O miúdo era um choramigas,vertendo lágrimas por tudo e por nada. Nascera assim,vá-se lá saber porquê. Havia,porém,umas ocasiões em que ele tinha carradas de razões para as verter. Tratava-se do Natal,da Páscoa e das férias. É que lá em casa o dinheiro era escasso. Mal chegava,de facto,para o essencial,que é,como muito bem se sabe,a renda da casa,o comer e o vestir.
Assim,pelo Natal,onde é que estavam as prendas? Pode-se dizer que nem uma. Ficava a observá-las nas montras e nas mãos de outros meninos. Nunca seriam para ele. Nem um simples carrinho,daqueles de corda. E tanto que gostava de o ter para brincar com ele as vezes que quisesse,e,também,porque não?,para o mostrar a outros meninos mais afortunados. O que o consolava um pouco era saber que não estava sozinho,que muitos outros meninos teriam igual sorte. Mas esses não eram ele. Com o mal alheio podia ele bem. Agora,com o dele,só ele é que o suportava. E isso é que contava.
Pela Páscoa,era a mesma coisa. Muito ele gostaria de comer de toda aquela variedade de amêndoas que ele via nas montras das lojas. Pois só lá de vez em quando,quando o rei fazia anos,é que saboreava aí uma meia dúzia das mais baratinhas,arrancadas muito a custo,quase sempre depois de uma grande choradeira.
E quando chegavam as férias? Era um outro lacrimejar sem destino,mas só para dentro. Para fora,fazia-se muito forte e nem uma lagrimazita saía. Agora,para dentro,só visto. Aquilo era mesmo um vale delas,das grossas. Parecia um dilúvio. Mas tudo se passava lá muito nos interiores,de maneira que só ele é que dava conta. É escusado dizer onde ele as passava.
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