo,que feitos esses foram. Por onde passaram teria sido uma razia,não ficando pedra sobre pedra,um modo de dizer. É,assim,uma palavra que deveria fazer tremer,mesmo o mais vigoroso,uma palavra que deveria meter medo,mesmo ao mais temerário,uma palavra que deveria ser esquecida,como nunca tivesse existido. Pois não é assim que tem sucedido,pois não é assim que sucede,muito em particular, em situações que insinuam paz,concórdia,coisas assim.

terça-feira, 15 de agosto de 2017

ADOÇA A BOQUINHA AO MENINO

Que cuidados vão por aí com aquilo que se come.É mesmo de os comparar com os que se tinham lá no passado longínquo,é mesmo de lembrar algumas iguarias desse perdido tempo. As amoras das silvas,à beira dos caminhos,revestidas de poeiras para todos os gostos. As uvas,tal como se encontravam nos cachos. A fruta integral,sem uma simples esfregadela na manga da camisa ou do casaco. As amoras das amoreiras,lá no alto, ou até no chão,a escorrerem açúcar. Nas feiras,nada se enjeitava. As cavacas das Caldas,em grandes cestos,ali bem expostas às nuvens de detritos que o vento levantava,à passagem do que quer que fosse,veículos,animais, pessoas. Os pinhões em colares,fabricados por mãos naturais. Os figos,secos ao ar livre,visitados por sucessivos exércitos de mosquitos,moscas,moscardos e outros que tais. Os torrões -de -Alicante,sem qualquer resguardo. Os bolos secos e cremosos,os tremoços,as pevides,as alfarrobas,as castanhas piladas. Marchava tudo e que viesse mais. Depois,aqueles doces feitos de açúcar em caramelo,espetados em pauzinhos,com formas e cores as mais variadas. Quem os vendia e apregoava eram,quase sempre,velhotas,a necessitar de uns cobres,que a vida não estava para brincadeiras. O jeito que elas tinham para atrair a pequenada. Quem podia resistir ao adoça a boquinha ao menino? Aqui,os mais idosos procuravam lançar a suspeição,insinuando que no fabrico entrava muco de velhas. E agora? Lava-se,desinfeta-se,esteriliza-se. A natureza deixou de ser natural. Persistem excepções,claro. E os gostos não se discutem,e os hábitos são os hábitos,são uma segunda natureza. É ir por essas feiras. As bancadas que por lá ainda se vêem. Aqueles ricos bolinhos,com muitos cremes,a despertar as atenções e a gulodice de Zés,de Marias,das diversas famílias aladas. É ver aquele ou aquela que chega primeiro.

EM PRIMEIRA MÃO

Áquilo já era mania. É que se deixava sempre ficar para o fim,com a complacência,e sabe-se lá mais o quê,de quem o permitia. Se calhar já lhe conheciam o gosto,e para ele não ficar triste,não o contrariavam. Era,pois,sempre o último a botar palavra. E não queiram saber o que é que daquela excelsa cabeça,via boca,vinha cá para fora,bem à vista de todos,e, também,dos ouvidos de todos,porque a voz dele era de se ouvir a grandes distâncias. É claro que os que já o conheciam não estranhavam,até já contavam. Estranhariam era se ele não se guardasse para o fim. E então era o bom e o bonito. Para começar,começava sempre da mesma maneira,o que também se estranharia se não fosse assim. E sabem o que era? Que tudo quanto tinha sido dito até ali,quer se tratasse,de um,dez,cem,ou mil,a dizer da sua justiça,fora tudo velho,cheirando a ranço. Novo,novíssimo,só dele,em primeira mão.

À CHUVA

Não era o passeio de rua nobre que estava a precisar de um remendo. Era um espaço,ao seu nivel,um prolongamento dele,em frente de loja. Havia pedrinhas que não estavam no seu sítio,pelo que alguém podia ali cair,o que não era conveniente,evidentemente. E veio alguém pôr as pedrinhas no seu devido lugar. E era Domingo. E ele ali esteve,à chuva,todo o santo dia, a fazer pela vida.

SORTE OU AZAR

Não foram,não são, ações individuais, que acabaram,e acabam, com as faltas de tantos,talvez da maioria,é isso sabido do cor e salteado. Foram elas,e são,um eterno faz de conta,como que para inglês ver,e sabe-se lá mais para quê. É caso para dizer mesmo que houve,e há, nisso, grossa injustiça,por terem ficado muitos de fora,por isto,e por aquilo. E é de supor que algum mal estar,que por aí vai em muitos que carências não sofrem,resulte precisamente dessa persistente situação sem fim à vista,como que uma fatalidade,calhando hoje a uns,amanhã a outros,como num jogo de sorte ou azar.

FANTASMAS

A pena que eu tenho de o dia não ter quarenta e oito horas. Pudera,o tempo passava depressa, pelo que não tardava o dia de regressar lá à sua terra,àquela pobreza de terra. Não sabia para onde se virar. Mas não era só com ele que isso sucedia. E era um espetáculo ver aqueles grandes e novos edifícios,como que novinhos em folha,de janelas todas iluminadas,ainda cedo,que a noite caía depressa,mantendo-se sempre assim até ao outro dia,com gente lá dentro trabalhando. Não menor espetáculo eram aquelas ruas quase desertas,também bem cedo,que ao outro dia estava lá a tarefa à espera,ruas que se enchiam de fantasmas,que a névoa,por vezes muito densa,ajudava a criar.

O PASSARINHO

Ainda a noite ia a meio,mas já havia claridade lá fora,naquela paragem setentrional. E o passarinho viera trinar no parapeito da janela. Fizera isso uma vez só,vá-se lá saber porquê.

DESDE O LEVANTAR AO DEITAR

Arranjar um cão para o pôr à janela,ladrando ele todo o santo dia,desde o levantar ao deitar,não lembraria ao diabo,mas lembrou a uma senhora de um primeiro andar direito.

À JANELA

Um,estava casado,e tinha a mulher ao pé. O outro,casaria dali a dias. O trabalho os juntara,e lá iam trabalhar. Antes de chegarem lá ao trabalho, ou depois dele,era conforme,saíam-lhes ao caminho duas meninas já crescidinhas,que passavam a vida à janela,quando os paizinhos não estavam em casa por terem ido trabalhar,que era preciso quem o fizesse. Não se sabe o que por lá faziam. O que se sabe é que um,estava casado,e tinha a muher ao pé,e o outro,casaria dali a dias.

O QUE TEM DE SER

O tio João andava ali que já não podia mais. Estivera muito mal do coração,coitado dele,mas recuperara,e achava-se muito capaz de voltar lá para a sua terra,onde estava a fazer muita falta. É que a sua vinha enchera-se de erva,o que não podia acontecer,pois lá se iria parte da comida que o solo dava para outras bocas. Mas olhe que fica por lá sozinho. Sozinho tinha andado ele,a bem dizer,toda a sua comprida vida. Não era,naquela altura,com os oitenta e oito a espreitarem,que haveria de ter receios. Não se importassem,que ele não se atrapalharia,saberia cuidar dele. A sua burrinha já marchara,por não ter suportado ausência tão arrastada,mas a vinha ficava perto lá da casa,pelo que eram as caminhadas uns meros passeios. Era assim,o tio João,homem de trabalho toda uma vida,órfão bem cedo,muito cheio de vontade de chegar aos cem,e mesmo ultrapassá-los,que a sua vinha precisava muito dele,e ele dela,pelo que se haveriam de arranjar,sem ajudas de mais ninguém. Estava ali fazendo muita falta a burrinha,mas paciência,pois não se pode contrariar o que tem de ser.

DUQUESA

Então,minha senhora,que me diz a isto? Olhe,não sei bem o que lhe diga. Mas,agora,estou eu a pensar,sempre lhe vou dizer alguma coisa. Eu sou muito republicana,sempre o fui,que foi assim que o meu paizinho,que já lá está,me ensinou,mas não me importava nada de ser condessa,pelo menos,por uns tempos. Mas olhe que ser duquesa era melhor. Ah era?,então está bem,seja duquesa. Mas olhe que eu continuava a ser muito republicana,que foi assim,como já disse,que o meu paizinho me ensinou.

segunda-feira, 14 de agosto de 2017

TEMPOS DE PAZ

A ser verdade o que ele contava,um velhinho muito velho,naqueles antigos tempos,aquilo deveria ser um inferno. Eram tempos nada parecidos com os que se estavam vivendo,tempos de paz,de concórdia,de interajuda,de amparar,de compreender,de perdoar. Não se podia aplicar assim o conhecido quem sai aos seus não degenera. É que tinham degenerado mesmo muito,nem pareciam da mesma espécie. Não eram nada como os de lá de trás,gente muito conflituosa. Por tudo e por nada,questionavam,zangavam-se,entravam em vias de facto,maltratando-se,guerreando-se,chegando a matarem-se. E diziam-se muito religiosos,e andavam sempre com o nome de Deus na boca,indo mesmo para as refregas invocando-O. Depois,uns eram os senhores,outros não se sabia bem o que eram,eram assim uns paus mandados,prontos para todo o serviço. O que se sabia é que se fartavam de trabalhar,de sol a sol,e mesmo,quando calhava,pela noite dentro. Outros,ora outros,aquilo eram quase só festas,e caçadas,todos muito bem enfarpelados,cheirando muito bem. Que ricos exemplos eles davam,esses bem paramentados. Aquele modo de vida era tão bom,lembrando paraíso,que não havia ninguém,desses de sol a sol,e mesmo de gente intermédia,que a não quisesse ter,fazendo tudo por isso,o que, às vezes acontecia,pois era tudo a mesma gente,sem tirar,nem pôr. Quem é que não quereria ter uma vida assim? Só um santo,e mesmo esse, coitado,muito ele deveria rogar a Deus para que afastasse dele o tentador.

SEM FÓSFORO NADA FEITO

É baixo o teor de fósforo tanto nos solos,como nas águas dos oceanos,havendo vestígios dele no ar. O fósforo é,porém,como bem se sabe, um elemento essencial à vida,pois entra na estrutura de moléculas fundamentais,como os ácidos nucleicos,DNA e RNA,o ATP,armazenador de energia,e fosfolípidos, das membranas celulares. Como tem sido possível com tais teores haver vida continuada? Os oceanos como que se têm bastado a si mesmos,por uma constante renovação do fósforo,mercê da decomposição,sobretudo,de fitoplancton,pela continuada vinda de água de rios,pela queda de poeiras. Nos solos,a situação tem sido muito diferente. Muito fósforo tem saído dos solos pelos produtos dele retirados,e uma grande parte tem ido para as águas de drenagem e para os esgotos Para assegurar a alimentação,de pessoas e animais,tem sido necessário recorrer a adubos,a partir de jazidas de fosfatos,que se têm exaurido. Perante tal perspectiva,há que tomar medidas,que têm sido implementadas,como seja a procura de mais reservas de fosfatos sedimentares,pedir a colaboração de microorganismos dos solos para incrementar a sua disponibilidade,poupando adubações, fertilizar mais racionalmente e emprego de resíduos. Tudo isto,na certeza de que sem fósforo nada feito.

OS MEDOS

Até onde chegava a presunção de uns e o alheamento de outros. De entristecer, de fechar a loja,de bater com a porta,de coisas assim. Era o triunfo do Tu e do Eu. Os dois,sós,sempre sós,que não cabia lá mais ninguém. O Outro,afinal,era uma figura de retórica,pois não passava do Tu, e era o Tu o inimigo a abater. E tinha sido ontem assim,e no dia anterior também,e em todo um passado ,que vinha lá desde a arrancada. E tudo isso por causa dos bichos maus que não havia meio de se irem embora,de sairem lá da entrada para a caverna. Os medos que iriam por lá,nos fundos bem fundos,os medonhos medos.

COMER E ENERGIA

A população mundial vai aumentando,e aumentado,também,o seu nível de vida,ainda que com manchas de pobreza,crescendo,assim,a procura de alimentos e de energia,parte dela proveniente de bens alimentares. Há, portanto ,necessidade de dar maior expressão às produções,quer recorrendo a maiores produtividades das culturas,quer expandindo as áreas cultivadas,desflorestando ou arroteando matos. Maiores produções implicam,pelo menos,mais gasto de adubos. Maiores produtividades são pedidas,também,por melhor nível de vida dos produtores.  Enquanto houver,pois,necessidade de comer e de movimentar,o que há a fazer  é  dar satisfação a essa procura cada vez mais generalizada e igualitária,garantindo uma permanente existência de meios.